Maria José Rocha Lima*
Em 21 de maio deste ano, James Heckman, vencedor do Nobel de Economia, disse em uma entrevista à BBC que “investir em educação para a primeira infância é a melhor ‘estratégia anticrime’”.
A entrevista teve grande repercussão, uma vez que a BBC é uma emissora de TV e Rádio Pública, de muita credibilidade e alcance mundial, que teve a sua origem na Inglaterra, no ano de 1922. A entrevista repercutiu em vários veículos de comunicação no mundo. No Brasil, a entrevista ganhou repercussão no Jornal o Globo do dia 07/06/2019 e em outros órgãos de comunicação. E vale a pena continuar repercutindo.
James Heckman venceu o Nobel de Economia em 2000, quando começou a se dedicar ao tema da Primeira Infância (de 0 a 5 anos de idade), pelo qual ganhou ainda maior importância e reconhecimento. O cientista demonstra a correlação existente entre a não atenção na Primeira Infância e desigualdade social e o potencial de aprendizagem que há nessa fase da vida, considerando que é uma fase em que o cérebro apresenta enorme plasticidade. Há uma plasticidade cerebral gigantesca nessa etapa que não se vê em outras. Portanto, as crianças pequenas são muito maleáveis e mutáveis.
Para ele, isto “é também uma questão de eficiência econômica”. Nós, educadores, psicólogos e psicanalistas, sabemos que são robustas as possibilidades de mudanças na 1ª infância: cuidados, relações afetuosas, atenção, conversas e ensinamentos criam as condições para que possamos tirar as pessoas da pobreza.
Na entrevista , o Nobel destaca que o resultado anticrime é o principal do seu estudo. Para ele, o maior retorno para cada dólar investido em todos eles é a redução de crimes e a criação de um ambiente encorajador para as crianças. Ele insiste que, embora as pessoas ignorem isso, essa questão é importantíssima. “Nem que fosse só por isso deveriam ser levados a sério como política pública”, conclui.
James Heckman relata que em 1962, nos Estados Unidos, teve início um programa pioneiro de educação infantil de alta qualidade que mudou a vida das pessoas que vivenciaram a experiência. Agora, informa, uma nova pesquisa mostra que não só eles, mas também seus filhos, colheram os frutos. “Os participantes são pessoas bem sucedidas. Eles têm estatisticamente uma chance muito menor de ter cometido crimes”. Assim, podemos concluir que há uma forte correlação entre atividade criminal dos pais e dos filhos. Os pais transmitem aos filhos o que aprenderam na infância. Mais do que observar o quociente intelectual – QI -, o cientista propõe o desenvolvimento das habilidades sociais e emocionais. Para ele, os participantes desses programas que desenvolveram as habilidades sociais e afetivas demonstraram mais sucesso nas etapas seguintes da vida. Houve também a constatação de que “os participantes desses programas de 1ª Infância tinham mais probabilidade de estarem empregados e tinham muito menos chance de ter cometido crimes”, diz o economista. Eles desenvolvem habilidades executivas – de planejamento, de interação, de cumprimento de tarefas, de seguir instruções.
A pesquisa observou a empregabilidade e a participação no crime entre as pessoas que participaram do programa da Primeira Infância. Em todos os países onde esse assunto foi pesquisado, concluiu-se que: a negligência e o abandono na primeira infância mantêm a desigualdade e a pobreza nas etapas posteriores da vida. Portanto, o ambiente nos primeiros anos é muito importante. Nessa fase você constrói uma base de habilidades que vão te servir para o futuro.
Em nossa opinião, “a falha básica”, aquela sobre a qual nos fala Michael Balint, pode ser identificada com uma considerável discrepância nas fases formativas precoces do indivíduo, entre suas necessidades biopsicológicas e o cuidado material e psicológico, e a afeição disponível em momentos relevantes. Isso cria um estado de deficiência cujas consequências e efeitos posteriores parecem ser apenas parcialmente reversíveis.
*Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em Educação. Foi Deputada de 1991 a 1999. É fundadora da Casa da Educação Anísio Teixeira