A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) entrou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) para que trechos da Lei de Abuso de Autoridade, aprovada no Congresso Nacional na última semana, que restringem ações de juízes sejam considerados inconstitucionais. A interpretação é de que o propósito da legislação é de “amordaçar a magistratura brasileira” e impedir que a mesma julgue livremente.
“A lei atinge frontalmente a liberdade de julgar e rompe o pacto federativo, reduzindo sobremodo a atuação do Poder Judiciário, em especial no combate à corrupção, pois criminaliza a própria atividade de julgar, núcleo intocável em Estado Democrático de Direito”, disse a AMB em nota ontem.
Para a associação, compete ao STF cortar do sistema jurídico os artigos de leis — classificados como inconstitucionais pela categoria — que atingem a independência do Poder Judiciário, da segurança jurídica e da proporcionalidade.
A AMB questiona artigos que preveem a criminalização de algumas condutas de juízes. Ainda que a nova lei estabeleça que “a divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura abuso de autoridade”, para a associação a atividade de juiz fica desprotegida.
“Todo e qualquer jurisdicionado que, por achismo, compreender que, nas hipóteses elencadas da nova lei, o magistrado tiver decidido ‘com a finalidade específica de prejudicar outrem’, ou ‘de beneficiar a si mesmo ou terceiro’ ou ainda ‘por mero capricho ou satisfação pessoal’, haverá de propor uma ação penal”, diz o texto enviado à Suprema Corte.
Ou seja, no entendimento da AMB, todo cidadão que entender, dentro das hipóteses previstas na lei, que o magistrado agiu com o objetivo de prejudicar outra pessoa, ou beneficiar a si mesmo ou a um terceiro, ou ainda por interesse pessoal, poderá propor uma ação penal contra o juiz do caso.
A ação direta também relata que a nova lei tem causado “perplexidade” no mundo jurídico e que há juízes deixando de impor bloqueios de valores ou prisões preventivas com o receito de serem enquadrados no crime de abuso da autoridade.
Ainda de acordo com a associação, os eventuais abusos que forem feitos por magistrados devem ser corrigidos em cada processo, “por meio de recursos próprios e adequados e, excepcionalmente, por meio de sanção disciplinar administrativa”.
Histórico
Antes da promulgação da Lei de Abuso de Autoridade, feita na sexta-feira pelo presidente Jair Bolsonaro, o Congresso Nacional derrubou 18 vetos presidenciais. Ao fazer isso, os parlamentares determinam a reintegração daquele trecho ao texto da lei.
Na última quarta-feira, o presidente da Associação Nacional dos Juízes Federais (Ajufe), Fernando Mendes, já havia dito que a categoria iria recorrer ao STF, provavelmente por meio de um ADI, contra três artigos reinseridos na lei.
Artigos questionados
A AMB questiona os artigos que preveem a criminalização, sob pena de um a quatro anos de algumas condutas dos juízes, consideradas abusivas pela lei recém aprovada no Legislativo.
» Condutas passíveis de criminalização pela Lei de Abuso de Autoridade
» Mandar prender em “desconformidade com as hipóteses legais”
» Deixar de revogar prisão ou conceder habeas corpus “quando manifestamente cabível”
» Decretar condução coercitiva “de testemunha ou investigado manifestamente descabida ou sem prévia intimação de comparecimento ao juízo”
» Impedir ou atrasar sem justificativa a realização de audiência de custódia
» Abrir investigação contra alguém sem indícios de crime
» Bloquear bens acima do valor da dívida
» Atrasar julgamentos com demorados pedidos de vista
» Violar prerrogativas de advogados, como “a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho”
» Impedir, “sem justa causa”, o encontro entre preso e advogado