Maria José Rocha Lima
João Cândido Portinari, filho único do artista Cândido Portinari, quer promover versão do projeto Guerra e Paz e levar os painéis a outros países para que a mensagem do pai seja ouvida por mais pessoas.
Candinho quer ampliar o valor dos trabalhos que o pai dedicou à luta pela paz mundial e dignidade humana. “A Guerra e Paz tem uma atualidade evidente”, apontou João Cândido, lembrando que confrontos, crise de imigrantes e até a pandemia de Covid-19 são questões que nos fazem repensar as nossas posições diante da vida e do planeta.
Entre 2006 e 2007, coordenando o Projeto Angola Bem Alfabetizada, em Luanda, capital do país africano, descobri no acervo de Portinari uma riquíssima série de pinturas sobre crianças negras. O Brasil não conhece o Brasil!
Realizamos no Hall do Ministério da Educação de Angola uma exposição com réplicas digitalizadas da obra de Cândido Portinari, e os angolanos faziam comentários que nos surpreendiam sobre as suas identificações com os brasileiros. Os próprios organizadores da exposição, eu e o jornalista Adênio Carvalho, vivenciamos a experiência da nossa própria identificação com os retratos e figuras pintadas por Portinari com figuras e pessoas negras de Angola.
Depois, veio o incrível impacto que tiveram as obras expostas, a surpresa experimentada pelo ministro da Educação de Angola e outros governantes, que desconheciam muitas das obras de Portinari e o seu imenso acervo, reunindo crianças negras. Selecionamos Negrinha, Crianças brincando, Menino e carneiro, Baianas, Meninos na gangorra, Meninos pulando, Menina com flor, Menina com tranças e laços, Moça, Menino e estilingue e Menino pulando carniça, dentre outros.
Experimentamos, em terras que nos pareciam estrangeiras, algo que só entendemos ao ler a Carta póstuma de João Cândido Portinari ao pai, em que fala: “Tantos anos se passaram aos poucos a vontade de te buscar, buscar de volta o Brasil”. Confessa Candinho, como carinhosamente o chamamos: “Sinto uma ânsia incontida de resgatar o que tem de autenticamente nosso, falta você voltar e resgatar a autenticidade do Brasil: o luar do sertão, o Menino da porteira, os índios, os negros e mulatos”…, diz Candinho, na linda carta.
Candinho fundou o “Projeto Portinari”, do qual é diretor-geral, uma década depois da morte do seu pai, tendo como objetivo de resgatar a arte do mestre Portinari. Com isto, ele busca resgatar a trajetória do artista e auxiliar no conhecimento histórico-cultural do Brasil. Além de contribuir para os estudos da identidade cultural do País, a organização incentiva a formação histórica de crianças e adolescentes.
A Missão Original do Projeto Portinari “é contribuir para a ação cultural, por meio de um trabalho cujos pontos de partida são a obra e a vida de Candido Portinari (1903-1962) e sua interação com seus contemporâneos”, destaca.
Tivemos muita sorte em 2005, quando João Cândido Portinari gentilmente autorizou ilustrarmos a capa do primeiro livro sobre o Fundeb, publicado pelo Ministério da Educação – MEC / INEP, de minha autoria com Vital Didonet, com linda e expressiva pintura de Cândido Portinari. Ele nos disse que via, no quadro Menino pulando carniça, “um salto para um mundo no qual todas as crianças possam brincar e aprender”.
Em 2015, na coordenação-executiva da equipe de elaboração do 1º Plano Decenal de Atendimento Socioeducativo do Distrito Federal – PDASE -, solicitamos autorização de João Cândido para ilustramos a sua capa do trabalho.
Agora, ele considera promover a segunda versão do projeto Guerra e Paz e levar os painéis a outros países para que a mensagem do pai seja ouvida por mais pessoas. “Será uma felicidade imensa ver como o olhar chinês olha Portinari”, contou ele, salientando que o mesmo desejo pela paz une os povos brasileiros e chineses.
Será mais uma oportunidade de transmitir o sonho de Portinari de um mundo melhor.
*Maria José Rocha Lima é mestre e doutoranda em educação. Foi deputada de 1991 a 1999. É presidente da Casa da Educação Anísio Teixeira e dirigente da Associação Brasileira de Estudos e Pesquisas em Psicanálise – Abepp.