(*) Nelson Valente
Alguma coisa muito errada, maligna, esconde-se nas entranhas da sociedade brasileira. Quando vem à tona, todo o mundo se pergunta como é possível que horrores assim ocorram num país como o Brasil. Como sobrevivemos nós a um cotidiano tão ameaçador para a vida? Que custo isso nos traz? Estes que morrem nas ruas, nas chacinas, nos assaltos, não são nossos parceiros de guerra? Pela extensão, o espetáculo macabro avançou um patamar no rol de explosões periódicas de insanidade. Volta e meia, malucos saem atirando, esfaqueando contra multidões, escolas, professores e alunos movidos por convicções obscuras.
Aceitar que a violência possa ser banalizada e naturalizada é uma tentativa de diluir o seu impacto, seu terror; de evadir de seus efeitos, de não se implicar com a existência de suas manifestações e com as possibilidades, por pequenas que sejam, de sua transformação. Essa banalização da violência é, talvez, um dos aliados mais fortes de sua perpetuação.
A virulência desse hábito mental é tão daninha e potente que, quem quer que se insurja contra este preconceito, arrisca-se a ser estigmatizado de idealista, otimista ingênuo ou bobo alegre.
Que a violência aterrorize e que diante de uma cena assim todos pareçam dizer “já que não é comigo não vou me meter”, que a solidariedade desapareça por um risco de se expor a própria vida, a isso já nos acostumamos!
O previsível, porém, é que gente muito desajustada no Brasil sempre consegue acesso desimpedido às armas de fogo e outras armas. Prefiro fazer uma previsão tristemente óbvia: “Há um grande número de outros bandidos por aí que estão acumulando ressentimentos dentro de si, e fora do nosso alcance”. Ou seja: há o risco de acontecer de novo. Aceitar que a violência possa ser banalizada e naturalizada é uma tentativa de diluir o seu impacto.
Expresso meus sentimentos de profunda tristeza e muita revolta pelo ataque vil e covarde acontecido em Santa Catarina, nas cidades de Blumenau e de Saudades SC.
O Brasil amanheceu chocado com a notícia que um homem de 25 anos pulou o muro de uma creche, e munido de uma machadinha matou 4 crianças e feriu outras 4 entre três e sete anos de idade. A brutalidade desse fato é ainda maior por se tratar de crianças incapazes de esboçar qualquer defesa.
O noticiário brasileiro, depois do massacre de Blumenau e na cidade de Saudades, tenta estabelecer o que se passou na cabeça do assassino para cometer essa monstruosidade com os estudantes.
O máximo da violência moderna é o terrorismo, que ainda tem um sentido político. Mas a pós-moderna não tem sentido nem político nem psicológico. É um ato de ruptura, de um nonsense absoluto, uma explosão cega. É um “sair de si”, na linguagem da psicanálise
Aceitar que a violência possa ser naturalizada é uma tentativa de diluir o terror que ela provoca, de se submeter aos seus efeitos, e de não se implicar com as possibilidades, mesmo pequenas, de sua transformação.
Adolescentes ou adultos desequilibrados, malucos com manias conspiratórias e outras anomalias não são, obviamente, exclusividade americana. Não se encontra em outros países, contudo, nada similar em termos de explosão gratuita de violência assassina.
Escola Aquarela – Saudades, SC
Três crianças e duas funcionárias de uma escola infantil de Saudades, no Oeste de Santa Catarina, morreram após um ataque com faca em quatro de maio de 2021. O assassino, que tinha 18 anos na época, deu golpes contra o próprio corpo e foi levado em estado gravíssimo para um hospital da região após o crime. Jovem matou a facadas três crianças e dois adultos em escola de Saudades, próximo a Chapecó: cidade de Saudades
Blumenau, Santa Catarina
Quatro crianças morreram após serem atacadas por um homem que invadiu a creche Bom Pastor, no Vale do Itajaí, em Santa Catarina. Outras quatro outras crianças ficaram feridas.
Aracruz, ES
Um ataque a duas escolas deixou três mortos e outros 13 feridos em Aracruz, no Espírito Santo, em 25 de novembro de 2022. Os disparos aconteceram por volta das 9h30 nas duas escolas, que ficam na mesma via, em Praia de Coqueiral, a 22 km do centro do município.
Sobral, CE
Um aluno com uma arma atirou em três estudantes Escola Estadual Professora Carmosina Ferreira Gomes, em Sobral, no Ceará, em cinco de outubro de 2022. A arma utilizada no crime pertencia a um CAC (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador).
Barreiras, BA
Um ataque a tiros em uma escola de Barreiras, no oeste da Bahia, terminou na morte de uma aluna cadeirante, em 26 de setembro de 2022. A vítima foi identificada como Geane da Silva Brito, de 19 anos. Segundo a polícia, um adolescente de 14 anos invadiu a escola armado e atirou contra os alunos. Colégio Municipal Eurides Sant’Anna.
Ilha do Governador, Rio de Janeiro, RJ
Três alunos de 14 anos foram esfaqueados na manhã do dia 6 de maio de 2022 na Escola Municipal Brigadeiro Eduardo Gomes, no Jardim Guanabara, na Ilha do Governador, na Zona Norte do Rio. Segundo a Polícia Militar, o agressor era um colega de turma. Ele chegou a gravar a própria ação.
Escola Estadual Orlando Tavares – Caraí, MG
Dois alunos de 17 anos ficaram feridos na zona rural de Caraí (MG) após um ataque a tiros por volta das 8h do dia sete de novembro de 2019 na Escola Estadual Orlando Tavares, no distrito de Ponto do Marambaia. De acordo com a Secretaria de Estado de Educação, um aluno que não havia ido à aula, pulou o muro e iniciou os disparos. O atirador, que também tinha 17 anos na época, foi apreendido.
Centro Educacional Unificado Aricanduva – São Paulo, SP
Um professor foi esfaqueado por um aluno dentro do Centro Educacional Unificado (CEU) Aricanduva, uma escola municipal na Zona Leste da cidade de São Paulo, no dia 19 de setembro de 2019. Segundo a Polícia Militar, o estudante também ficou ferido.
Escola Estadual Raul Brasil – Suzano, SP
Um adolescente e um homem encapuzados atacaram a Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano (SP), e mataram sete pessoas, sendo cinco alunos e duas funcionárias do colégio. O ataque aconteceu em 13 de março de 2019. Em seguida, um dos assassinos atirou no comparsa e, então, se suicidou. Pouco antes do massacre, a dupla havia matado o proprietário de uma loja da região.
Colégio Estadual João Manoel Mondrone – Medianeira, PR
Um adolescente de 15 anos entrou armado e atirou contra colegas de classe do Colégio Estadual João Manoel Mondrone, em Medianeira, no oeste do Paraná, a 60 km de Foz do Iguaçu. O ataque aconteceu em 28 de setembro de 2019.
Colégio Goyases – Goiânia, GO
Em 20 de outubro de 2017, um estudante de 14 anos atirou dentro do Colégio Goyases, escola particular de ensino infantil e fundamental, em Goiânia. De acordo com o Corpo de Bombeiros e Polícia Militar, dois estudantes morreram e outros quatro ficaram feridos na unidade, localizada no Conjunto Riviera.
Escola Tasso da Silveira – Rio de Janeiro (RJ)
Em 7 de abril de 2011, um massacre na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, na Zona Oeste do Rio, deixou 12 crianças mortas. O atirador, um ex-aluno do colégio, ainda feriu mais de dez estudantes e cometeu suicídio depois.
Alunos e familiares se despedem da professora morta durante crime em escola estadual/SP/Capital
Corpo da professora Elisabete Tenreiro, de 71 anos, morta após ser esfaqueada por um aluno dentro da sala de aula, é velado nesta terça-feira (28) no Cemitério do Araçá, na Zona Oeste da capital.
Expresso meus sentimentos de profunda tristeza e muita revolta pelo ataque vil e covarde acontecido em Santa Catarina, nas cidades de Blumenau e de Saudades SC., entre outras escolas acima mencionadas.
O previsível, porém, é que gente muito desajustada no Brasil, sempre consegue acesso desimpedido às armas de fogo e outros tipos de armas. Prefiro fazer uma previsão tristemente óbvia: “Há um grande número de outros garotos e adultos por aí que estão acumulando ressentimentos dentro de si, e fora do nosso alcance”. Ou seja: vai acontecer de novo.
(*) é professor universitário, jornalista e escritor
Muito bom o artigo e o resumo para trazer a memória as tragédias que vem acontecendo com mais frequência. Precisamos de leis mais duras e até pena de morte ou cortar uma mão como no oriente médio. Sei que a épica de olho por olho já passou, mas ver estes monstros sendo liberado todos os dias, mostra aos bandidos que o crime compensa
Ótima matéria, muito lúcida. Parabéns!
Gostaria de parabenizá-lo pelo conteúdo. Muito importante lembrar o que estava esquecido.
Texto muito bom, precisamos URGENTE de ações severas.
Excelente artigo. Concordo em gênero, número e caso.