móvel, que aguarda leilão há anos, fica no Setor Comercial Sul. Trabalhadores dizem que posto da PM não impede o aumento da criminalidade
Hugo Barreto/Metrópoles
Com aspecto abandonado, um prédio no Setor Comercial Sul (SCS), no centro de Brasília, tem sido ocupado por usuários de drogas e tornou-se ponto de tráfico, mesmo localizado ao lado de um posto 24 horas da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF). O espaço ocupado fica no bloco C da Quadra 5 do SCS, em frente ao Edifício Israel Pinheiro.
Quem passa pela região diz que a presença de agentes da segurança pública não impede o crescimento da criminalidade. O Metrópoles conversou com alguns trabalhadores, que relataram aumento da violência durante a pandemia de Covid-19. Os profissionais entrevistados não serão identificados na reportagem.
“Antes da pandemia, eles eram poucos, pois aqui era um lugar mais movimentado. Mas, nos últimos dois anos, muitas lojas fecharam e aumentou o perigo”, diz um funcionário de um empreendimento na região. Ele relata que trabalha há oito anos no SCS e que, desde então, nunca tinha visto o ambiente tão inseguro.
“Eles brigam entre si, direto aparece um esfaqueado. A partir das 17h, fica intransitável [a área próxima ao bloco C]”, afirma. “Tráfico rola o dia inteiro, prostituição também é alta depois das 19h”, completa.
Outro homem, que trabalha no edifício em frente ao bloco C, já observou brigas entre os ocupantes do prédio. “Há uns 15 dias, houve uma briga em frente à Cacau Show, por volta das 15h. Um morador de rua estava tentando tirar a mochila de outra moradora, aí chegaram uns cinco para ajudá-la. Ela pegou uma cadeira para jogar nele e nisso já chegou outro batendo. Depois, jogaram o cara de cima do parapeito. As lojistas da Cacau Show correram para fechar a loja”, narra.
“Ali agora é intransitável. Tem dia que chego 7h50 no trabalho e eles já estão com música alta, cantando. Eles têm televisão, geladeira, som, se instalaram mesmo”, comenta. Além de eletrodomésticos, o grupo tem barracas, banheiro e varal de roupas.
Imóvel vai a leilão
O bloco C é dividido em diferentes partes. O canto do prédio próximo ao posto da PM, que está ocupado por pessoas em situação de rua, já não tem mais comércios funcionando. Do outro lado, uma loja da Cacau Show e uma lotérica são os únicos empreendimentos que seguem abertos.
A área do bloco invadida é a de um imóvel que pertence ao Governo da Paraíba. Isso porque, segundo o governo daquele estado, o edifício foi adquirido por meio de desapropriação amigável, em 1998, para instalação do Banco Paraiban. Com a privatização da instituição financeira, ocorrida em 8 de novembro de 2001, em que o adquirente em leilão foi o Banco ABN AMRO, o imóvel passou a integrar o Acervo Público Estadual da Paraíba, e permanece desocupado até hoje.
Procurado, o Governo da Paraíba informou que, desde então, foram realizados três leilões com a finalidade de alienação do imóvel, nas datas: 18 de setembro de 2017, 19 de dezembro de 2018 e 20 de outubro de 2021. No entanto, todos restaram desertos, isto é, não apareceram interessados.
Ainda segundo o governo do estado, “a prefeita do Setor Comercial Sul, Lígea Meireles, relatou (via WhatsApp) à Secretaria de Administração em 23/02/2021 que fora feito um acordo de cooperação com a ONG que ampara os moradores de rua da área, e segundo ela, a ONG perdeu totalmente o controle quanto à ocupação do espaço urbano da região, culminando assim com as invasões, depredações e depreciações, a exemplo de incêndios”. “A prefeita Lígea Meirelles informou também que há expediente do Ministério Público recomendando a não interferência militar junto aos moradores de rua.”
Em uma das paredes do prédio, um anúncio diz que o imóvel irá a leilão. A reportagem telefonou para os números que aparecem no anúncio e falou com um homem que se identificou como Cléber Melo, leiloeiro da empresa Leilões PB.
Segundo ele – que não informou os valores dos leilões anteriores –, o preço agora será reavaliado, “porque essa região está muito complicada, cheia de usuários, e desvalorizou toda a área”. “Não apareceu ninguém quando fizemos o leilão e o Governo da Paraíba não está mais interessado neste prédio”, pontuou.
Criminalidade
Em fevereiro deste ano, a loja da Cacau Show chegou a ser furtada em um fim de semana, quando estava fechada. Segundo comerciantes, os ladrões seguiram por dentro do prédio e quebraram uma parede para ter acesso ao interior da loja.
O Metrópoles conversou com uma proprietária de lojas do edifício. Ela conta ter tido dificuldades em alugar os espaços, especialmente por conta da criminalidade. “Essas lojas já são caras e não tenho como abaixar o aluguel. Além disso, aquela rua específica fica tomada por moradores de rua, o que com certeza dificulta”, lamenta.
Para uma mulher de 30 anos que trabalha na localidade, a insegurança afeta inclusive a clientela. “Impacta o atendimento ao cliente, porque as pessoas ficam com medo de vir até aqui.” Ainda de acordo com ela, o tráfico de drogas atrai pessoas de alto poder aquisitivo. “É um local que parece não chamar muita atenção de gente assim, mas as pessoas que buscam drogas aqui são de alta classe. E sabemos que, enquanto houver demanda, vai continuar sendo um ponto de tráfico”, diz.
Presença da PM
Para alguns, a presença da PM ameniza a sensação de insegurança. “A Justiça é muito falha. Já vi a PM prender numa quinta, e na sexta a pessoa estar aí de volta, solta. Às vezes, a polícia faz a parte dela, mas a Justiça solta”, avalia uma trabalhadora.
Outros, porém, questionam como a criminalidade se mantém dia e noite, mesmo com a presença da força de segurança ao lado. “Eu acho que é um descaso mesmo, porque como pode acontecer assalto com o posto policial ao lado? Eu saio 20h daqui e temos que formar grupos para descer, porque é bem perigoso”, diz um jovem de 23 anos.
O que diz a PMDF
Em nota, a Polícia Militar do DF disse que “o crime é multifacetado, exige a participação de outros órgãos para que seu combate seja efetivo, não apenas da PMDF”. “A maioria desses crimes é cometido por moradores em situação de rua e por usuários de drogas, sendo um problema que extrapola a esfera da segurança pública sendo, também, uma problemática de ordem social e de políticas públicas”, destaca a corporação.
“Os usuários de drogas, grande parte reincidentes, são encaminhados à delegacia todos os dias, mas são soltos logo após assinarem um TCO. Os responsáveis pelo edifício devem ser notificados para que tomem providências a respeito da ocupação”, finaliza.
O que diz o GDF
Procurado, o GDF encaminhou nota da Secretaria de Desenvolvimento Social. A pasta disse que a equipe de Abordagem Social não faz atendimentos em prédios particulares. Confira na íntegra:
“Pelos dados de março do Serviço Especializado de Abordagem Social, cerca de 2.130 pessoas se declaram em situação de rua no DF. O GDF possui, atualmente, 28 equipes para fazer a busca ativa e buscar incluir essas pessoas na rede de atendimento e proteção social. A área central de Brasília é uma região em que a equipe de agentes sociais permanecem das 7h às 22h, dependendo temos ações que são realizadas durantes horários da madrugada pela equipe da Unidade de Proteção Social 24h.
Durante os atendimentos, a Sedes faz o encaminhamento para os diversos serviços da rede de Saúde, Justiça, documentação básica da PCDF, transporte, o que comprova a intersetorialidade do trabalhado realizado com as pessoas que vivem em risco social pelas ruas do DF.
Além disso, a Política de Assistência Social conta ainda com 12 Centros Especializados de Assistência Social (CREAS) e dois Centros POP, equipamentos que realizam o acompanhamento da população de rua.
Durante a pandemia, foi ampliado o serviço dos Centros Pop para atendimento diário (inclusive sábado e domingo) das 7h às 19h, como também foi ampliada a oferta de alimentação com entrega de almoço, além da inclusão desse público na gratuidade em todos os restaurantes comunitários do DF.
São 19 unidades do serviços de acolhimento institucional para adultos e famílias no Distrito Federal. Os serviços de acolhimento estão espalhados por todo o Distrito Federal, com unidades nas Regiões Administrativas do Areal, Ceilândia, Gama, Guará, Itapoã, Planaltina, Taguatinga e São Sebastião. Cada serviço de acolhimento tem uma capacidade instalada específica, sendo o menor com 26 pessoas e o maior com 100 pessoas. A média diária de pessoas acolhidas nos serviços de acolhimento da SEDES é de 855.
Já em relação à orientação para a população que quiser ajudar essas pessoas, se for ajuda diretamente à pessoa, é importante sensibilizá-la a procurar algum atendimento da SEDES, seja por meio das equipes de busca ativa, seja por meio de alguma de nossas unidades. Se for com doações, procurar uma unidade da Secretaria e ofertar. Assim, será possível um melhor direcionamento.
Lembrando que a Sedes não atua em políticas de drogadição. É uma pauta da política pública de saúde ou, se for o caso, da segurança pública. É preciso esclarecer ainda que não se trata de um serviço para retirada compulsória de pessoas em situação de rua, pois esse não é o foco do trabalho das 28 equipes que executam essa ação em todo o Distrito Federal. Trata-se de um atendimento nos espaços públicos da rua para inserção na Política de Assistência Social e demais políticas públicas, tais como: Saúde, Justiça, Educação, Trabalho, dentre outras.”