Maria José Rocha Lima*
Na Paróquia e Santuário Santo Antônio, em Brasília, na missa celebrada à Santa Dulce dos Pobres, assistimos a um vídeo com uma história da ossa santinha que mais parece o mito fundador de toda a sua obra.
O biógrafo da santa, Graciliano Rocha, contou que certo dia Irmã Dulce, nas suas rotineiras visitas às favelas de Salvador, recolheu das ruas, sob marquises, homens, mulheres e crianças, muitos desses doentes. E, não tendo onde acomodar e tratar os desamparados, resolveu ocupar os Arcos da Igreja do Bonfim, que davam para a chamada Baixa do Bonfim.
Quando o Pároco da igreja deparou com a ocupação realizada, não contou conversa e exigiu dela a desocupação imediata dos arcos, espécie de subsolo, alegando a feiúra que a ocupação provocava e o prejuízo que essa causava ao turismo, no Bairro do Bonfim, sede da secular Igreja do Glorioso Senhor do Bonfim.
Embora Irmã Dulce argumentasse que precisava oferecer saúde aos mais pobres, o pároco não se convenceu e todos foram despejados da Colina Sagrada. Então, ela teve a ideia de levá-los para o galinheiro do convento, lugar tão improvável para colocar pessoas, principalmente as doentes, que a freira teve a certeza que, ali, todos estariam a salvo de despejo, protegidos das intempéries e ninguém reivindicaria um galinheiro para se alojar.
A freirinha enganou-se, pois a madre superiora a chamou para explicar o que era aquilo, como ela ia colocar pessoas, especialmente as doentes, num galinheiro.
Irmã Dulce explicou que eles não tinham aonde ir e, pior, os doentes não tinham acesso a nenhum hospital público, que à época só tratava quem tivesse Carteira de Trabalho. Argumentava que o convento não podia fechar as portas para ninguém. Não convencida, a superiora perguntou:
– E as minhas galinhas?
Irmã Dulce respondeu-lhe:
-Está na barriga dos pobres.
Nada conseguiu impedir a indomável freirinha. E o hospital, como toda realização de Irmã Dulce, nasceu de improviso num galinheiro, nasceu da providência de Deus, com um empurrãozinho de Santo Antônio.
Seria o galinheiro para os baianos pobrezinhos o equivalente à manjedoura de Jerusalém?
Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em educação. Foi deputada de 1991 a 1999. Fundadora da Casa da Educação Anísio Teixeira. Psicanalista filiada a Associação de Estudos e Pesquisas em Psicanálise –ABEPP.