Maria José Rocha Lima*
Conta minha mãe, Dona Teresinha, que eu, ainda bebê, lhe meti um grande susto. Quando eu nasci, ela tinha apenas 20 anos e era muito inexperiente, recém-saída de um convento. Certo dia, ao tirar a minha fraldinha, percebeu que vinha junto com a presilha uma tripinha escura, com um tampãozinho com aspecto “sangue pisado”, uma espécie de cascão, para nós, baianos.
E aí minha mãe se deu conta que era o meu umbigo. Entrou em desespero, saiu porta afora, chorando e gritando pela vizinha: – Dona Mocinha, pelo amor de Deus, acho que matei minha filha.
Dona Mocinha era uma senhora de uns 70 anos, muito experiente, e logo acalmou minha mãe, dizendo: Não foi nada, foi o umbiguinho dela que caiu. Já estava em tempo. A criança já tem mais de um mês e, pelo que eu vi, tem boa cicatrização.
Acompanhou a minha mãe até a nossa casa, me examinou no berço e disse- lhe:
– Sua menina está muito bem. Ela agora cortou o cordão umbilical.
Eu cresci ouvindo essa historinha da minha primeiríssima infância. E, durante toda a minha vida, ouvi dezenas de vezes essa história sobre como o meu umbigo caiu.
E agora, mais velha, posso dizer para Dona Teresinha que o umbigo vem me lembrar que houve um antes; que houve uma mãe; que houve um nascimento; que fui criança e até para onde fui e vou.
Obrigada, mãe, a você devo o que tenho e o que sou!
Sigmund Freud se refere ao “umbigo do sonho” na sua principal obra A interpretação dos sonhos (1900).
Existe um ponto em todo sonho ao qual ele é insondável – um umbigo, por assim dizer, que é seu ponto de contato com o desconhecido.
Maria José Rocha Lima é mestre, doutoranda em Educação e psicanalista filiada à ABEPP.