Maria José Rocha Lima
No último dia 25, o governo federal publicou, numa edição extraordinária do Diário Oficial, a sanção presidencial ao projeto que regulamentou o novo Fundeb. As mudanças passam a valer em janeiro.
O presidente sancionou, sem vetos, a lei que criou o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), tornando-o permanente e aumentando os percentuais de repasse da União a estados e municípios. Pelas novas regras aprovadas no Congresso, a União fará repasse progressivamente maiores ao longo dos próximos seis anos. Até 2026, o governo federal aumentará a complementação para esses fundos a cada ano, começando com 12% do montante até atingir 23%.
Esse fundo, agora permanente, representa o avanço mais importante para a educação brasileira, pelo qual clamavam os Pioneiros da Educação Nova, desde 1932. Há 88 anos, destacados intelectuais (2), tendo em Anísio Teixeira um dos importantes idealizadores de fundos de financiamentos, diziam: “Precisamos constituir fundos para a instrução pública, que estejam não só ao abrigo das contingências orçamentárias normais, como também permitam acréscimos sucessivos, independentemente das oscilações de critério político de nossos administradores”.
Naquela época, o escritor, artista e célebre intelectual Menotti Del Picchia saudou os pioneiros, reconhecendo que “a educação se ressentia da ausência de um mecanismo articulado dentro de um plano global que atingisse as várias etapas instrucionais”, reclamando que o estudo em etapas desarticuladas dava como resultado uma formação artificial e não um “thesouro nacional de cultura”. Para ele, pela primeira vez, no Manifesto dos Pioneiros, um dos nossos problemas cardeais seria visto, não por um ângulo restricto, mas pelo seu único e justo ponto de perspectiva: de conjunto.
Nessa perspectiva histórica, o novo Fundeb atende às duas reivindicações quase seculares, deixando de ser uma Disposição Transitória, com prazo limitado para vigir, consagrado no corpo da Constituição Federal, garantindo o financiamento da educação básica como Política de Estado; e atende a todas as etapas da educação básica.
O regulamento determina ponderações a serem usadas na definição do valor por aluno, como número de matrículas e indicadores de aprendizagem. Avança no sentido de romper com a tradição brasileira de concorrência entre os entes federativos, alcançando todos os municípios, estados e DF, criando condições para a consolidação de um Sistema Nacional de Educação, com o enfoque para a redução da desigualdade regional entre estados e municípios mais ricos e mais pobres. Consagra constitucionalmente a educação infantil, assegurando que 40% desse dinheiro novo terão que ir para garantir creches e aulas na pré-escola para crianças de zero a seis anos.
O novo Fundeb progride na política de valorização do magistério, ao determinar que 70% do valor total do fundo sejam usados para pagar salários dos profissionais de educação, antes eram 60%, e ainda deixando de fora aposentadorias e pensões. Assim, desmonta definitivamente os discursos e as práticas de 63% dos gestores municipais brasileiros e 62,8% dos gestores municipais baianos, que não cumprem a Lei 11.738/2008, que criou o Piso Salarial Profissional Nacional dos Professores, alegando empecilhos legais.
Estou convicta de que o Fundeb permanente poderá, um dia, concretizar a escola pública de qualidade e fundar as bases de uma verdadeira democracia, como ambicionavam os pioneiros, bem representados no apelo do ilustre baiano Anísio Teixeira: “Só existirá uma democracia no Brasil no dia em que se montar a máquina que prepara as democracias. Essa máquina é a escola pública. Mas não a escola pública sem prédios, sem asseio, sem higiene e sem mestres devidamente preparados, e, por conseguinte, sem eficiência e sem resultados. E sim a escola pública rica e eficiente, destinada a preparar o brasileiro para vencer e servir com eficiência dentro do país”.
*Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em educação. Foi deputada de 1991 a 1999. É presidente da Casa da Educação Anísio Teixeira. Psicanalista e dirigente da Associação Brasileira de Estudos e Pesquisas em Psicanálise-ABEPP.
O Manifesto dos Pioneiros foi redigido por Fernando de Azevedo e assinado por: Afrânio Peixoto, Sampaio Dória, Anísio S. Teixeira, Lourenço Filho, Roquete Pinto, Frota Pessoa, Júlio Mesquita Filho, Raul Briquet, Mario Casassanta, Delgado de Carvalho, Almeida Junior, Roldão Lopes de Barros, Noemy M. da Silveira , Hermes Lima, Attilio Vivacqua, Edgar Sussekind,Francisco Venâncio Filho, Paulo Maranhão, Cecília Meireles, Álvaro Alberto, Garcia Rezende, Nóbrega da Cunha, Paschoal Leme e Raul Gomes.