*Frutuoso Chaves
Contam que a imagem do menino lourinho, de cabelos encaracolados, vestes precárias (não mais do que uma pele de camelo, ou cordeiro, com alça sobre um dos ombros e o outro nu) advém do Século 19, na Europa, quando o catolicismo já se havia apropriado das celebrações conhecidas, milenarmente, desde os povos tribais.
Pagã, em sua origem, a festa celebrava o Solstício de Verão, o mais longo dos dias de sol e, assim, estava associada à fertilidade da terra e ao tempo da colheita. Danças e cantos, sim, mas em volta de fogueiras então acesas para afastar os maus espíritos.
Desembarcados no Brasil, os festejos juninos logo cairiam, de Norte a Sul, no gosto popular. As fogueiras originais aqui espantariam as noites mais frias nos arraiais propriamente ditos e, ainda, naqueles instalados no coração de todas as cidades, grandes ou pequenas, para o reinado do milho verde, da pamonha, da canjica e das quadrilhas herdadas dos bailes franceses do Século do Século 18. Foi quando o “en avant tous” transformou-se em “alavantu” e o “en arrière” virou “anarriê”.
Antes que os sertanejos do agronegócio com suas guitarras, suas canções melosas (as tais sofrências) e seus cachês milionários invadissem a festa, os que mandavam no terreiro eram a sanfona, o triângulo e o zabumba. Mas essa é outra história. Vamos, então, à do santo do dia.
Primo de Jesus, São João veio ao mundo dois anos antes do nascimento daquele a quem batizaria e anunciaria ao mundo como “o Cordeiro de Deus”. Daí, o carneirinho da imagem que todo brasileiro conhece independentemente da região onde viva. “Ecce agnus Dei”, teria dito o jovem João do primo mais novo que então se aproximava da margem do Rio Jordão, onde o batismo ocorreria. “Eis o cordeiro de Deus”, diria, assim, em latim, se latim falasse. Os estudiosos da matéria garantem que ambos falavam aramaico.
É bem estrelado o céu da imagem do pequeno João. Fosse nordestino quem a concebeu teria, certamente, acrescido um ou dois balões. Houve um tempo no qual estes eram politicamente corretos. Não provocavam incêndios na mata nem, é claro, em refinarias.
O cajado, na mesma tela, tanto pode servir ao sustento da faixa “Ecce agnus Dei” quanto à representação do papel e da missão evangelizadora conferidos pelos Céus àquele advindo ao planeta antes de Cristo.
Gosto dessa imagem desde os meus dias de menino. E a ela mais me afeiçoei no período da adolescência, tempo em que todos nós, de peito aberto para as primeiras paixões, torcíamos para que o santo nos acendesse a fogueira do coração, tal como na modinha. Quem não lembra desses versos: “O balão vai subindo/Vem caindo a garoa/o Céu é tão lindo/A noite é tão boa/São João, São João/Acende a fogueira do meu coração”. A todos, uma boa festa.
*Jornalista profissional com passagens pelos jornais paraibanos A União (Redator e Chefe de Reportagem), Correio (Redator e Editor de Economia), Jornal da Paraíba (Editorialista), O Norte (Editor Geral), O Globo do Rio de Janeiro e Jornal do Commercio do Recife (correspondente na Paraíba, em ambos os casos). Também pelas Revistas A Carta (editada em João Pessoa) e Algomais (no Recife).
Estava com saudade de suas crônicas. Esta veio a calhar… provocando belas lembranças.
Frutuoso querido, lindo artigo! Tão sublime e informativo.