Nesta quarta, Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou quatro propostas que limitam o poder da Suprema Corte e até permitem que o parlamento revise decisões dos ministros.
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O capítulo mais recente da ofensiva do Congresso sobre o Supremo Tribunal Federal ocorreu nesta quarta-feira (9), quando a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou quatro propostas que limitam o poder da Suprema Corte e até permitem que o parlamento revise decisões dos ministros.
As ações do Congresso para alterar o poder do STF, no entanto, se intensificaram meses atrás, quando o tribunal pôs em julgamento processos sobre porte de maconha para consumo pessoal e sobre aumentar as hipóteses legais para aborto no Brasil.
O Congresso alega que esses temas devem ser disciplinados em leis a serem aprovadas pelos parlamentares, a quem cabe legislar.
Mas o Supremo diz que, como o Congresso demora a legislar sobre esses temas, e a vida real da sociedade demanda definições mais claras sobre eles, é preciso que o Judiciário estabeleça os limites do que é legal ou não.
Houve outros estopins para essa reação do Congresso:
- o julgamento do STF que suspendeu o pagamento de Emendas Pix — um tipo de emenda parlamentar considerado obscuro pelos ministros, em razão da falta de critérios definidos sobre quem vai receber o pagamento e da dificuldade de rastear o emprego da verba.
- operações da Polícia Federal em investigações autorizadas pelo STF contra parlamentares
Relembre abaixo como o cenário de atrito entre STF e Congresso foi se desenhando:
As medidas aprovadas pela CCJ
Em primeiro lugar, é importante entender as medidas aprovadas pela CCJ:
⚖️ PEC 8/2021– limita decisões monocráticas de ministros do STF. O texto proíbe decisões individuais que suspendam a eficácia de leis ou suspendam atos do presidente da República ou dos presidentes da Câmara, do Senado e do Congresso. Hoje, não há vedação.
⚖️ PEC 28/2024 -permite que o Congresso Nacional suspenda decisões do STF, caso considere que as medidas avançaram a “função jurisdicional” da Corte ou inovaram no ordenamento jurídico. O texto estabelece que a derrubada de uma decisão precisará ser aprovada com os votos de dois terços dos membros da Câmara (342) e do Senado (54) — quórum necessário para aprovação de um processo de impeachment.
⚖️ PL 4754/2016 – cria cinco novas hipóteses de crime de responsabilidade para ministros do STF, aumentando as possibilidades de justificar um pedido de impeachment de magistrados da Corte.
⚖️PL 658/2022 – cria a possibilidade de se apresentar um recurso ao plenário do Senado caso o presidente da Casa rejeite um pedido de impeachment contra ministro do STF. Hoje, não cabe recurso da decisão. O recurso deverá ser apresentado por um terço dos membros do Senado. Se não for analisado em 30 dias, trancará a pauta da Casa até que seja votado.
As duas PECs ainda deverão passar por uma comissão especial antes de seguirem ao plenário. Os projetos de lei já estão prontos para o plenário. Cabe ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), determinar a criação das comissões especiais e pautar os projetos.
Porte de maconha
Em junho, o STF decidiu que não é crime portar maconha para uso pessoal e que a lei deve distinguir usuário de traficante.
Assim que o tribunal passou a julgar esse tema, o Congresso se movimentou para aprovar um projeto que vai no sentido contrário: ou seja, que estabelece que é crime, sim, portar maconha, mesmo que seja para uso pessoal.
Esse texto ainda está tramitando no Congresso. Caso seja aprovado, vai gerar um choque com a decisão do Supremo, e o caso deverá ser judicializado.
O projeto que contraria o STF teve aval do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
“Eu discordo da decisão do Supremo Tribunal Federal [sobre descriminalização]. Eu considero que uma descriminalização só pode se dar através do processo legislativo e não por uma decisão judicial. Há um caminho próprio para se percorrer nessa discussão, que é o processo legislativo”, disse Pacheco na ocasião.
Operações contra parlamentares
Em janeiro deste ano, oposição na Câmara no Senado prometia tumultuar os trabalhos e agir com “descompromisso institucional” caso Lira e Pacheco não respondessem “à altura” ao que consideravam um ingerência do Supremo Tribunal Federal (STF) no Poder Legislativo.
Naquela ocasião, os deputados Carlos Jordy (PL-RJ) e Alexandre Ramagem (PL-RJ) haviam sido alvos de operações . Os agentes conduziram buscas e apreensões nos gabinetes de ambos os parlamentares, o que causou incômodo na Câmara.
Emendas Pix
As emendas Pix vinham sendo uma poderosa arma do Congresso e uma substituição para o orçamento secreto, que tinha regras ainda mais obscuras e foi extinto pelo STF.
As emendas têm esse nome porque vão direto para o caixa de prefeituras ou governos estaduais, diferente de outros tipos de emendas. Com isso, deputados e senadores conseguiam, de forma mais intensa, turbinar caixas de aliados nos estados, ainda mais em um ano de eleições municipais.
Em agosto, o plenário do STF, por unanimidade, referendou a decisão do ministro Flávio Dino que determinou que a execução das emendas Pix precisa cumprir os critérios de publicidade, transparência e rastreabilidade e interrompeu os repasses das emendas impositivas.
Ficam de fora das determinações apenas obras em andamento e casos de calamidade pública.
As emendas estão suspensas desde então. Congresso e governo buscam chegar a um consenso sobre as regras para os pagamentos.