Yin Weidong aposta na regularização da vinda de insumos da China para o Brasil e em mais vacinação para país voltar ao normal
RIO – Comandante da Sinovac, a farmacêutica chinesa que produz uma das duas únicas vacinas contra a Covid-19 aprovadas até o momento no Brasil para uso emergencial, Yin Weidong defende a eficácia do imunizante que será produzido no país pelo Instituto Butantan. A CoronaVac é o imunizante, aposta, “capaz de frear a pandemia no Brasil”.
— Nosso foco é nos “três nãos”: não à necessidade de tratamento médico, não à doença severa e não à morte. De acordo com a fase três dos testes clínicos, esse objetivo pode ser alcançado — diz o CEO.
Yin disse ainda que a nova variante da Covid-19 detectada no Amazonas preocupa os chineses, mas que testes mostraram que a CoronaVac oferece proteção também para algumas das novas mutações do vírus.
O novo surto de Covid-19 que colocou o gigante asiático em alerta nas últimas semanas acabou alterando na última hora o local da entrevista. É que a região em que se localiza a nova unidade da Sinovac onde está sendo fabricada a CoronaVac entrou em lockdown após a descoberta de novos casos do vírus.
A Sinovac antecipou que o presidente da empresa não responderia a duas questões: sobre o envolvimento de Yin Weidong num caso de suborno a um funcionário de uma agência reguladora chinesa entre 2002 e 2011; e sobre detalhes do contrato da Sinovac com o Butantan que teriam impedido o instituto brasileiro de divulgar os resultados completos dos testes clínicos feitos no Brasil.
Mais tarde, o laboratório enviou nota ao GLOBO em que esclarece que a Sinovac “está concentrada no progresso significativo da CoronaVac, fazendo a sua parte em uma missão extremamente importante para ajudar a combater a pandemia global. As alegações contra o presidente da Sinovac foram feitas mais de uma década atrás. Observamos que nem a empresa nem Yin jamais foram processados judicialmente por qualquer autoridade governamental em conexão com essas alegações”
Já o acordo com o Instituto Butantan, informa a nota, “prevê que os resultados clínicos devem ser confirmados por ambas as partes. O objetivo é que os resultados sejam precisos e nós estávamos totalmente conscientes de que os resultados seriam eventualmente levados a público pela Anvisa para registrar a vacina”.
A CoronaVac pode frear a pandemia no Brasil?
Este é o nosso objetivo. Encontramos no Instituto Butantan um parceiro com muitos anos de experiência na área de vacinas. Estou confiante em que podemos mudar a situação da pandemia no Brasil. Nosso objetivo é evitar que as pessoas, uma vez infectadas, necessitem de tratamento, de hospitalização, que corram risco de vida. Resolver esse problema significa reduzir o fardo para toda a sociedade. Nosso foco é nos “três nãos”: não à necessidade de tratamento médico, não à doença severa e não à morte. De acordo com a fase três dos testes clínicos, esse objetivo pode ser alcançado.
Como vê a diferença entre as medidas de controle na China e no Brasil, onde o presidente Jair Bolsonaro inicialmente se opôs à aquisição da CoronaVac?
A China adotou um sistema de isolamento obrigatório. Quando há uma infecção, o isolamento é feito de forma rápida e completa e temos kits de testes em quantidade suficiente para rapidamente rastrear os casos. Neste momento a China tem mais de 100 casos por dia, o que já é muito alto para nós. Mas não quero fazer julgamentos políticos ou de sociedades. Na China é muito fácil detectar a origem das infecções. No momento, a maioria é de casos importados. Na China há menos fontes de transmissão e facilidade de detecção e controle. O Brasil tem muitas fontes de transmissão, é muito difícil controlar. Sobre o presidente do Brasil e suas ações políticas, não estou muito a par, não posso comentar.
Quando será o próximo envio dos insumos para a produção da CoronaVac no Brasil?
A data exata não sei dizer, mas já fechamos o fornecimento de milhões de doses ao Butantan, mais até do que para o mercado chinês. Na China, fornecemos vacinas para mais de 20 províncias, cerca de 10 milhões de doses.Entendo a preocupação das pessoas. O mundo inteiro está ansioso para ter as vacinas, todos os governos estão na expectativa de tê-las. Há uma escassez planetária no suprimento de vacinas. Não é uma questão que afeta apenas a população brasileira. Nós faremos o máximo para implementar o fornecimento de acordo com o contrato. Construímos uma nova linha de produção para 500 milhões de doses. Isso significa que seremos capazes de dobrar a nossa produção, ou seja, um bilhão de doses por ano. Nossa cooperação com o Butantan é principalmente para fornecer o produto semipronto, e eles concluirão o processo. Assinamos um contrato comercial e vamos executá-lo. Acreditem no Butantan e na parceria com a Sinovac.
O resultado global de eficácia de 50,38% da CoronaVac foi recebido com algum ceticismo no Brasil. Qual a sua avaliação?
Está cientificamente provado pelos testes clínicos realizados no Brasil, na Turquia e na Indonésia que a vacina oferece proteção. Há um eixo vertical que mostra de alto a baixo os níveis de proteção capazes de prevenir hospitalizações, tratamento médico, sintomas leves e infecção. No alto do eixo temos os sintomas severos e as hospitalizações, para os quais a proteção é de 100%. Em seguida há a proteção para prevenir a necessidade de tratamento médico, que é de 78%. Nos sintomas leves e médios a proteção é mais baixa. A conclusão foi a de que o nível geral de proteção é de 50%.
E qual o motivo disso?
Os casos moderados perfazem 85%, e a maioria apareceu entre profissionais de saúde. Pense nisso: se uma pessoa é atacada pelo vírus uma vez, a proteção cai para 90%, se então é atacada três vezes cai para 70%, se atacada muitas vezes cai para 50%. Por ser um profissional de saúde, eu fui exposto a ambientes altamente infectados, o número de ataques é muito maior do que em outros grupos da sociedade. Por isso o índice geral de 50% de proteção. O Butantan realizou uma contribuição única para o mundo, pois outras pesquisas de vacinas não cobriram tantos profissionais de saúde. E não revelaram o nível de proteção para casos leves. Que outro laboratório, além do nosso, fez testes clínicos em três países tão diferentes? Tanto os ensaios realizados no Brasil, como na Turquia e na Indonésia, mostraram a eficácia da vacina. Isso não é algo em que você deve acreditar? Ou prefere acreditar no índice de 90% dos EUA? Qualquer pessoa racional entende.
Como então o senhor vê a comparação com os resultados das vacinas da Moderna e da Pfizer (95% de eficácia) e da Oxford (70%)?
Sou um cientista, não faço especulações sem pesquisas. Acredito nos resultados da nossa vacina, não farei comparações. Mas uma coisa posso dizer. O verdadeiro efeito de prevenção de epidemia é a eficácia da vacina multiplicada pelo índice de vacinação da região: esse é o índice real de prevenção. Por isso espero que cada vez mais pessoas sejam vacinadas no Brasil, só assim será possível tratar casos graves e seu país poderá voltar a ter uma vida normal. No futuro, o novo coronavírus poderá ser algo como o vírus da gripe.
Uma nova variante do coronavírus encontrada em Manaus aumentou a preocupação das autoridades de saúde mundo afora. A CoronaVac oferece proteção contra ela?
Essa é a nossa maior preocupação, mas neste momento estamos fazendo testes de larga escala em 18 diferentes localidades no Brasil e eles têm mostrado que a vacina oferece proteção contra esta variante em circulação no país. Também fizemos teses na China com uma variante europeia e comprovamos que a vacina também oferece proteção.
A Sinovac não divulgou os resultados consolidados de eficácia da CoronaVac. Qual a razão disso?
O Butantan irá nos transferir os resultados e eles serão submetidos à Administração Nacional de Produtos Médicos (ANPM) da China. Em breve entregaremos todos os dados de nossos parceiros (também Turquia e Indonésia) e aí iremos publicá-los.