*Tião Lucena
Rosa rezara aos pés da santa, Nossa Senhora do Bom Conselho, pedindo graças para o filho de cinco anos. Não pedia nada para ela, perdera o gosto, a vaidade. Viúva de luto fechado, não desejava outra coisa na vida que não fosse ver o filho crescer e se manter por conta própria.
Naquele dia esquecera a hora de voltar e, quando deu fé, o sol já se punha no Alto dos Bezerra.
Pegou na mão de Mundinho e seguiu para o Sítio Várzea, onde morava com ele na casinha por trás dos montes, pequena, sem luz elétrica, de um cômodo só, herança única do falecido.
Na parede do Açude Velho Zé Perequeté, vizinho de sítio, espreitava.
Vigiava a viúva fazia tempo, desejava um chamego que sempre lhe era negado.
Naquela boca de noite aconteceu.
Investiu sobre a mulher, ignorou a criança, serviu-se dela e, para eliminar testemunhas, matou-a com cinco facadas.
Mundinho viu tudo, jogado num canto da estrada.
Zé, terminado o serviço, foi embora.
Rosa ficou estendida na estrada, furada de faca, se esvaindo.
Parentes tardios surgiram para chorar a morta e cuidar da criança.
Um tio de São Paulo levou Mundinho para morar com ele.
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O sítio não mudara muito nesses 17 anos, constatava Mundinho. As mesmas casas conjugadas, a bodega de Pedro André, a capelinha, o curral com sua porteira de madeira grossa. Havia de novo um restaurante a receber os lordes da cidade, que ali apareciam para experimentar o bode com cuscuz de Dona Quitéria.
A casinha da mãe fora demolida. Não sobrou nada, nem o alicerce.
E a casa de Zé Perequeté continuava no mesmo endereço.
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Era hora do descanso pós almoço.
Zé comeu bem.Encheu o bucho, bebeu dois canecos d`água, acendeu o cigarro de fumo e deitou na rede armada na sala para o deforete.
Estava ali espiando a cumeeira da casa enquanto as galinhas ciscavam no terreiro e o galo tarado as perseguia atrás de fazer ovo.
Mundinho espiou por debaixo da porta, viu a rede, o corpo dentro dela e apontou o 38, de onde saíram seis bocas de fogo. Seis tiros foram disparados, quebrando o silêncio da tarde. Seis buracos se abriram na rede, por onde se via o sangue jorrar.