Projeto deve ser enviado à Câmara nos próximos dias. Segundo o prefeito Ricardo Nunes, se aprovado, beneficio valerá para 2024 e 2025. Região reflete a espiral da violência e insegurança na capital paulista.
Polícia Civil e GCM faz ação na região da Cracolândia, no entro de SP — Foto: Reprodução/TV Globo
Por Léo Arcoverde e Lívia Machado, GloboNews e g1 — São Paulo
A prefeitura de São Paulo quer isentar o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) de imóveis da região da Cracolândia, no Centro de São Paulo.
Segundo o prefeito Ricardo Nunes (MDB), a proposta deve ser enviada à Câmara “o mais rápido possível”.
Ao g1, o prefeito disse que a ideia é que o benefício, se aprovado pelos vereadores, passe a valer para os anos de 2024 e 2025, o que irá afetar o orçamento da próxima gestão.
Nunes disse que a gestão municipal tem dinheiro para viabilizar a proposta e considera injusto cobrar o imposto das pessoas que trabalham e residem na área.
“Não é justo cobrar IPTU das pessoas que estão vivendo todo esse problema”, disse Nunes.
A região reflete a espiral da violência na capital paulista. O problema se arrasta há décadas e é tratado de diferentes formas a cada nova gestão.
Nos últimos anos, a prefeitura e o estado passaram a realizar ações policiais para dispersar usuários de drogas que ficavam concentrados em determinadas ruas. A fez com que os usuários se espalhassem pela região e afetou a vida de comerciantes e moradores, que relatam o aumento da violência e insegurança.
Drogas e violência
Na semana passada, 15 pessoas ligadas ao tráfico de drogas foram presas na região da Cracolândia.
O local tem sido alvo constante de operações policiais. Em entrevista à GloboNews no dia 31 de julho, o padre Julio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo da Rua de São Paulo, falou sobre as intervenções e de como funciona o tráfico de drogas no local.
“A Cracolândia existe porque é um negócio rentável. Infelizmente a gente tem que, sem atacar ninguém, sem generalizar, sem dizer que são todos, mas há muito acordo, a Cracolândia funciona em cima de acordos, em cima de lucro, em cima de ganho”.
“Aquilo tudo é loteado, tudo aquilo tem interesses econômicos muito grandes. Enquanto a gente não chegar na origem de tudo isso, quem é que ganha tudo isso, quem é que comanda, porque quem comanda não está lá e não vai ser facilmente pego. A gente precisa ter uma sinceridade e uma transparência para ir nas origens de tudo isso e enfrentar esse problema do tamanho que ele é e não mirar só nos efeitos”, ressalta.
Ainda conforme o padre, na missão Belém tem 2,2 mil acolhidos que vieram da Cracolândia, mas que isso não impede o tráfico de continuar.
Já passaram na missão Belém mais de 40 mil pessoas. Isso tudo não significou nenhum prejuízo para o tráfico, porque se fosse prejuízo já teriam matado o padre João Pedro, que é o responsável da missão Belém, ou teriam me matado também”.
“E não é só lá que se usa crack na cidade, ali é o crack visível, mas se usa crack em muitas regiões na cidade. Ali está um foco e aquele foco é muito ligado à questão imobiliária. Vejam, quem é que já comprou quase toda aquela região? Aquela região privilegiada da cidade, porque é uma das únicas áreas planas da cidade”, ressaltou.
Segundo padre Julio, o crime organizado é um crime que tem a participação de agentes do estado. “Essa é a definição moderna de crime organizado. O crime não é organizado porque o traficante tem Whatsapp, porque ele usa e-mail, porque ele tem notebook, smartphone”, diz.
“Qual que é o transporte mais seguro pra droga? Como é que a droga chega lá e ninguém pega se eles filmaram até a caixinha azul que tinha a pedrinha de crack? Como é que eles não filmaram o carro que leva a droga? É porque eles não querem resolver essa questão, porque essa questão está ligada ao mercado imobiliário, está ligada à corrupção e ao crime organizado e as pessoas que estão lá são o fim da linha, as pessoas que sofrem, que são dependentes, que levam as bombas de gás, os que levam bomba de borracha, os que são humilhados e escrachados”, disse.
Operação
GCMs em operação na Cracolândia neste domingo (30) — Foto: Divulgação/GCM
De acordo com a Secretaria da Segurança Pública (SSP) foram apreendidas 75 porções de cocaína, 39 porções de maconha e 16 porções de drogas K.
Segundo as autoridades, um dos detidos havia sido autuado em flagrante pelo crime de tráfico de drogas na última sexta-feira (28), no mesmo local, mas teria sido solto em audiência de custódia no sábado (29).
A SSP informou que participaram da operação 60 policiais civis em 30 viaturas. Agentes da Guarda Civil Metropolitana (GCM) realizaram a contenção dos dependentes químicos, enquanto os agentes da Polícia Civil efetuaram a identificação dos procurados. Policiais militares patrulharam a área — tática que tem sido adotada nas últimas operações no Centro.
De acordo com a GCM, a operação ocorreu sem contratempos e o perímetro das cenas abertas de uso foi controlado com facilidade.
Somente na última semana, as ações conjuntas das forças de segurança resultaram em 24 prisões na região da Cracolândia, sem contar as deste domingo. Dentre elas, a de um homem de 44 anos, detido em flagrante na quarta-feira (27) com 1,5 kg de crack e R$ 12 mil reais em espécie.
Segundo as investigações, ele viajava semanalmente para o litoral do estado para adquirir matéria-prima para fabricação da droga que seria distribuída no Centro da capital.
Intervenção na Cracolândia
Na quinta-feira (27), a Defensoria Pública do Estado divulgou um relatório que aponta a ineficácia da estratégia de intervenção policial adotada ao longo dos últimos anos para lidar com a questão da Cracolândia.
Ainda segundo o relatório, 90% das prisões em massa realizadas na região durante a 6ª fase da Operação Caronte — apelidada por um dos detidos de “Operação Cachimbo” —, foram consideradas ilegais pela Justiça e arquivadas.