Miguel Lucena
A liberdade de expressão é um dos pilares fundamentais do Estado Democrático de Direito, sendo amplamente protegida pela Constituição Federal brasileira de 1988 (CF/88). O artigo 5º, inciso IV, assegura que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, e o inciso IX dispõe que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Contudo, essa liberdade não é absoluta, encontrando limites que decorrem tanto do próprio texto constitucional quanto da legislação infraconstitucional, da doutrina e da jurisprudência.
A CF/88 estabelece balizas à liberdade de expressão com o objetivo de preservar outros direitos igualmente protegidos, como:
Dignidade da pessoa humana (art. 1º, III): A liberdade de expressão não pode ser usada para ofender a honra, a imagem ou os direitos fundamentais de terceiros.
Proibição do anonimato (art. 5º, IV): Para assegurar a responsabilização, a Constituição veda manifestações anônimas.
Direitos à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem (art. 5º, X): Esses direitos impõem limites ao discurso ofensivo ou invasivo.
Vedação à censura prévia (art. 220, §2º): Apesar de vedada a censura, a responsabilidade pelos abusos é prevista no ordenamento.
A legislação infraconstitucional também regula a liberdade de expressão, destacando-se:
Código Penal: Tipifica crimes contra a honra, como calúnia, difamação e injúria (arts. 138-140).
Lei nº 7.716/1989: Reprime crimes resultantes de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
Lei nº 12.965/2014 (Marco Civil da Internet): Prevê a proteção de dados pessoais e estabelece diretrizes para o uso responsável da internet.
Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD): Protege dados sensíveis e estabelece regras para a divulgação de informações pessoais.
O Supremo Tribunal Federal (STF) desempenha papel crucial na interpretação dos limites da liberdade de expressão. Entre os precedentes mais relevantes, destacam-se:
HC 82.424/RS (Caso Ellwanger): O STF reafirmou que a liberdade de expressão não pode ser usada para disseminar discurso de ódio ou incitar práticas racistas, que são crimes imprescritíveis e inafiançáveis.
ADPF 130/DF: O Tribunal declarou inconstitucional a Lei de Imprensa (Lei nº 5.250/1967), reforçando que a liberdade de imprensa é essencial para a democracia, mas sujeita a sanções em casos de abusos.
RE 1.120.147/SP: Decidiu que o direito à liberdade de expressão deve ser ponderado em casos de conflito com a dignidade da pessoa humana e outros direitos fundamentais.
Os principais doutrinadores ressaltam que a liberdade de expressão é um direito complexo e relacional, que deve ser interpretado à luz do princípio da proporcionalidade.
O constitucionalista e jusfilósofo alemão Robert Alexy defende que o conflito entre direitos fundamentais exige uma ponderação que maximize o exercício simultâneo dos direitos em conflito.
O mestre português J.J. Canotilho enxerga a liberdade de expressão como indispensável à democracia, mas reconhece que ela pode ser restringida quando invade a esfera de proteção de outros direitos.
Embora a liberdade de expressão seja essencial para a manutenção de uma sociedade plural e democrática, ela encontra limites no ordenamento jurídico brasileiro. Esses limites visam equilibrar os direitos em conflito, protegendo valores como a dignidade, a honra e a segurança coletiva. Assim, é necessário interpretar a liberdade de expressão de forma responsável, assegurando o convívio harmônico entre os direitos fundamentais e o respeito à democracia.