Os instintos primitivos de Roberto Jefferson são despertados na oratória
Todas as vezes em que Roberto Jefferson participa de uma entrevista é um Deus nos acuda. Como as pessoas sabem que ele não tem papas na língua, ficam atentas às suas palavras, pois deduzem que vai pôr para fora o que muitos gostariam de dizer, mas não têm coragem. Os comentários são parecidos: esse tem “saco roxo”. Fala o que lhe dá na telha, sem receio de retaliações.
A audiência explode. Bate recordes inimagináveis. Seus discursos são viralizados de um dia para outro. Os opositores recolhem as garras, pois não querem conquistar inimigos com esse poder de fogo. Os adeptos vão à loucura, reproduzindo trechos do que ele disse como se fossem suas próprias palavras.
Não é de hoje que Bob se comporta com essa “insolência”. Quem não se lembra dos embates que travou com o todo-poderoso José Dirceu?! E bota poderoso nisso. Como diziam lá no interior, era o cara que mandava prender e mandava soltar.
Só para dar uma ideia de como ele era temido, vamos relembrar esta história: Waldomiro Diniz era Subchefe de Assuntos Parlamentares da Presidência da República, e homem de confiança de José Dirceu, que era o Ministro-Chefe da Casa Civil. Diniz foi acusado com indícios robustos nos diversos escândalos envolvendo Carlinhos Cachoeira nos negócios dos bingos.
Pois bem, o medo do poderio do ministro era tão aterrorizante que a imprensa levou um tempão antes de mencionar o seu nome no caso. Todo mundo fazia média com ele, e fugia como o demônio da cruz quando havia o risco de confrontá-lo. Não Roberto Jefferson.
Nessa época, com iniciativa ainda mais destemida, Jefferson bateu de frente com o “homem”. E foi nesse enfrentamento que surgiu o mensalão. Até hoje suas palavras são repetidas e ecoam por todos os cantos: “Vossa Excelência desperta em mim os instintos mais primitivos”. Para logo em seguida dar a segunda estocada, que começaria a pôr fim no reinado do oponente: “Sai daí, Zé. Sai daí logo antes que você faça réu um homem inocente”. Dois dias depois José Dirceu deixava o cargo de ministro.
Não é apenas uma ou outra virtude que define a capacidade de comunicação desse orador, mas sim um conjunto delas que se somam para determinar o seu desempenho. A começar pelo sangue frio. Quanto mais aguerrido se mostra o oponente, mais controlado e incisivo ele se comporta. Enquanto ouve os ataques, não move um músculo. Permanece sempre impassível. Apenas levanta levemente a sobrancelha, como se dissesse: você não sabe em que vespeiro está se metendo. Não é por acaso que seu livro tem como título: “Nervos de aço”.
Outra qualidade excepcional da sua comunicação é a voz. Ele projeta toda a força da sua personalidade na voz, sempre firme, bem timbrada, sonora. Mesmo falando alto, de forma veemente, não enrouquece. Ao contrário, parece que quanto mais fala, mais a voz adquire consistência e amplia sua força combativa. Com o objetivo de mantê-la em condições de duelar, faz aulas de canto para aprimorar a respiração e fortalecer o aparelho fonador.
Seu vocabulário o qualifica como uma pessoa que leu e estudou muito. Como advogado criminalista desenvolveu uma espécie de reflexo condicionado que lhe permite encontrar as palavras mais apropriadas para vestir e corporificar seus pensamentos.
Sua experiência comandando programas populares de televisão de grande audiência deu a ele o tempero necessário para ser compreendido e admirado por todas as camadas sociais, desde as pessoas humildes até as mais bem-preparadas intelectualmente. Por isso, circula com desenvoltura em todos os ambientes.
Improvisa com enorme facilidade. Fala no instante em que lhe é conferida a palavra com a desenvoltura de quem houvesse se preparado com muita antecedência. Na verdade, se preparou mesmo. A existência toda. Cada mensagem que transmite já foi pensada, estruturada e meditada ao longo da vida, desde a juventude.
A pergunta que todos fazem é esta: como ele pôde chegar a esse nível de comunicação, à essa excelência oratória? Parte da resposta já foi dada – ele se preparou durante a vida toda. Além de ter herdado o DNA do pai, que foi um grande orador, nunca se acomodou. Logo no início da carreira foi estudar com a fonoaudióloga Glorinha Beuttenmüller.
Depois de certa idade, já muito experiente e reverenciado, veio me procurar. Quando perguntei o motivo de fazer um curso comigo, a resposta foi pronta: Polito, alguém que dá aulas de oratória há mais de 40 anos, com certeza terá muito a me ensinar. Ficou muito feliz com o resultado. Foi levado pelas mãos da filha, Cristiane Brasil. Chegou a ser emocionante ver pai e filha na mesma sala de aula.
Com o tempo Roberto Jefferson aprimorou uma qualidade especial – a capacidade de estruturar e organizar rapidamente o raciocínio. Ele domina todos os fundamentos da retórica. Ao abrir a boca já sabe todos os caminhos que o seu discurso irá percorrer, desde o exórdio até a peroração. Só muda a trajetória quando sua sensibilidade indica que a plateia talvez desejasse outra abordagem para aquela situação.
Hoje seus adversários são outros. É gente mais poderosa, que veste toga e ocupa os cargos mais importantes da nação. Ao vê-lo nesse enfrentamento, quase todos se impressionam: como pode ser assim beligerante em situação tão desafiadora? Como ele pode não ter medo? Como não se sente intimidado? Ele mesmo responde: o que precisa ser feito deve ser feito, e muito bem feito. Sei que posso ser a voz daqueles que precisam se manifestar.
Reinaldo Polito é Mestre em Ciências da Comunicação e professor de oratória nos cursos de pós-graduação em Marketing Político e Gestão corporativa na ECA-USP. Escreveu 34 livros, com mais 1,5 milhão de exemplares vendidos em 39 países. Siga no Instagram: @polito pelo facebook.com/reinaldopolito pergunte no contatos@polito.com.br