Investigadores da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) descobriram que os lojistas do setor H Norte, em Taguatinga, alvos da Operação Último Suspiro, deflagrada nessa quarta-feira (21/10), davam treinamento aos ladrões de airbags. A informação foi confirmada após oitivas com os presos.
De acordo com a PCDF, após ensinar os criminosos a retirar as bolsas de airbags sem acioná-las, os comerciantes passavam a agir como receptadores dos itens furtados pelos seus “alunos”.
Também foi narrado que alguns lojistas que efetuam trocas de airbags no setor H Norte enganam os consumidores. Eles usam leitores que “resetam” as centrais eletrônicas. Assim, muitas vezes, o consumidor acha que teve seu airbag trocado, quando em verdade foi apenas desligado o alerta no painel. Com isso, em caso de eventual acidente, o sistema do airbag pode não funcionar.
O delegado Erick Sallum, da Coordenação de Repressão a Crimes Patrimoniais(Corpatri), explica que os sistemas de airbags são de alta complexidade e precisão, tendo seu acionamento em fração de segundos. Qualquer “jeitinho” na substituição poderá acarretar o mal funcionamento e eventual lesão dos motoristas. É absolutamente vedada por Lei a comercialização de itens de segurança usados.
“A PCDF orienta a população a não adquirir esses produtos em lojas descredenciadas, sob risco de vida por eventual inoperabilidade durante uma colisão. Aqueles que pagaram por esse serviço ilegal em lojas do Setor H Norte devem procurar verificar a segurança dessa instalação nas respectivas autorizadas”, alertou Sallum.
Operação
A PCDF deflagrou, nessa quarta-feira (21/10), operação para desarticular a organização criminosa especializada em furtos de airbags de veículos de luxo. Os dispositivos de segurança eram destinados a lojas de revenda de autopeças localizadas em Taguatinga. A Operação Último Suspiro cumpriu cinco mandados de prisão preventiva, uma temporária e 16 de busca e apreensão.
As apurações da Corpatri apontaram que o criminosos descobriram nos acessórios um rentável nicho de lucratividade e passaram a investir no furto e roubo das peças para revendê-las. Trabalho de inteligência desenvolvido pela unidade especializada mapeou, entre janeiro de 2019 e outubro de 2020, cerca de 130 ocorrência policiais registrando o furto ou roubo dos airbags.
As investigações duraram cerca de um ano e dezenas de perícias foram feitas, mas nenhuma conseguiu apontar os autores. Somente com o monitoramento dos receptadores – lojistas do setor de autopeças – foi possível desvendar quem seriam os responsáveis por tantos furtos. Dada o perigoso risco de deflagração das bolsas dos airbags durante a extração, a habilidade dos criminosos era espantosa, segundo a PCDF.
Modus operandi
De acordo com o delegado Erick Sallum, o modus operandi da organização criminosa era sempre o mesmo. Em poucos minutos, usando carros roubados clonados, estacionavam ao lado dos veículos escolhidos para serem furtados. Enquanto um dos ladrões ficava ao volante, o outro, pela janela traseira, quebrava o vidro do carro da vítima e entrava por ela, sem sequer abrir a porta.
“Depois, já do lado de dentro, rapidamente efetuava a desconexão das bolsas dos airbags e retornava pela janela ao seu veículo, fugindo em seguida. Essa dinâmica se dava mesmo durante o dia e em estacionamentos movimentados. Eram tão habilidosos que ninguém percebia”, explicou o delegado.
As investigações apontaram que os criminosos eram tão experientes que buscavam espalhar os furtos em diversas regiões do DF, evitando repetir locais em espaços curtos de tempo. “O registro fragmentado desses furtos em delegacias diferentes camuflava o fenômeno que aparentava tratar-se de casos isolados. Durante a investigação, os policiais acompanharam o registro de cerca de 79 furtos. Os investigados possuíam dezenas de passagens criminais por furtos em interior de veículo, alguns deles atuando nessa área há mais de uma década”, ressaltou Sallum.
Vínculo criminoso
Com as informações levantadas, foi possível aos investigadores estabelecer o vínculo entre os lojistas do setor H Norte e os criminosos, ficando claro que a destinação dada aos airbags era o mercado paralelo.
“Embora seja expressamente vedada por lei a comercialização de airbags usados, inúmeras lojas oferecem o produto. Enquanto na concessionária a troca desse item sai por R$ 10 mil, no setor H Norte, se encontra o mesmo airbag custa R$ 1,5 mil”, destacou o delegado.
A investigação atestou a existência de uma verdadeira indústria da pilhagem. Criminosos furtam os objetos que depois são colocados à venda em lojas sob um verniz de legalidade, enganando a população. Nesse contexto, dois lojistas, apontados pela PCDF como dois dos maiores maiores receptadores do esquema, foram presos preventivamente. Outras 13 lojas sofreram buscas e apreensão.
“Essa é a primeira grande operação no Brasil sobre o tema. Com a luz jogada sobre esse fenômeno, com certeza, as polícias Judiciárias nos demais estados da federação também notarão essa nova modalidade de crime”, analisou o delegado.