Serviço de Segurança do Estado da Ucrânia anuncia prisão de mulher que teria ajudado a Rússia a coletar dados sobre a viagem do chefe de Estado à região de Mykolaiv, no sul, onde ele seria assassinado. Tentativa de magnicídio ocorreria em julho
Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia: vigilância reforçada e medidas extremas de segurança – (crédito: Serviço de Imprensa Presidenical da Ucrânia/AFP)
O Serviço de Segurança do Estado da Ucrânia (SBU, pela sigla em ucraniano) anunciou ter desmantelado um plano para assassinar o presidente Volodymyr Zelensky, em julho. O magnicídio ocorreria durante visita do chefe de Estado à região de Mykolaiv (sul). “O SBU deteve uma informante dos serviços especiais da Federação Russa, que, na véspera da recente viagem de trabalho do presidente, coletava inteligência sobre a planejada visita”, afirma o organismo do governo de Kiev. Segundo o comunicado, a mulher detida sob suspeita de contribuir com o suposto complô russo era ex-vendedora em uma loja militar na cidade de Ochakiv, por onde Zelensky passou. Ainda de acordo com o SBU, a suspeita trabalhou para traçar os horários da visita de Zelensky, os locais em que ele estaria e a rota aproximada de sua comitiva. Se for considerada culpada, ela poderá ser sentenciada a 12 anos de prisão.
A tentativa de assassinato teria fracassado porque o SBU realizou ações para afastar a mulher, cuja identidade não foi revelada, dos locais visitados por Zelensky, impedindo-a de obter informações concretas. A prisão teria ocorrido em 1º de agosto, mas somente foi tornada pública nesta segunda-feira (7/8). No dia da visita, agentes ucranianos reforçaram a vigilância da informante e limitaram a movimentação dela. Mesmo depois da passagem de Zelensky por Mykolaiv, o SBU manteve o rastreamento da mulher e descobriu que a Rússia a incumbiu de fornecer os dados sobre a localização paióis de munição das Forças Armadas em Ochakiv, que seriam alvos de um ataque aéreo de grandes proporções.
Mykola Volkivskyi — ex-conselheiro do presidente do Parlamento da Ucrânia — explicou ao Correio que tentativas de assassinato contra Zelensky tornaram-se mais frequentes após o início da invasão russa, em 24 de fevereiro de 2022. “No entanto, em setembro de 2021, Zelensky discursou na Assembleia Geral da ONU e reagiu à tentativa de assassinato de seu primeiro assistente Serhiy Shefir e prometeu uma ‘resposta contundente'”, lembrou. “O presidente mencionou, na época, que os responsáveis poderiam ser agentes internos ou externos, e atribuiu o crime ao preço pelas reformas na Ucrânia.” O carro de Shefir foi alvejado com dez tiros quando passava por uma área de floresta, ao sul de Kiev. O auxiliar de Zelensky acabou atingido por três disparos e teve que ser submetido a uma cirurgia.
Para Volkivskyi, o complô mais recente contra Zelensky é “o preço pela paz e pela liberdade”. “Em janeiro de 2023, a CIA (Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos) revelou que houve pelo menos 12 tentativas de assassinar o presidente ucraniano. Eles impediram duas delas. Os serviços de inteligência da Ucrânia e seus parceiros estão constantemente alertando e fazendo ataques preventivos, adiantando-se a esses crimes”, sublinhou.
Por sua vez, Anton Suslov — especialista da Escola de Análise Política (em Kiev) — assegurou à reportagem que, ainda que um dos muitos planos para matar Zelensky tivesse sido bem-sucedido, a guerra em nada mudaria. “De fato, o presidente Zelensky é um símbolo importante da luta da Ucrânia contra a Rússia e seu assassinato seria um fator desmoralizante. No entanto, o sistema político ucraniano, assim como a nação em geral, é descentralizado o suficiente para não depender de uma pessoa em particular, mesmo que ela seja o presidente.”
Bombardeio
No início da tarde desta segunda-feira (hora de Brasília), Zelensky publicou um vídeo sobre um novo bombardeio, atribuído à Rússia, contra um prédio residencial de Pokrovsk, na região de Donetsk, no leste da Ucrânia. “Cidade de Pokrovsk, no Donbass, onde a Rússia tenta deixar apenas pedras quebradas e queimadas. Dois ataques de mísseis. Um prédio residencial comum atingido. Infelizmente, há vítimas”, lamentou o presidente. “Temos que parar o terror russo. Todos os que lutam pela liberdade da Ucrânia salvam vidas. (…) A Rússia será responsabilizada por tudo o que fez nesta terrível guerra.”
O ataque aéreo deixou pelo menos cinco mortos e 31 feridos, segundo um balanço divulgado pelas forças oficiais de Kiev. Entre os mortos, está um socorrista que participava das operações de resgate e foi atingido em cheio pelo segundo míssil. Pokrovsk está localizada a cerca de 70km a noroeste da cidade de Donetsk, sob comando russo e a 50km do front. Depois de invadir a Ucrânia, a Rússia fracassou em controlar Kiev, mas assumiu regiões no leste e no sul do país. As forças ucranianas tentam recuperar essas áreas com a contraofensiva iniciada em junho.
Depois de uma reunião com a Arábia Saudita sobre o conflito com a Ucrânia, a Rússia avisou que somente a rendição de Kiev colocará fim à guerra. “Estamos convencidos de que um acordo verdadeiramente global, duradouro e justo é possível apenas se o regime de Kiev puser fim às hostilidades e aos atentados terroristas”, declarou a porta-voz da diplomacia russa, Maria Zakharova, em um comunicado. “As novas realidades territoriais (no leste e no sul da Ucrânia) devem ser reconhecidas, e a desmilitarização e a desnazificação da Ucrânia (…), garantidas”, acrescentou.
Mykola Volkivskyi, ex-conselheiro do presidente do Parlamento da Ucrânia(foto: Arquivo pessoal )
“Por causa das ameaças de assassinato, as viagens de Zelensky ao exterior são planejadas com o máximo segredo. As autoridades da Ucrânia ficaram insatisfeitas quando os dados sobre uma visita planejada do presidente a Bruxelas vazaram em fevereiro, três dias antes da viagem. Formalmente, de acordo com a Constitituição ucraniana, a linha de sucessão no país é bem estruturada: se algo ocorrer ao presidente, o chefe do Parlamento, Ruslan Stefanchuk, assume suas funções.”
Mykola Volkivskyi, ex-conselheiro do presidente do Parlamento da Ucrânia
“É muito interessante o fato de que os russos não possam compreender a diferença entre a Rússia e a Ucrânia, e considerem o Estado em termos muito personalistas. Eles acreditam que, se o líderfor assassinado, a nação fracassará. Isso não é algo válido para a Ucrânia.Em vez disso, esse modo de pensar é sintomático da sociedade russa.”
Anton Suslov, especialista da Escola de Análise Política (em Kiev)