Maria José Rocha Lima[1]
Beirando o dia da avó fui honrada com uma visita pra lá de especial: Luiza Aragão. Chegou acompanhada do seu pai, Rui Aragão, que saiu de férias na Bahia e veio matar a saudade d’agente e de Brasília.
Quando nasceu, Luiza saiu do hospital para a nossa casa e durante os três primeiros anos de vida conviveu com a gente e é afilhada de Lucas, nosso filho. A sua devotada mãe, Gabriela, não pôde acompanhá-los, porque andando de patins para ensiná-la caiu e quebrou o cóccix, ficando imobilizada, contou a menina. A amiga psicanalista Elena Rodrigues, que nos visitava, ficou perplexa com tamanha precisão do relato. Luiza se comunica com muita clareza, uma impensável riqueza de detalhes e pensamento absolutamente organizado. Dizer que Luiza sabe ler e escrever fluentemente, desde os quatro anos, é muito pouco… Ela completou, recentemente, cinco anos e sabe ler e escrever fluentemente; soma e subtrai; conhece as formas geométricas e pratica exercícios sofisticados de geometria, como ninguém.
Ao chegar em nossa casa, logo após os cumprimentos, muito ternos, foi me perguntando pelo Gatinho Perdido, um livro de história infantil que eu li para ela, há mais de dois anos, e que a mocinha nunca esquecera.
– Vamos, vovó, procurar o Gatinho Perdido.
Ela partiu para a busca na biblioteca, verificando sempre os livrinhos finos e amarelinhos. Quando eu mexia em livros de cor ou calibre incompatíveis, ela me advertia:
-Esse não, vovó. Ele é fininho e amarelinho.
Olha, são mais de dois anos que não nos vínhamos e nem folheávamos o livro do Gatinho Perdido . Como as minhas estantes andam desorganizadas, depois de dois dias de procura, não encontramos o Gatinho Perdido e Luiza concluiu:
Vovó, esse Gatinho Perdido gosta mesmo de viver sozinho. Ele ainda não sabe o que é viver em família, prefere viver só.
Nesses tempos de tantos ataques às famílias, Luiza, cinco anos, conseguiu captar com clareza a mensagem de que é bom viver com os outros, que sem os pais devotados e sem a família os gatinhos e gatinhas ficarão perdidos.
[1] Maria José Rocha Lima é mestre em educação pela Universidade Federal da Bahia-UFBA- e doutora em psicanálise. É presidente da Casa da Educação Anísio Teixeira. Diretora administrativa da Associação Brasileira de Estudos e Pesquisas em Psicanálise-ABEPP-. É Coordenadora de Programas da Soroptimist International SI Brasília Sudoeste.