Senadores resistem ao texto aprovado na Câmara. Relator fará alterações para tentar reverter placar. Proposta precisa de 14 votos favoráveis
Prevista para ser votada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal na próxima quarta-feira (24/11), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios deverá sofrer alterações no texto para reduzir a rejeição de senadores e, assim, conseguir a aprovação no colegiado. Caso passe na comissão, a proposta deve ir ao plenário da Casa na semana seguinte.
Dos 27 senadores titulares, 10 manifestaram à reportagem, ou publicamente, apoio contrário à redação aprovada pelos deputados, enquanto apenas quatro se declararam favoráveis ao texto vindo da Câmara. Seis parlamentares disseram estar indecisos e ainda aguardam reuniões com lideranças e com as respectivas bancadas para que a posição sobre a proposta fique alinhada. Sete não responderam.
Entre os 26 suplentes, que só votam na ausência dos titulares, cinco anunciaram voto contrário à PEC e dois disseram ser a favor.
Para o relatório da PEC dos Precatórios ser aprovado na CCJ do Senado, é necessário apoio da maioria absoluta, ou seja, 14 votos – hoje, há apenas quatro votos favoráveis declarados.
Diante do ainda tímido apoio ao texto aprovado pelos deputados, o governo federal, maior interessado na sanção da PEC, admite promover alterações na redação, a fim de viabilizar sua aprovação no colegiado. Na última semana, o relator da proposta na Casa e líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), esteve reunido com membros da CCJ para discutir soluções alternativas e sinalizou que haveria mudanças.
“Gostaria de adiantar que surgiram ideias que o governo vai analisar. O governo trouxe algumas informações, que irão merecer uma análise por parte dos senadores no sentido de nos aproximarmos”, resumiu Bezerra, sustentando que “existe disposição dos dois lados para garantir um grande entendimento em relação à proposta”.
Segundo o governista, um dos pontos conflitantes entre o Executivo federal e parte dos senadores é justamente o risco direto que a proposta causa ao teto de gastos do Orçamento 2022. A PEC dos Precatórios é tida pelo governo federal como “plano A” a fim de viabilizar o espaço fiscal necessário para financiamento do novo programa social em substituição ao Bolsa Família, o Auxílio Brasil, que pretende pagar um tíquete médio de R$ 400 aos beneficiários.
Para conseguir a aprovação da matéria na Casa, Bezerra terá de agradar, também, o líder de sua bancada, o senador Eduardo Braga (AM), que é contra o atual texto da PEC. Braga, que é membro da CCJ, defende que devem haver mudanças na proposta, como a redução do espaço fiscal de R$ 91 bilhões.
Aliás, não é apenas o MDB, que tem a maior bancada do Senado, com 15 parlamentares, que o relator precisa convencer. O PSD, com o segundo maior grupo, são 12, também exigirá esforço. Os senadores do partido vão se reunir na próxima terça-feira (23/11) para fazer “uma análise minuciosa do texto”. A terceira maior bancada, o Podemos, com nove senadores, também é contra o texto da Câmara, além da oposição, que soma mais 14 votos contrários.
Eventuais mudanças no texto seriam uma forma de reduzir a rejeição à proposta do governo no Senado. Alterações profundas na redação, entretanto, obrigariam um retorno da PEC ao plenário da Câmara dos Deputados, atrasando assim o desfecho e, consequentemente, a disponibilização dos recursos para bancar a proposta de R$ 400 do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) aos beneficiários do Auxílio Brasil. Porém um eventual adiamento ainda seria melhor para a administração federal do que a possibilidade de rejeição da proposta no Senado.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já admite mudanças, mas espera que “96%” do texto aprovado na Casa seja mantido. “Nós estamos com a PEC dos Precatórios no Senado, que pode sofrer alguma modificação. Nós esperamos que não haja grandes modificações, tendo em vista o pouco tempo para implementação do programa [o Auxílio Brasil]. Mas, lógico, nós respeitamos todas as decisões que venham do Senado. No entanto espero que 95%, 96% do texto tenha a sua aprovação”, disse.
PEC alternativa
Em meio à resistência, os senadores Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e José Aníbal (PSDB-SP) apresentaram um texto alternativo à PEC dos Precatórios, com a ideia de tirar o pagamento das dívidas judiciais do teto de gastos e extinguir as emendas de relator, no chamado orçamento secreto. A proposta tem o apoio da bancada do Podemos.
“Com isso, abrimos ao governo no ano de 2022 um crédito fora do teto de R$ 90 bilhões. Isso é mais do que suficiente para fazer o Auxílio Brasil, para pagar R$ 400 a milhões de brasileiros, e ainda sobra dinheiro para o governo corrigir déficit no seu orçamento”, disse Oriovisto Guimarães. “Feito isso, nós também terminamos de uma vez por todas com a emenda do relator. Essas emendas ficam extintas. Isso faz sobrar mais dinheiro para o governo. Nós não quebramos o teto de gastos e não daremos calote”, acrescentou.
A proposta de tirar o pagamento dos precatórios do teto de gastos já havia sido apresentada pelo vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), mas não prosperou na Casa. Contudo, caso esse texto alternativo avance no Senado, a PEC volta para análise na Câmara.
Auxílio Brasil
Principal argumento do governo para pressionar o Congresso Nacional pela aprovação da PEC dos Precatórios, a criação do Auxílio Brasil tem cenário oposto ao da proposta na CCJ.
Dos 27 senadores titulares da comissão, 15 são a favor do programa social, enquanto quatro defendem a manutenção do Bolsa Família, com o devido reajuste dos valores. Oito titulares não responderam. Entre 26 suplentes, sete se manifestaram favoravelmente ao benefício e 19 não responderam.
O senador Paulo Paim (PT-RS) defende, porém, ser preciso dissociar o novo programa social da PEC dos Precatórios. “O governo vem justificando a necessidade de aprovação como forma de pagar o Auxílio Brasil. O fato é que o próprio governo optou por extinguir o Bolsa Família, um programa que recém completou 18 anos de existência e tem um histórico positivo no atendimento da população mais vulnerável”, disse.
“Os recursos para o pagamento do Bolsa Família já constavam no orçamento, no montante de R$ 35 bilhões, e foram transferidos para o novo auxílio. O governo busca com essa PEC conseguir recursos para pagar um auxílio que só vale até dezembro de 2022. Isso precisa ser esclarecido à população”, prosseguiu.
O PT, inclusive, estuda apresentar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) ao Supremo Tribunal Federal (STF) para manter o Bolsa Família, programa que foi criado em 2004 pelo governo Lula e se tornou uma das bandeiras do partido.
O senador Jorge Kajuru (Podemos-GO) corrobora com a avaliação de Paim. “Uma coisa é o auxílio aos mais pobres, outra coisa é a corrupção do orçamento”, enfatizou.