Maria José Rocha Lima*
Fiquei perplexa ao ler as estimativas de que os alunos brasileiros vão demorar 260 anos para atingirem índice de leitura dos países ricos. Na Matemática, a previsão é de 75 anos, segundo relatório sobre a crise da aprendizagem, produzido pelo Banco Mundial, reunindo dados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), uma pesquisa sobre a educação mundial, divulgada a cada três anos pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Confesso que até pensei numa teoria conspiratória, mas depois de ler o Parecer de Rui Barbosa, de 12 de setembro de 1882, entendi que se trata de puro descaso da elite brasileira pela educação.
O deputado Rui Barbosa (1882), com os seus exuberantes talento, inteligência e cultura, escreveu: “Com essa celeridade de milésimos por ano […], em menos de 799 anos não teríamos chegado à situação que se anela, à situação normal de alguns países já hoje, em que toda a população de idade escolar recebe a instrucção primária”.
Com a celeridade semelhante àqueles tempos, comemora-se o IDEB de 4,2 obtido pelo ensino médio, conforme o INEP/MEC. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica mede a qualidade do aprendizado nacionalmente e estabelece metas para a melhoria do ensino.
A tradição secular de lentidão e atraso na educação nos impulsiona a comemorar o avanço de 0,4 ponto obtido entre 2017 e 2019, como o maior em toda a série histórica. Em 2005, o IDEB foi 3,4, passando para 3,5 em 2007 e para 3,6 em 2009. Entre 2011 e 2015, o IDEB do ensino médio ficou estagnado em 3,7. Em 2017, avançou para 3,8 e, no ano passado, para 4,2. A meta para aquele ano era 5. O IDEB das escolas públicas estaduais aumentou 0,4, passando de 3,5 em 2017 para 3,9 em 2019. Mesmo assim, a rede estadual ficou abaixo da meta de 4,6. Apenas dois estados, Pernambuco e Goiás, alcançaram a meta de 2019 para as escolas estaduais. Desde 2013, o ensino médio não atinge a meta do IDEB.
O INEP divulgou que o Brasil avançou no IDEB em todas etapas de ensino, mas apenas nos anos iniciais do ensino fundamental, do 1º ao 5º ano, cumpriu a meta de qualidade estabelecida para 2019. O IDEB registrado nos anos iniciais no país foi 5,9, índice que superou a meta nacional de 5,7, considerando tanto as escolas privadas quanto as públicas. Nos anos finais do ensino fundamental, do 6º ao 9º ano, o IDEB alcançado no país foi 4,9, inferior à meta fixada para a etapa, 5,2.
Há 138 anos, em 12 de setembro de 1882, Rui Barbosa, Deputado à Assembléia Geral do Império, apresentou o Parecer e Projecto de Reforma do Ensino Primário, da Commissão de Instrucção Pública, e consignava: “O ensino público está à orla do limite possível a uma nação que se presume livre e civilizada; é que há decadência, em vez de progresso; é que somos um povo de analfabetos, e que a massa deles se decresce numa proporção desesperadamente lenta; é que a instrução acadêmica está infinitamente longe do nível científico desta idade; é que a instrução secundária oferece ao ensino superior uma mocidade cada vez menos preparada para o receber; é que a instrução popular, na Corte como nas províncias, não passa de um desideratum; é que há sobeja matéria para nos enchermos de vergonha, e empregarmos heroicos esforços por uma rehabilitação, em bem da qual, se não quisermos deixar em dúvida a nossa capacidade mental ou os nossos brios, cumpre não recuar ante sacrifício nenhum; não só porque, de todos os sacrifícios possíveis, não haveria um que não significasse uma despesa proximamente reprodutiva, como porque trata – se aqui do nome nacional.
Educar os brasileiros é pensar no país, pensar em nós mesmos, pois é cada vez mais difícil viver num país onde largas parcelas vivem em situação de extrema penúria, enquanto uma minoria vive morrendo de medo.
*Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em educação. Deputada baiana de 1991-1999. Fundadora da Casa da Educação Anísio Teixeira.