*Frutuoso Chaves
Somos um número de computador. Cada um de nós, ricos e pobres, velhos e novos, sem exceção. Com base nisso, a farmácia da esquina, a livraria, a loja de eletrodomésticos e os diversos setores do governo acompanham nosso dia a dia.
Não é à toa que nos pedem o CPF mesmo nas pequenas compras à vista. Tenho, particularmente, a impressão de que laboratórios do mundo inteiro sabem que sou diabético, a julgar pelo volume de propagandas que me caem no computador. E, isso, a partir da primeira compra do remédio na Farmácia de Arnaldo, aquele da Beira Rio, em João Pessoa. O mesmo a quem o deboche popular tinha como Ministro da Saúde, ao cabo de três mudanças no setor: Mandetta, Teich e Pazuello. Deu Queiroga, tão paraibano quanto Arnaldo e, ao que parece, tão insatisfeito quanto os antecessores, a julgar pela queixa recente no enfrentamento da pandemia: “Não posso fazer tudo sozinho”. Mas essa é outra história.
Importa, agora, é afirmar: o governo tem condições de saber quem é você, onde vive, quanto ganha, o que compra, ou o que vende. Nada pode escapar dos olhos e sentidos do mecanismo estatal, o enorme conjunto de entes que formam o famígero Sistema. Em escala mundial, o Big Brother do icônico “1984”, a obra futurista de George Orwell, porquanto escrita em 1949, por aí assim. Quando não sabe, isso decorre do desleixo e da omissão.
É o caso da Previdência Social. Por que diabo insiste em obrigar multidões de cabelos brancos às tais provas de vida sob pena de suspensão imediata de proventos, em sua maioria, magros e vergonhosos? Por que não sabe de mim e de muitos de vocês tanto quanto sabe o Magazine Luiza?
Não bastaria dar uma olhada nas certidões de óbitos dos cartórios? Ou no banco de dados da Receita a fim de ver quem ainda enfrenta o Leão? Quem viaja? Quem vota? Quem mesmo aposentado ainda trabalha e recebe salário? Quem toma o remédio nominalmente prescrito em garranchos que a farmácia decifra e despacha? Quem padece nos Postos da Saúde Pública com atendimento ruim, mas digitalizado? Quem usa e-mail e fala mal do governo nas redes sociais? Isso é possível porque tudo pode ser vigiado.
A Previdência não sabe se eu ainda estou vivo por ser desleixada e imprevidente. Não compartilha banco de dados. Não vai à lista de contribuintes. Nem aos cartórios de registro civil sem cuja licença ninguém se enterra. E pensar que seu pessoal poderia checar tudo isso sem sair da cadeira. Porém, ao contrário, prefere obrigar milhões e milhões ao traslado dispensável e perigoso até o guichê de um banco, em tempo de pandemia.
Não há justificativa para o mau aproveitamento da informatização tão ampla das ações e dos serviços públicos, com gastos de bilhões. Os sucessivos governos, paquidermes incorrigíveis, não podem arrotar modernidades com a cabeça, ainda, na era do carimbo.
Quem estranhar o mau humor ponha-se no meu lugar. Vá a uma fila de banco e ali retire uma ficha “P 043”. E espere sentado que 42 seres “preferenciais” como você sejam vagarosamente atendidos. Tudo isso para dizer: “Estou vivo”.
*Jornalista profissional com passagens pelos jornais paraibanos A União (Redator e Chefe de Reportagem), Correio (Redator e Editor de Economia), Jornal da Paraíba (Editorialista), O Norte (Editor Geral), O Globo do Rio de Janeiro e Jornal do Commercio do Recife (correspondente na Paraíba, em ambos os casos). Também pelas Revistas A Carta (editada em João Pessoa) e Algomais (no Recife).