Maria José Rocha Lima*
O professor João Pereira Leite era um mestre invulnerável, aquela pessoa que impunha respeito pela sua reputação, que estava acima de qualquer ataque ou crítica. Eu e a professora Marinalva Nunes conversávamos sobre a necessidade de reproduzir aquela experiência que realizei na Assembleia Legislativa da Bahia- ALBA-, na Sessão Solene intitulada Obrigado, Professor. Obrigada, Professora, mas, dessa vez, para prestar homenagens às lideranças do magistério baiano, do final da década de 70 e da década de 80, com as quais convivemos cotidianamente e que construíram a Associação dos Professores Licenciados da Bahia –APLB de Base e a transformaram no grande APLB – Sindicato dos Trabalhadores em Educação. E imediatamente nos veio à memória o professor João Leite.
Em 1998, o professor João Leite foi homenageado na ALBA, por Clarindo Silva, personalidade cultural da Bahia, que fora beneficiado por ele como aluno no Colégio Severino Vieira e, extremamente grato, escreveu ao mestre: “Quase quarenta anos depois, segue a mesma trajetória de humanista, sempre tenho tido a honra da sua visita no nosso modesto estabelecimento”.
O professor João Leite era um homem simples, não exibia vaidade. Tinha uma sólida formação filosófica, pois tinha sido seminarista, embora se esquivasse de falar sobre isso, talvez para não assombrar os comunistas. Além da sua formação em Letras Clássicas pelo Instituto Superior de Estudos Clássicos (1946), graduação em Pedagogia pela Universidade Federal da Bahia (1954) e mestrado em Educação pela Universidade Federal da Bahia (1977), foi professor da rede estadual de ensino da Bahia, da Universidade Federal da Bahia-UFBa e professor titular e Coordenador do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Católica do Salvador-UCSal-.
Na sua trajetória profissional, era um professor muito querido pelos alunos, pelos colegas e pelos companheiros, termo que ele usava com parcimônia.
Em 1979, o professor João Leite, que já havia dirigido APLB na década de 60, em pleno regime de exceção, voltou a militar dedicadamente no Grupo de Fortalecimento da APLB, que criamos para defender o ingresso das professoras primárias e a construção da APLB de Base, com organizações nos bairros e cidades do interior. A essa tarefa de pensar a organização de base ele se entregou devotadamente. Leite muito se impressionara com a atuação do Movimento dos Professores Primários, durante a Greve de 1979. Era uma nova concepção de organização, atuávamos fortemente na base, criando as coordenações regionais de bairros, levando as decisões da greve para as assembleias de base, garantindo a discussão em igrejas, associações de bairros, com os pais e estudantes. Também buscávamos identificar lideranças intermediárias e iniciamos uma mobilização nesse sentido, filiando todo e qualquer professor que, mesmo atuando nas classes iniciais, portassem diploma de curso no ensino superior. Diferentemente dos professores licenciados, nós, dirigentes do movimento dos professores primários, entendíamos que era necessário ampliar as filiações de professores à APLB, que era necessário transformar a APLB numa entidade de massas. Com o fortalecimento desse Movimento das Professoras Primárias e sua ampliação, os próprios licenciados tiveram de ceder, deixando de ser uma associação de licenciados para se tornar uma associação de todos os professores.
No livro O Movimento de Professores da Rede Estadual da Bahia, da professora Nilda Moreira dos Santos (1989), em entrevista que dei à pesquisadora, eu destaco o papel do professor João Pereira Leite na sistematização para a construção das regionais, delegacias e núcleos do sindicato no interior e as zonais da capital do Estado da Bahia. Visitamos juntos muitas escolas, na capital e no interior, ele era uma espécie de passaporte para ingresso da gente nas escolas, nas quais os professores viviam encurralados pelos governos autoritários, que pressionavam os diretores, argumentando que éramos comunistas invadindo as escolas. Essas alegações justificaram a perseguição à professora Marinalva Nunes e a minha demissão e da professora Edenice Santana de Jesus, por participação em greve.
O Professor João Leite facilitava o nosso ingresso no início da militância tanto pelos seus cabelos brancos, pela sua trajetória, quanto pelo seu conhecimento da rede e dedicação à causa organizativa.
Obrigada, Professor João Leite!
Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em educação. Foi presidente da APLB. Deputada de 1990 a 1999. Presidente da Casa da Educação Anísio Teixeira. Psicanalista da ABEPP. Membro do Clube Internacional das Soroptimistas Sudoeste Brasília.