Uma tragédia se abate sobre os lares brasileiros, com explicações diversas – muitas com viés ideológico ou político – para o fenômeno: mulheres são espancadas, violentadas e mortas.
As feministas culpam a cultura do machismo e o regime do patriarcado, no qual o homem é dono da mulher e dos filhos, como se fossem propriedade particular dele. Por essa ótica, a violência cessaria com o fim desse sistema.
Na visão dos comunistas, a violência contra a mulher é resultado da sociedade de classes, na qual a divisão do trabalho escraviza o homem na labuta sem fim e à mulher é reservado o cuidado com a prole e os serviços domésticos, tornando irrespirável a atmosfera do lar.
Outros culpam os avanços nas relações sociais, a modernidade que chegou sem avisar, sem preparar as pessoas para a realidade de que homens e mulheres disputam o mercado em pé de igualdade e governam o lar em conjunto, sem a figura do homem provedor e da rainha do lar.
Veio a liberação sexual, o desquite, o divórcio, as famílias de meio-irmãos, de filhos de homem com homem e mulher com mulher, mas esqueceram de abolir o sentimento de posse que cada um carrega dentro de si, o ciúme exagerado, o controle doentio da rotina do outro, a relação opressiva que impede o outro até de respirar.
Antigamente, as relações se davam por fases: o namoro, para uma aproximação; o noivado, para melhor conhecimento; e o casamento, após amadurecer a relação. Hoje em dia, a relação sexual já se dá no primeiro encontro e o casamento vem como uma diversão, para juntar os amigos e fazer farra com o acontecimento, exibido à exaustão nas redes sociais e na imprensa, para quem tem dinheiro para pagar uma página social.
As mulheres são pressionadas a ter um homem de qualquer jeito, e então escolhem namorados, companheiros e maridos pela aparência, pelo status social ou apenas para ter alguém ao lado, sem ao menos passar por uma fase de namoro para ver as reações do pretendente em cada ocasião, se ele maltrata e humilha pessoas simples, se chuta animais, se manifesta ira diante da menor contrariedade, se controla o cardápio da parceira, se cerceia sua palavra em público, se tem ciúmes por causa de um simples olhar e outros sinais que precisam ser observados.
Há homens cujo jeito de andar e olhar, como se fossem dar um golpe fatal em outrem, nos fazem mudar de calçada, mas há mulher que a eles se entregam, como se entregam a assassinos e estupradores nos presídios, a exemplo das milhares de pretendentes a casar com o Maníaco do Parque e à corajosa que se tornou noiva do ex-goleiro e esquartejador Bruno.
Junte-se a essa fragilidade a violência que o brasileiro carrega dentro de si, provada pelos 62 mil assassinatos e pelas 45 mil mortes anuais no trânsito.
O Brasil é um país originalmente triste, composto por gente desterrada ou despojada de suas terras, que disfarça a tristeza com festas e consumo exagerado de bebidas alcoólicas, drogas ilícitas e remédios tarja preta, e mata, sem piedade, sempre que pode.
As crianças também são negligenciadas, abandonadas e violentadas sexualmente.
Precisamos discutir as relações interpessoais no Brasil, especialmente entre homens e mulheres.
*Miguel Lucena é Delegado de Polícia Civil do DF, jornalista e escritor