Os cinco nomes hoje colocados encaram, em diferentes graus e características, cisões em suas legendas e a polarização continua
Pré-candidatos da centro-direita na corrida presidencial que tentam salvar a chamada terceira via com um enxugamento do quadro de nomes colocados terão antes que lidar com divisões internas nos próprios partidos, que dificultam a coesão em torno de um projeto alternativo.
Os cinco nomes hoje colocados encaram, em diferentes graus e características, cisões em suas legendas, mais um empecilho na busca de uma candidatura que faça frente aos atuais líderes das pesquisas, o ex-presidente Lula (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL).
Articuladores admitem em conversas reservadas ser crescente o desafio de romper o favoritismo de Lula e Bolsonaro, que confere ares de segundo turno à eleição. O marasmo nas pesquisas reflete um cenário estável, com outros postulantes incapazes até aqui de apontarem alguma reviravolta.
Expressões como desespero, pessimismo e desânimo já são ditas nos bastidores, embora em público o discurso continue sendo o de que a aglutinação do segmento é a solução para conquistar até outubro a parcela da população “avessa aos extremos” e que isso será só uma questão de tempo.
As negociações em torno da migração de Eduardo Leite do PSDB para o PSD, que agitaram o grupo nos últimos dias, são vistas como uma espécie de cartada final. O destino do governador do Rio Grande do Sul, derrotado nas prévias tucanas por João Doria (SP), ainda é uma incógnita.
A alentada crise no PSDB, sigla sem sinais de pacificação interna diante da série de problemas que envolve Doria, é o sinal mais evidente dos obstáculos domésticos de cada presidenciável rumo a uma unificação, o que implica estar disposto a abrir mão da candidatura.
Prestes a deixar o Palácio dos Bandeirantes, o tucano usará todas as armas que puder para manter a campanha e fazê-la deslanchar, avaliam tanto aliados quanto rivais, que ressaltam sua obstinação.
A movimentação que dribla as prévias realizadas em novembro é sintoma da insatisfação de alas da sigla com o paulista. O adversário interno Aécio Neves (MG) é um dos que operam pela saída dele do páreo, reforçada pelos baixos índices de intenção de voto e altos de rejeição.
Os prognósticos para uma eventual ida de Leite para o PSD tampouco soam animadores em termos de coesão interna. A agremiação presidida pelo ex-ministro Gilberto Kassab abriga de bolsonaristas a lulistas, que priorizam suas próprias bases e nem cogitam confrontá-las.
O pré-candidato Sergio Moro (Podemos), que entusiasmou setores políticos com sua entrada formal na política, em novembro, agora vê membros do partido reavaliando a aposta. A impressão de que ele bateu no teto e dificilmente será o nome de consenso se ampliou nos últimos dias.
Estagnado nas sondagens, sem ultrapassar a barreira dos 10%, o ex-juiz e ex-ministro de Bolsonaro é alvo de contestação de parlamentares da legenda por causa da divisão dos valores do fundo eleitoral. O temor é que seja drenado dinheiro demais para alguém sem chances reais de vitória.
O líder do Podemos na Câmara dos Deputados, Igor Timo (MG), tem dito que seria um equívoco focar os gastos em um projeto presidencial e deixar descobertas as candidaturas ao Legislativo, enfraquecendo a legenda.
A briga pela repartição da verba é motivo de queixa, de forma geral, em partidos que lançaram nomes pouco competitivos para o Planalto. Pré-candidatos a governos estaduais também reivindicam uma fatia do fundo, além de rechaçarem a associação a chapas problemáticas.
A situação de Moro se degringolou com os danos da crise com o MBL (Movimento Brasil Livre). O grupo se afastou do partido após o escândalo das falas sexistas do deputado estadual Arthur do Val, o Mamãe Falei (que deixou a sigla após o vazamento), mas disse manter apoio ao ex-juiz.
O ex-magistrado foi aconselhado a romper de vez com o MBL para tentar se descolar dos ruídos, mas reiterou que a relação “continua firme e forte” e rebateu a afirmação de Doria de que a atitude de Arthur, até então aliado de Moro, “fragilizou evidentemente” a candidatura e o partido.
Procurados, PSDB, PSD e Podemos não se manifestaram.
No MDB, a pré-candidatura de Simone Tebet sofre sinais de boicote de líderes alinhados a Lula —casos do senador Renan Calheiros (AL) e do ex-senador Eunício Oliveira (CE). O partido também tem simpatizantes de Bolsonaro, sobretudo no Sul, como o deputado federal Osmar Terra (RS).
A legenda, em nota à Folha, minimiza as divergências e diz que a escolha de Tebet se deu de forma democrática, por unanimidade, em reunião da comissão executiva nacional. “O que une o partido é o ponto de equilíbrio, e a Simone é porta-voz disso”, afirma a assessoria de imprensa.
O comunicado diz ainda que Renan e Eunício, dois dos principais cabos eleitorais de Lula na sigla, “são forças importantes. Todas elas respeitam Simone, e vice-versa”. O MDB também afirma que o nome da pré-candidata “será homologado pela convenção nacional”.
Os esforços por um polo alternativo envolvem também a União Brasil, resultado da fusão de DEM e PSL, o que já na raiz embute algum tipo de fragmentação. O partido tem propagado, sem citar nomes, que terá candidato próprio à Presidência e dialoga com PSDB e MDB para um arranjo comum.
Inicialmente alijado da mesa de negociações, Moro foi convidado a se unir ao grupo. O mesmo ocorreu, como revelou a Folha, com o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), que rechaça o rótulo de terceira via e refuta se aliar a rivais como Moro e Doria, embora busque palanques com União Brasil e PSD.
Para o deputado federal Junior Bozzella (União-SP), as “divisões [no partido] estão superadas” graças ao presidente da sigla, Luciano Bivar (PE), “que tem liderado bem esse processo de aglutinação das correntes em torno da proposta dele, de ter candidato e sentar nessa mesa de discussão”.
Bivar, que também é deputado federal, tende a ser a opção de concorrente apresentada para a negociação, embora uma candidatura dele seja tratada com ceticismo pelos demais articuladores.
Segundo Bozzella, é preciso “ter um nome para ser colocado e ir depurando”. “Eu só enxergo hoje o Bivar. Ele está habilitado. O que a gente tem é uma necessidade de união para que a terceira não se torne a quarta, quinta ou sexta via”, completa.
No Novo, Luiz Felipe d’Avila assumiu a pré-candidatura após a desistência de João Amoêdo em meio ao racha entre bolsonaristas e antibolsonaristas na legenda. O empresário, que concorreu ao Planalto em 2018, virou um duro crítico do presidente e entrou em choque com parlamentares.
Os atritos em torno da oposição a Bolsonaro “foram superdimensionados”, contemporiza o presidente nacional do Novo, Eduardo Ribeiro, que classifica o partido hoje como “coeso e pacificado” em torno da candidatura de d’Avila, cientista político que já pertenceu ao PSDB.
“Na questão de clima interno, o Novo é o que mais está engrenado e alinhado para ir para a arena. Todos querem que o Felipe cresça nas pesquisas e possa ajudar a aglutinar [a terceira via]”, diz Ribeiro. “Nosso desafio é torná-lo mais conhecido e mostrar que ele é o mais qualificado.”
“Todos os que estão falando em união têm que estar dispostos a abrir mão lá na frente. Confesso que já fui mais otimista, mas acho que a decisão tem que ser tomada mais à frente, porque ainda falta muito tempo. Sempre existem os fatores imponderáveis. Seria prematuro resolver agora”, afirma.
O dirigente admite, entretanto, que “o campo está muito congestionado” e o cenário das pesquisas “não mudou” nos últimos seis meses. Diz que é porque o eleitor “ainda não está 100% dedicado à escolha dos candidatos”.
A situação foi classificada pelo cientista político Alberto Carlos Almeida, em uma rede social, como “eleição entediante na opinião pública”. Autor de livros como “A Cabeça do Eleitor” e “O Voto do Brasileiro”, ele observou estabilidade nas pesquisas desde o segundo semestre de 2021.
“Na média, há uma variação muito pequena. Isso acontece por conta de um ineditismo: temos um presidente em busca da reeleição que pauta a mídia e um ex-presidente que nunca saiu dela. Sem falar que são dois líderes com muita envergadura junto à opinião pública e à militância”, diz.
Para o analista, “a polarização está muito consolidada” porque os demais postulantes “não empolgam” e se limitam ao buscarem o voto de eleitores que avaliam o governo Bolsonaro como ruim ou péssimo, camada que “já está com Lula”, identificado como a força de oposição.
“Quando a terceira via ataca Lula, aí é que não vai mesmo conseguir capturar esse voto. A principal dificuldade dela é alcançar uma imagem tão oposicionista quanto a de Lula e do PT. E isso é agravado pelo fato de que todos, em alguma medida, estiveram junto de Bolsonaro”, diz Almeida.