Tião Lucena*
Havia uma cidade no mundo encantado do sertão que era habitada por muitos jovens. Havia gente velha também,, mas os jovens eram mais numerosos e animados.
Eles faziam festas, dançavam, cantavam, namoravam, não se preocupavam com tristezas, jamais se decepcionavam, no máximo sentiam saudade de alguém que, forçado pelas circunstâncias, tinha que partir para outros mundos.
O reino encantado do sertão ficava no alto de uma serra e era cercado, nos seus quatro cantos, por quatro serras maiores.
Do alto de uma delas, a mais comprida, se avistava um bonito vale e, no centro desse vale, dava pra ver o reino encantado e seus habitantes, vistos do alto em tamanhos tão pequenos que, quem via de lá de cima pensava que estava vendo pequenas formigas.
Havia a igreja, centenária, de quatro torres, cada uma vigiando as entradas e saídas. O sino, no alto da torre principal, avisava os principais acontecimentos do reino, também dizia as horas e, nos momentos de tristeza, tocava um som de finados dando ciência aos moradores da morte de alguém.
A sua principal avenida era suntuosa. Casarões enormes falavam das riquezas dos seus moradores. O estilo colonial das construções impressionava o visitante que por lá passava em demanda de outros mundos.
E como acontece em todo reino, no reino encantado havia também gente pobre, morando em casas pequenas, conjugadas, separadas umas das outras por uma parede de tijolos que mal disfarçava o som do vizinho.
E os jovens do reino, de tão felizes, sequer admitiam a viagem que se aproximava para continuarem os estudos em outros reinos mais desenvolvidos.
Duvidavam que nos outros reinos encontrariam aquela paz, aquela alegria, os bailes dançantes, os namoros, os primeiros beijos, os inocentes passeios nas tardes de domingo pela Rua Grande recheados de olhares doces,apaixonados, desabrochando em cada coração as primeiras paixões, os primeiros amores.
No reino encantado do sertão não havia mar, mas não faltava água para a diversão dos moradores. Quatro açudes cercavam o reino, cada um mais bonito do que o outro, sendo que no mais antigo, que tinha um nome de padre santo, improvisava-se uma prainha com direito a local para mergulhos, área separada para o banho das senhorinhas e até o mergulho no paredão pelos mais afoitos que não temiam a cobra gigante que, diziam, habitava suas águas escuras.
Diziam os mais velhos que essa cobra não era cobra de verdade, mas uma linda moça vítima de um pai cruel, que mandou um feiticeiro transformá-la em cobra porque ela cometeu o terrível pecado de mar e se entregar ao amor de corpo e alma.
Transformou-a e jogou-a nas águas escuras do paredão e ela ali ficaria, por séculos sem fim, até que aparecesse um príncipe encantado, além de valente, que tivesse coragem para mergulhar até o fundo, encontra-la e, após o beijo do desencanto, trazê-la de volta à vida.
A coragem dos rapazes do reino não chegou a tanto e por isso a cobra continuou escondida no escuro das águas, morando numa loca de pedra incrustrada no fundo do paredão, um lugar sem luz e sem vida, feio e malassombrado, onde nem peixe encostava.