Cirurgião geral inovou com técnicas para tratar pacientes com tumores no fígado e pâncreas e se tornou referência entre os médicos da capital
Médico Roland Montenegro – (crédito: Reprodução/Instagram @rolandbmountain)
O acidente envolvendo um avião, em Barcelos, no Amazonas, na tarde deste sábado (16/9), vitimou o médico Roland Montenegro Costa. Aposentado do Hospital de Base de Brasília, Roland era cirurgião do aparelho digestivo, pioneiro dos transplantes em Brasília, atuava em consultório particular e operava em diversos hospitais da cidade.
Ao longo dos 45 anos de atuação médica, Roland se tornou referência na capital e inovou a medicina com técnicas para tratar pacientes com tumores no fígado e pâncreas. Em 2006, por exemplo, utilizou uma técnica incomum para extrair um tumor do fígado de uma mulher, de 52 anos, que havia sido desenganada por outros médicos.
“Foi utilizado muito conhecimento que a experiência do transplante nos trouxe. O risco de morte tornava quase proibitivo seguir com a cirurgia, mas julgamos que conseguiríamos manter as estruturas vitais para garantir a sobrevivência da paciente”, detalhou o médico Lúcio Lucas, 53 anos, que participou do tratamento dessa paciente, ao lado de Roland.
Em setembro de 2005, Roland também impressionou ao retirar um facão de 25cm de comprimento do pescoço de um pedreiro. A lâmina estava próxima à aorta mas o médico conseguiu salvar a vida do paciente, em cirurgia que durou duas horas.
As habilidades de Roland renderam à medicina uma nova técnica para cirurgia no pâncreas, que levou o sobrenome dele. A técnica de Montenegro para anastomose pancreato gástrica foi descrita em 2005 e apresentada no Congresso Europeu da Sociedade Internacional de Cirurgia Hepato-Pancreatobiliar, em Heidelberg, na Alemanha.
Nos casos de retirada de tumor no pâncreas, a reconstrução do órgão após o procedimento envolve diversas dificuldades. Cerca de 25% dos pacientes apresentam complicações, mas, com a técnica desenvolvida por Roland, essa estatística diminuiu drasticamente. “Pela técnica de Montenegro essa reconstrução do pâncreas passou a apresentar cerca de 5% de complicações”, disse Lúcio.
Pacientes se tornaram amigos
A jornalista Gláucia Guimarães, de 51 anos, conta que conheceu o médico há 10 anos, em um momento difícil da vida. “Eu descobri um nódulo na cauda do pâncreas. Na época, consultei vários médicos e todos indicaram Roland. Ouvi de muitos profissionais da saúde que se eles próprios tivessem qualquer problema no pâncreas, não teriam dúvidas, procurariam o Dr. Roland”, relatou.
Gláucia operou com Roland e depois a relação entre médico e paciente virou uma grande amizade. “Trocávamos mensagens por aplicativo de mensagem, conversávamos de política, mas principalmente do que a gente gostava muito de fazer. Ele amava pescar e eu amo praia”, detalhou.
A amiga de longa data lamentou a partida precoce de Roland. “Era um cara muito importante na minha vida, sempre vou me lembrar do carinho dele comigo, do cuidado com o paciente, do telefone dele à disposição, dos elogios que ele me fazia quando eu estava trabalhando na TV”, relembrou.
Lúcio também chorou a morte do parceiro de trabalho, com o qual trabalhou por 24 anos. “Pra mim, ele foi um dos cirurgiões mais importantes que já passou por Brasília, ele tinha uma capacidade única e inovadora”, contou.
Lúcio revelou que Roland foi um dos primeiros cirurgiões do Brasil a ir buscar especialização em transplantes fora do país. O cirurgião se aperfeiçoou na profissão em temporadas na Alemanha e nos Estados Unidos. Em 1987, ele foi estagiário em Cirurgia Geral no Hospital Klinikum Steglitz, da Universidade Livre de Berlim, na Alemanha e, anos mais tarde, entre 1991 e 1993, fez fellow em transplante de órgãos abdominais pela Universidade de Pittsburgh, na Pensilvânia, nos Estados Unidos.
“Ele era uma pessoa muito especial e vou lembrar dele como uma pessoa de extrema habilidade, sempre foi uma pessoa com muito conhecimento, sempre ajudou os profissionais mais novos”, contou Lúcio, com a voz embargada.
Com o Correio*