Cabeça do bebê ficou presa; criança foi reanimada por 40 minutos.
MP quer que obstetra responda por lesão corporal e falsidade ideológica.
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal aceitou denúncia do Ministério Público contra uma obstetra, uma enfermeira obstétrica e uma doula por supostas falhas em um parto domiciliar realizado em 2014 que deixou sequelas neurológicas no bebê. O processo tramita na 1ª Vara Criminal de Taguatinga.
De acordo com a Promotoria de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde (Pró-vida), durante a gestação foi verificado que a criança estava sentada. No momento do parto, o recém-nascido ficou com os braços e as pernas para fora e com a cabeça presa no canal vaginal da mãe.
O MP aponta que o bebê nasceu em condições críticas, desacordado e hipotônico por falta de oxigenação. Ele precisou ser reanimado durante 40 minutos após o parto.
O fato ocorreu entre 26 e 27 de junho do ano passado. A gestante contratou a obstetra para o pré-natal e o parto domiciliar do primeiro filho. Segundo a denúncia, a orientação da médica era que no início das contrações a mulher entrasse em contato com a doula para ter certeza de que o trabalho de parto havia iniciado.
Conforme a denúncia, às 21h30 de 26 de junho de 2014, a gestante ligou para a doula dizendo que estava com constrações, mas a profissional afirmou que se tratava de “um falso trabalho de parto”. A orientação foi para que a mulher tomasse um remédio e tentasse dormir. A grávida então enviou mensagem pelo celular para a médica.
Na manhã seguinte, quase 10 horas depois do primeiro contato, a gestante ligou novamente para a doula informando que o bebê estava nascendo. A profissional foi até a residência do casal. A médica e a enfermeira chegaram dez minutos depois e encontraram o bebê com a cabeça presa.
Segundo a ação do MP, mesmo depois de reanimar a criança por 40 minutos, a médica optou por deixar o recém-nascido em casa aos cuidados da doula e da enfermeira, levando a criança para o hospital quase 9 horas depois.
A promotoria afirma que a obstetra não relatou as reais condições do nascimento e mentiu sobre o horário do parto no hospital, o que demonstra a “intenção de minorar sua responsabilidade”.
Para o MP, a médica deve responder por lesão corporal grave, falsidade ideológica e periclitação da vida e da saúde; a doula, por lesão corporal grave; e a enfermeira, por lesão corporal grave e falsidade ideológica. O MP pede que a família seja indenizada em R$ 150 mil pela médica e R$ 50 mil pela doula e pela enfermeira.
Parto domiciliar
O diretor do Conselho Federal de Medicina, o ginecologista e obstetra Hiran Gallo, afirmou que a entidade é contra o parto domiciliar. Ele disse que o conselho considera que o parto hospitalar é mais adequado por ter maior chance de preservação da vida da gestante e do filho.
“Para preservar a integridade do binômio mãe e filho acreditamos que o parto hospitalar é melhor porque tem toda a equipe necessária para atender a gestante. No parto domiciliar, quando existe uma complicação, para chegar no hospital é muito demorado.”
Gallo é coordenador da Câmara Técnica de Ginecologia e Obstetrícia, doutor em bioética e professor da faculdade de medicina da Universidade do Porto. O especialista não quis comentar o caso específico da denúncia, mas afirmou que o parto domiciliar pode trazer lesões graves ao recém-nascido se for mal acompanhado.
“As sequelas vão depender do grau. A criança não pode passar muito tempo no canal de parto coroando e presa porque vai automaticamente ter sequelas e deficiências que vão trazer problemas para o resto da vida para a família”, disse. “Quando ocorre um problema no parto um dos recursos é a cesariana.”
Gallo orienta que se coloque uma ambulância na porta da residência, caso a mulher escolha o parto domiciliar. “Pelo menos dessa forma a equipe estará preparada para o transporte do bebê e da mãe caso ocorra alguma alteração no trabalho de parto que requeira cuidado hospitalar.”
Ele diz que a melhor opção é o parto normal no hospital e critica as cesarianas marcadas. “O grande problema das cesarianas marcadas é a prematuridade. Temos que combater isso. Uma criança prematura pode trazer problemas também.”
O diretor disse que o conselho está estudando criar uma resolução para restringir marcações de cesarianas. “Estamos discutindo sobre a cesárea eletiva. A cesárea tem que ser realizada se a gestante está com 39 para 40 semanas ou em trabalho de parto.”
A Secretaria de Saúde do DF informou que não dá nenhuma orientação sobre casos de parto domiciliar, pois a pasta realiza esse tipo de procedimento.
Fonte: G1