Com o resultado, economia ainda se encontra no mesmo patamar de 2017, com uma queda acumulada de 5% de janeiro a setembro. Destaque de recuperação foi a indústria de transformação.
O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil cresceu 7,7% no 3º trimestre, na comparação com os três meses imediatamente anteriores, confirmando a saída do país da chamada “recessão técnica”, segundo dados divulgados nesta quinta-feira (3) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A expansão da economia foi recorde no terceiro trimestre, mas ainda insuficiente para recuperar as perdas vistas no ápice da pandemia de coronavírus no país. Em valores correntes, o PIB do terceiro trimestre totalizou R$ 1,891 trilhão.
“O Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 7,7% no terceiro trimestre, na comparação com o segundo trimestre, maior variação desde o início da série em 1996, mas ainda insuficiente para recuperar as perdas provocadas pela pandemia. Com o resultado, a economia do país se encontra no mesmo patamar de 2017, com uma perda acumulada de 5% de janeiro a setembro, em relação ao mesmo período de 2019”, informou o IBGE
Com o resultado, a economia reverteu parte das perdas com a pandemia, mas a alta foi insuficiente para compensar o colapso do PIB no 1º trimestre (-1,5%) e no 2º trimestre (-9,6%), que mergulhou o país em uma nova crise e provocou um desemprego recorde.
O crescimento de 7,7% no 3º trimestre foi o maior já registrado desde que o IBGE iniciou os cálculos do PIB trimestral, em 1996. Até então, a maior taxa tinha sido a do 3º trimestre de 1996 (4,3%).
O forte avanço entre os meses de julho e setembro está diretamente relacionado com a base mais fraca de comparação, devido ao tombo histórico registrado entre abril e junho, que foi revisado para uma queda de 9,6%, ante leitura inicial de retração de 9,7%.
As consequências da pandemia também ficam claras no comparativo anual. Em relação ao 3º trimestre de 2019, o PIB registrou uma queda de 3,9%, a terceira retração seguida nessa base de comparação.
Já no acumulado dos quatro trimestres terminados em setembro, houve queda de 3,4% frente aos quatro trimestres imediatamente anteriores.
O PIB é a soma de todos os bens e serviços produzidos no país e serve para medir a evolução da economia. Dois trimestres seguidos de queda do nível de atividade (registrados no 1º e 2º trimestres deste ano) representam uma recessão técnica, que foi superada de acordo com os números do IBGE.
Os números do PIB vieram mais fracos do que o esperado. A expectativa do mercado era de um crescimento de 8,8% em relação ao trimestre anterior, segundo a mediana das estimativas levantadas pelo Valor Econômico junto a consultorias e instituições financeiras.
Principais destaques do PIB no 3º trimestre
- Agropecuária: -0,5%
- Indústria: 14,8%
- Indústria extrativa: 2,5%
- Indústria de transformação: 23,7%
- Construção civil: 5,6%
- Serviços: 6,3%
- Comércio: 15,9%
- Consumo das famílias: 7,6%
- Consumo do governo: 3,5%
- Investimentos: 11%
- Exportação: -2,1%
- Importação: -9,6%
“Houve uma recuperação no terceiro contra o segundo trimestre, mas, se olharmos a taxa interanual, a queda é de 3,9% e no acumulado do ano ainda estamos caindo, tanto a indústria quanto os serviços. A agropecuária é a única que está crescendo no ano, muito puxada pela soja, que é a nossa maior lavoura”, destacou a coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, Rebeca Palis.
No acumulado do ano até o 3º trimestre, o PIB caiu 5% em relação a igual período do ano passado. Nesta comparação, a agropecuária cresceu 2,4%, enquanto a indústria (-5,1%) e os serviços (-5,3%) ainda têm queda.
Indústria e comércio são destaques; agricultura cai
A indústria foi o grande destaque do 3º trimestre. Após o tombo de 13% no 2º trimestre, o setor cresceu 14,8% entre julho e setembro, a maior taxa da série histórica do IBGE.
Já a indústria de transformação avançou 23,7%, vinda de uma queda de 19,1% entre julho e setembro, e conseguiu voltar ao patamar do primeiro trimestre.
O comércio também mostrou uma recuperação forte ao crescer 15,9%, revertendo a queda de 13,7% no trimestre anterior.
Já o setor de serviços, que possui o maior peso na economia, é o que mostrou a recuperação mais lenta, com, alta de 6,3% após tombo de 9,4% no segundo trimestre.
“Mesmo tendo sido retiradas as restrições de funcionamento, as pessoas ainda ficam receosas para consumir, principalmente os serviços prestados às famílias, como alojamento, alimentação, cinemas, academias e salões de beleza”, destacou Rebeca.
A agricultura foi o único setor, pelo lado da oferta, a apresentar queda, de 0,5%, em relação aos três meses anteriores. Segundo o IBGE, a queda foi resultado de um ajuste de safra, mas o setor ainda registra crescimento no acumulado do ano.
“A agropecuária é um caso à parte. Ela continua crescendo na taxa interanual. Na comparação com o primeiro trimestre desse ano, ela teve queda por causa da sazonalidade da safra de produtos, sobretudo da soja”, disse Rebeca.
Recuperação incompleta
A forte reação do PIB no 3º trimestre foi sustentada principalmente pelos expressivos gastos do governo com auxílios e medidas de transferência de renda. A recuperação, no entanto, foi marcada pela heterogeneidade, com diversos segmentos ainda enfrentando dificuldades para voltar à normalidade, sobretudo atividades do setor de serviços.
O resultado é similar ao verificado em outros países que também tiveram suas economias fortemente afetadas pela pandemia. Nos países que integram a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a alta foi de 9% no 3º trimestre.
Embora o ministro da Economia, Paulo Guedes, venha reafirmando que os indicadores apontam para uma retomada do crescimento em “V” – uma forte queda seguida de recuperação igualmente acentuada – a economia ainda está longe de estar ‘curada’ e a perspectiva é de perda de ritmo a partir do 4º trimestre, com a redução e término das medidas de estímulo.
“O pico da economia, o ponto mais alto do PIB, foi registrado em 2014. Agora, nós estamos 7,3% abaixo dele”, afirmou a coordenadora da pesquisa, explicando que no 2º trimestre o PIB ficou 14% abaixo desse pico. “Em relação ao 4º trimestre do ano passado, a gente está 4,1% abaixo”.
A pesquisadora lembrou que a economia brasileira foi atingida pelo choque trazido pela pandemia num momento em que ainda se recuperava das perdas com a recessão de 2015 e 2016.
“O PIB cresceu até 2014, caiu em 2015 e 2016 e começou a se recuperar em 2017. No final de 2019, a gente já estava num patamar equivalente ao de 2012. Com a pandemia, a gente voltou para 2009 e agora a gente já andou mais um pouco e foi para o final de 2010, que é equivalente ao que a gente observava em 2017”, disse.
Consumo das famílias cresce abaixo do patamar do PIB
Pela ótica da despesa, o consumo das famílias – principal motor da economia há anos e com peso de 65% no PIB – teve expansão de 7,6%, num patamar ligeiramente abaixo do resultado do PIB, eliminando apenas parte do tombo de 11,3% no segundo trimestre. Ou seja, as famílias não voltaram a consumir no patamar anterior à pandemia.
A crise no mercado de trabalho é um dos principais limitadores da retomada do consumo pelas famílias, segundo Rebeca. Ela ponderou, no entanto, que houve compensação dela com o auxílio emergencial oferecido pelo governo.
“A gente não tem como fazer o cálculo separado do impacto desse auxílio mas, claramente, dá para ver que ele contribuiu [com o consumo] ao observarmos, por exemplo, o crescimento do comércio”, disse.
Investimentos em queda
Os investimentos (Formação Bruta de Capital Fixo) cresceram 11%, após queda de 16,5% no trimestre anterior. No acumulado do ano, a queda é de 5,5%. A taxa de investimento em percentual do PIB foi de 16,2% do PIB contra 16,3% no mesmo período do ano anterior. Em 2013, chegou a superar 21%.
“Os investimentos caíram, todos os componentes dele, tanto a parte da construção, puxada pela infraestrutura, como produção e importação de bens de capital”, afirmou Rebeca Palis.
Em relação ao setor externo, as exportações de bens e serviços tiveram queda de 2,1%, enquanto as importações caíram 9,6% em relação ao segundo trimestre, em resultados também influenciados pelo câmbio.
Maior taxa de poupança desde 2014
Já a taxa de poupança foi de 17,3% no terceiro trimestre de 2020, maior que os 13,7% obtidos no mesmo período de 2019 e a maior taxa já registrada desde o 1º trimestre de 2014, quando também foi de 17,3%, o que pode ajudar na manutenção do padrão de consumo das famílias.
IBGE revisa PIB de 2019 para alta maior, de 1,4%
O IBGE revisou também o resultado do crescimento do PIB de 2019, de 1,1% para 1,4%. O instituto realiza sempre uma revisão mais abrangente da série histórica na divulgação do terceiro trimestre de cada ano.
Perspectivas
O mercado financeiro passou a projetar uma retração de 4,50% para o PIB do Brasil neste ano. Mesmo com uma retração menor do que a inicialmente imaginada, o resultado de 2020 deverá ser o pior já registrado no país. Pela série histórica do IBGE, iniciada em 1948, as maiores quedas até aqui foram as de 1981 e 1990, quando houve uma retração de 4,3% em ambos os anos.
Para 2021, a previsão atual é de um crescimento 3,45% do PIB. De acordo com os analistas, mantido o atual cenário, o Brasil só deverá retomar o patamar pré-pandemia a partir de 2022.
A OCDE estima um crescimento menor da economia brasileira em 2021, de 2,6%, abaixo da projeção para a média global, de 4,2%. O Fundo Monetário Internacional (FMI), por sua vez, projeta um alta de 2,8%, mas alertou esta semana que uma “recuperação robusta e inclusiva” depende do avanço de reformas estruturais” e da sustentabilidade da dívida pública.
Fonte: G1