*Nelson Valente
Estamos vivendo tempos sombrios em matéria de qualidade do ensino, em nosso país, especialmente se considerarmos a educação pública. Os resultados são catastróficos. Houve queda no desempenho em matemática. Na redação foi pior ainda. Vamos caminhando para o fundo do poço. Ou seja, são estudantes que concluíram o ensino médio, sabe-se lá Deus como, mas padecem dos males do analfabetismo funcional. São incapazes de raciocínios elementares. O que se pode esperar dessa geração?
A conclusão é óbvia: sem leitura, como escrever adequadamente?
No ensino público: faltam 400 mil professores no ensino básico (fundamental e médio) no País. A maior carência é para as disciplinas de matemática, química, física e biologia. Há escolas que nem as têm na grade.
O curioso é que pouco se fala na formação e no aperfeiçoamento dos professores, em todo esse processo. Temos quase 3 milhões deles, no Brasil inteiro, mas é sabido que a qualidade do que se ministra nos cursos de magistério deixa muita a desejar. Temos que melhorar os cursos de preparação dos professores, na dupla condição de conteúdos mais adequados e uma presente interatividade, palavra que pode enriquecer, e muito, o que se passa hoje em sala de aula. Para acabar com essa vergonha, só uma ampla reforma.
Como se vê, há problemas em todas as frentes. A educação básica cresceu em números, é certo, mas não corresponde às expectativas no que tange qualidade. Enquanto se discute o sexo dos anjos, os resultados concretos estão aí, diante de todos, mostrando que há um longo caminho a ser percorrido.
A proposta do MEC de integração das disciplinas do ensino médio sinaliza uma manobra em uma tentativa de “resolver a falta de profissionais” no País. É uma medida “precipitada” e sugere a criação de um debate na sociedade a fim de aperfeiçoar o projeto e apresentar solução para os problemas crônicos do ensino médio nacional. O que se teme é que o ensino médio fique mais genérico e prejudique os alunos, principalmente os menos favorecidos que não podem estudar em escolas privadas.
A reforma do ensino médio é “temerário” mudar primeiro o currículo para ajustá-lo depois.
É necessária cautela na unificação das 13 disciplinas do ensino médio público nacional em quatro grandes áreas do conhecimento – anunciada recentemente pelo Ministério da Educação (MEC).
Os países desenvolvidos, como a Inglaterra, experimentaram unificar as disciplinas do ensino médio sem sucesso. A sorte é que eles têm mecanismos rápidos para reverter uma decisão dessa magnitude.
A impressão que se tem é a de que, para evitar o problema de evasão escolar, querem baixar medidas sem enfrentar as causas mais profundas do ensino médio.
Livros didáticos articulados – Além de considerar precipitada a unificação das disciplinas do ensino médio, considero também prematuras as metas do Plano Nacional do Livro Didático (PNLD), as quais preveem a distribuição de livros e material didáticos articulados com outras áreas do conhecimento. É impossível atingir a meta. O Brasil não tem escritores para escrever esses livros e não estão explícitos os possíveis escritores e atores que poderão contemplar a interdisciplinaridade de textos para o ensino básico.
Uma pergunta se impõe: alguém do governo terá coragem, diante desse quadro, de falar nas perspectivas do Ensino Médio? O que funciona há mais de 60 anos está sendo destruído. Com professores desmotivados, na verdade, a perspectiva é rala. Mais uma esperança que se esvai, no esgotado espírito do sofrido magistério brasileiro. Melhorar a educação brasileira, de um modo geral, pode ser uma utopia? Depende, naturalmente, da existência de uma política séria, no setor, conduzida por pessoas competentes e desinteressadas de proveito pessoal ou político.
No Brasil, a canoa da educação parece furada, por falta de uma clara vontade política e por uma deficiente mentalidade que nela ainda não enxergou o futuro. Além das questões estruturais, existem problemas concretos, como a valorização do professor, que precisa ganhar mais e deve ser cobrado pelos resultados. É por isso que estamos longe de uma perspectiva favorável. Democratização do ensino não é baixar o nível de ensino na escola (igualando a todos na ignorância), mas levar o bom ensino a todos, para que cada um chegue aonde quer e pode chegar.
Qual é o milagre que se espera? É nesse panorama que, hoje, se abre uma larga discussão em torno do futuro da educação brasileira? A educação brasileira é um dos tristes marcos do período republicano e nos três últimos governos. E talvez venha a repetir o mesmo ciclo de frustrações no atual governo.
Enquanto isso, o analfabetismo cresce, em vez de decrescer, seja pelos milhões acumulados de seres humanos que nunca pisaram numa sala de aula, seja por outros milhões que deixam a escola sem nada aprender, como é o caso dos analfabetos funcionais, essa nova praga que ameaça comprometer o futuro da nação. Isso significa que a maioria desses jovens chega ao final do curso sem saber ler e escrever ou fazer as quatro operações aritméticas, o que é tão mais grave quanto se sabe que ler, escrever e calcular são os pré-requisitos básicos da vida cultural e da sobrevivência competitiva dos seres humanos.
O Brasil dá mais ênfase ao topo, o ensino superior, do que à base, o ensino fundamental. O resultado é outra manifestação de instabilidade: a qualidade do ensino superior vem sendo puxada para baixo por causa da má qualidade do ensino médio; e este também vem perdendo qualidade por causa da piora no ensino fundamental.
Outra insensatez é a incompetência para enfrentar o drama do magistério. Os professores são malformados e pessimamente remunerados.
Como pretender, assim, uma educação de qualidade? Os cursos de formação de professores padecem de um abissal anacronismo. Colocar um computador na mão de quem não sabe manejá-lo significa muito pouco. Pensando bem: desde que essas máquinas terríveis entraram no cotidiano das escolas, qual foi o aperfeiçoamento dos conteúdos?
A Educação é o caminho, antes que o país afunde de vez na ignorância, miséria e violência.
*Nelson Valente é professor universitário, jornalista e escritor.