Foram encontradas 135 ligações entre Dias e a CEO da VTC Operadora Logística, empresa que obteve aditivo de R$ 18 milhões em contrato
A quebra de sigilo telefônico do ex-diretor de logística do Ministério da Saúde Roberto Dia relevou uma série de contatos com a VTC Operadora Logística, empresa investigada pela CPI da Covid-19. Os dados também contam com ligações e mensagem de texto com políticos da base aliada do governo de Jair Bolsonaro.
O material, obtido pelo jornal O Globo, abrange o período entre abril de 2020 e junho de 2021 e não considera chamadas realizadas por aplicativos como Whatsapp e Telegram. No total, foram encontradas 135 ligações entre Dias e a CEO da VTC Operadora Logística, Andreia Lima, somando 4 horas e 18 minutos. Dessas, 129 chamadas partiram do celular de Lima e seis foram realizadas por Roberto Dias.
Em meio a suspeitas envolvendo os contratos com o Ministério da Saúde, a VTC Log, que armazena e distribui insumos como vacinas, é investigada pela CPI. Os negócios da empresa com a pasta aumentaram 70% no período em que o ministério foi comandado pelo atual líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Do total de R$ 257 milhões nos contratos, R$ 253 milhões foram sem licitação.
Documentos obtidos pelo Jornal Nacional também mostram que o Departamento de Logística do Ministério da Saúde, na gestão de Roberto Dias, teria autorizado contrato com valor 1.800% mais caro do que o recomendado por parecer técnico. Segundo o jornal, as ligações ocorreram em períodos próximos às datas nas quais o ministério e a empresa negociavam sobre valores que a VTC alegava ter direito a receber.
Ligações
Entre 21 de outubro de 2020 e 20 de maio de 2021, a negociação transcorreu sobre o valor envolvendo uma fatura enviada ao ministério. Inicialmente, a empresa havia pedido R$ 53 milhões, mas, em janeiro, o valor passou para R$ 55 milhões e a empresa cobrou o pagamento. Houve uma ligação de Andreia para Dias após o envio da primeira cobrança e outra seis dias após o envio da segunda cobrança.
Em 16 de fevereiro, um novo ofício chegou ao ministério, com uma atualização para R$ 57 milhões no valor. Entre 17 e 24 de fevereiro, Andreia e Dias se falaram 12 vezes.
Por fim, Dias e dois sócios da VTC assinaram um acordo para que houvesse um aditivo de R$ 18 milhões no preço original. O montante era 1.800% maior do que o recomendado pela área técnica da pasta. Dois dias após a assinatura, às 23h24, Andreia ligou para Dias.
Base do governo
Entre os políticos da base do governo que aparecem no histórico de chamadas, está o ex-presidente do Senado Davi Alcolumbre (DEM-AP). O senador é apontado como um dos responsáveis por tentar impedir que Dias fosse exonerado, em outubro. Alcolumbre também tentou revogar a prisão do ex-diretor de logística após depoimento na CPI.
O ex-deputado Abelardo Lupion (DEM-PR), apontado como “padrinho” da indicação de Dias para o cargo de diretor de logística do Ministério da Saúde, aparece 24 vezes no histórico de ligações, entre abril de 2020 e maio de 2021. Desse total, 15 ocorreram após a exoneração de Lupion como diretor de programa do Ministério da Saúde.
Um das ligações foi feita em 25 de fevereiro, às 18h57. O horário coincide com o período em que houve o jantar entre Dias e o representante da empresa de vacinas Davati Medical Supply Luiz Paulo Dominguetti Pereira. Na ocasião, se ventilou a cobrança de uma suposta propina sobre a compra de 400 milhões de doses de vacina.
Em resposta aos questionamentos, o ex-deputado Lupion afirma que tem “uma boa relação de amizade” com o ex-diretor. “Nos falamos informalmente e sem qualquer assunto que não fosse ético”, diz.
Dias também recebeu uma mensagem de texto do líder do Governo na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR), em 16 de julho de 2020. Em depoimento à CPI, o deputado Luis Miranda (DEM-DF) afirmou que Jair Bolsonaro citou o nome de Barros como possível envolvido em esquema de corrupção, ao ouvir denúncia sobre os supostos problemas relacionados à negociação para aquisição da Covaxin. Barros nega envolvimento. Procurado, Ricardo Barros afirma não ter registro da mensagem.
A defesa de Roberto Dias afirma que não teve acesso aos documentos e que, por isso, não poderia se manifestar.
Em nota, a VTC Log diz desconhecer “qualquer vantagem ou aumentos expressivos em contratos firmados com o ministério entre 2016 e 2017”. Em relação ao aditivo, a empresa negou qualquer irregularidade por meio de um ofício enviado à comissão.