
Miguel Lucena
Dizem que até um relógio quebrado acerta duas vezes por dia. É verdade. Mas ninguém olha para ele esperando a hora certa. O que está parado serve mais de enfeite ou lembrança. Ainda assim, nesse pequeno milagre do acaso, ele nos ensina algo: mesmo quem falha o tempo todo pode ter seus instantes de razão.
Tem político que vive nesse compasso — enganando o povo, errando nos projetos, mas vez ou outra acerta sem querer. E o povo, cansado de tanto descompasso, se agarra a essas raras coincidências como se fossem virtudes.
A vida, aliás, é cheia desses relógios quebrados: conselhos de bêbado, ditados de avó, profecias de doido. Nem tudo está perdido quando a esperança encontra sentido nos ponteiros parados. Afinal, entre erros e silêncios, há sempre tempo para um acerto.