Partido prevê dificuldades para atingir desempenho eleitoral necessário para manter atividade parlamentar, e agora debate futuro da legenda
Empenhado em compor uma federação de partidos de viés de esquerda na Câmara e para as próximas eleições, o PCdoB busca maneiras de driblar a cláusula de barreira – mecanismo eleitoral que impede o funcionamento parlamentar à legenda que não alcançar determinado percentual de votos – e assegurar sua atuação no Congresso sem que seja obrigado a perder autonomia.
Caso não consiga articular a federação, que garantiria a independência desejada, e seja obrigado a partir para medidas mais drásticas para se manter vivo, o partido não descarta a possibilidade de uma união com o PSB. Segundo dirigentes do PCdoB, a fusão é uma possibilidade que vem sendo estudada, mas ainda não há uma posição fechada sobre a questão, que deve ser discutida de fato mais adiante.
Secretário de Organização do PCdoB no DF e membro do comitê central do partido, Roberto Bittencourt explica que há um plano A e um plano B para garantir a manutenção do PCdoB e de seus quadros.
“Nós não vamos deixar o partido ir para a segunda divisão, quer dizer, nós não vamos deixar o partido ser rebaixado e ser impedido de atuar no Congresso Nacional e na frente eleitoral. Estamos determinados firmemente a não deixar isso acontecer.”
Federação de partidos
O plano A consiste na federação de partidos, que funcionaria tanto na atividade política parlamentar quanto na eleitoral. De acordo com esse mecanismo, os partidos que não atingirem a cláusula de desempenho poderão formar federações para ter direito ao funcionamento parlamentar, atuando com uma única identidade política.
Assim, os partidos se uniriam sem abrir mão de sua autonomia, mas atuariam em uma espécie de coligação mais estável.
Uma proposta de emenda à Constituição (PEC 282/2016) sobre o tema foi aprovada no Senado em 2015, mas está parada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. O PCdoB espera que a proposta seja aprovada ainda no primeiro semestre deste ano. Para valerem no pleito do ano que vem, eventuais alterações devem ser aprovadas até outubro deste ano, em razão do princípio da anualidade eleitoral.
O deputado Júlio Delgado (MG), vice-presidente de relações interpartidárias do PSB, não vê chances de essa proposta da federação prosperar. “Eu acho, pelo prazo que estou vendo da reforma política, que é uma questão difícil de andar, mas a gente tem que respeitar o prazo deles.”
O plano B é a possibilidade de fusão com o PSB. O vice-presidente nacional do PCdoB, Walter Sorrentino, sinaliza, porém, a dificuldade de concretizar essa opção: “O PCdoB tem firme unidade na decisão de preservar sua autonomia como partido centenário. Lutamos por Federação ou outras formas de frente eleitoral, como construção política e legislativa de caráter democrático. O Brasil precisa disso, assim como a democracia sempre precisou de nós”, disse ele.
Além dessa resistência interna em abrir mão do nome do PCdoB, o PSB ainda não admite oficialmente a fusão. Segundo Carlos Siqueira, presidente nacional do partido, não há discussão sobre a fusão das duas siglas.
“Até este momento não há essa discussão. O PCdoB jamais tratou desse assunto com aceitação do PSB”, afirmou Siqueira
Caso o PCdoB decida partir para tentar caminhar junto com o PSB, há duas hipóteses: fusão ou incorporação. Na fusão, os dois partidos se juntam para elaborar um novo estatuto. Seria como criar uma nova legenda. Na incorporação, uma das legendas decide se adota trechos do programa da sigla incorporada.
A questão do nome da sigla decorrente dessa fusão ou incorporação é também tema de disputa. O PSB não admite a possibilidade de mudança no nome.
Ambos os casos requerem uma modulação entre as siglas. No Rio Grande do Sul, por exemplo, o PSB é considerado hoje como mais à direita, chegando a ser próximo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Já o PCdoB sempre foi tido como braço auxiliar do PT, com quem sempre se coligou. Em 2018, a vice da chapa à Presidência da República encabeçada por Fernando Haddad foi a comunista Manuela D’Ávila.
Atualmente, o PCdoB tem 7 deputados federais e nenhum senador. Já o PSB conta com uma bancada maior, de 30 deputados e uma senadora — Leila Barros (DF)
Cláusula de barreira
Aprovada em 2016, a regra impõe que os partidos com menos de 2% dos votos nacionais na próxima eleição não tenham direito à representação partidária, não possam indicar titulares para as comissões, além de perder recursos do fundo partidário e tempo de propaganda eleitoral. O PCdoB não atingiu a barreira em 2018.
No segundo semestre deste ano, o PCdoB vai realizar seu 15º Congresso, ocasião em que deve discutir mais a fundo a cláusula de barreira, classificada pelos dirigentes do partido como “antidemocrática”. Ainda não há data definida para o encontro.
“Este Congresso irá entrelaçar a jornada para derrotar Bolsonaro e salvar o país, com o grande desafio de garantir a presença do PCdoB no parlamento. Isto requer que a legenda quase centenária supere, nas eleições de 2022, a antidemocrática cláusula de barreira que exige obtenção de no mínimo 2% dos votos válidos à Câmara dos Deputados ou a eleição de uma bancada de pelo menos 11 parlamentares federais, eleitos em nove ou mais estados”, ressalta.
“Esgotado esse esforço, o PCdoB irá procurar alternativas de frentes políticas nas quais possa assegurar sua presença na vida parlamentar do país e preserve a sua continuidade histórica, identidade e autonomia”.
Após atuar na clandestinidade durante a ditadura militar, dirigentes do PCdoB entendem que há uma campanha para empurrar o partido de volta à clandestinidade. “O PCdoB faz bem para a democracia no Brasil”, entendeu Roberto Bittencourt.
Migração de lideranças
Há ainda boatos da filiação ao PSB de quadros importantes do PCdoB, como o governador do Maranhão, Flávio Dino, o deputado federal Orlando Silva (SP) e a ex-deputada Manuela D’Ávila (RS).
A ida desses nomes para a sigla, além de fornecer aos políticos maior estrutura partidária em disputas a cargos majoritários, sinalizaria uma aproximação com a legenda. Segundo o deputado Júlio Delgado, a ida de Dino para o partido é esperada para junho. Os demais nomes podem migrar até agosto ou no mais tardar setembro deste ano.
“Eu vejo com muito bons olhos. Alguns estão mais avançados que outros. O Dino já avisou lá [no PCdoB] que vem. A gente tem que respeitar o processo de cada um”, diz Delgado.
Procurados pela reportagem, Dino, Manuela e Silva não responderam aos pedidos de comentário.
Afastamento do comunismo
Em janeiro deste ano, o PCdoB lançou sua nova marca, com o objetivo de atrair forças do chamado centro político.
O emblema não conta com símbolos tradicionais do partido quase centenário, como a “foice e o martelo”, referências históricas do comunismo, e apresenta predominantemente as cores verde e amarela. O vermelho, cor do partido, ficou restrito ao número da legenda, que tenta fortalecer o nome do governador do Maranhão, Flávio Dino.
O objetivo da marca, segundo os organizadores do movimento, é ser mais palatável à população em tempos de aversão ao “comunismo” pregado pelos partidos no poder. A ideia da frente é reunir “todos contra Bolsonaro”.
A ideia tem semelhança com a concertação feita pelo Partido Comunista Português (PCP) que ampliou seu leque de atuação, agregando o Partido Ecologista – “Os Verdes” – e formando a Coligação Democrática Unitária (CDU), em 1987.
Em entrevista ao Metrópoles em dezembro de 2020, Dino falou sobre a tendência de retirada do termo “comunista”, reconhecidamente alvo de preconceito.
“A discussão sobre uma mudança de nome já se colocou em vários momento não só no Brasil. Se tem um grande exemplo, é o PCI, Partido Comunista da Itália, que mudou de nome há 20 anos. O próprio PCB virou PPS, e hoje é Cidadania”, citou. “Independentemente do nome A, B, C ou D, o destino partidário não só do PCdoB está em debate”, explicou.