Esqueçam a ideia do Lulinha paz e amor. A nova versão do candidato para as eleições de outubro será mais PT-raiz e menos nutella
Zombando do empresariado, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, afirmou que não é preciso a campanha petista reeditar um documento como a Carta aos Brasileiros. No entanto, disse que não irá “quebrar contratos”. Mas advertiu: “E não tem mimimi do mercado”. Ela é uma das figuras de maior confiança do ex-presidente no partido. No Twitter, a ex-senadora escreveu que irá revogar a “lei do teto, uma reforma que não gerou empregos, a política de preços dos alimentos, deter a privatização selvagem e rever os contratos lesivos ao País”. Ela também é porta-voz do pensamento do partido a respeito da dolarização dos combustíveis que, segundo Gleisi, foi “para enriquecer acionistas da Petrobrás às custas do povo”.
Espanto
Os sinais do futuro programa econômico petista criaram ruídos entre empresários, economistas e aliados de Lula. Foi a maior fonte de desgaste da campanha desde que Lula declarou a jornalistas espanholas que apoiava a ditadura de Daniel Ortega na Nicarágua. Enquanto a maioria esperava que o petista elegesse como porta-voz na economia um acadêmico, vinculado à Unicamp (Guilherme Mello era um candidato natural), Lula escalou o ex-ministro Guido Mantega para escrever sobre o pensamento econômico do presidenciável em artigo para o jornal “Folha de S.Paulo”. Foi um desastre. Mantega esteve à frente da Economia de 2006 a 2014 e caiu em desgraça após patrocinar a maior recessão da história do País, na gestão Dilma. O ex-ministro estava escanteado. Mas, como se sabe, a liderança de Lula se sobrepõe às decisões racionais na legenda. O ex-presidente corroborou que manterá a economia sob seu controle. Esse é um recado para o ambiente político, em que os partidos cobiçam o cargo, inclusive o próprio PT. No artigo, Mantega inclusive omite o fiasco da recessão, numa demonstração de desonestidade intelectual que espantou economistas. Limita-se a criticar o presidente Bolsonaro e “pula” em sua análise os números do desastre de 2014 a 2016.
Outro episódio que causou ruído foi a publicação de Lula no Twitter elogiando as iniciativas para uma contrarreforma trabalhista, motivadas no exemplo espanhol. “Importante que os brasileiros acompanhem de perto o que está acontecendo na reforma trabalhista da Espanha, onde o presidente Pedro Sánchez está trabalhando para recuperar direitos dos trabalhadores.” Desconsiderou vantagens introduzidas pela norma, como a possibilidade de trabalho remoto. Os sindicalistas se empolgaram, já que sonham com a volta do imposto sindical. O ânimo no tema é tamanho que, na terça-feira, 11, houve uma reunião virtual com representantes espanhóis e os principais nomes da pauta trabalhista da campanha: Lula, Gleisi, Aloizio Mercadante e as seis principais centrais sindicais (CUT, Força Sindical, UGT, CTB, Nova Central e Intersindical). Ex-tucano, Alckmin aproveitou para vazar que estava “incomodado” com essa proposta, apesar de ela ser defendida abertamente pelo PT nos últimos anos. O gesto foi interpretado como uma forma de “aumentar seu passe” nas negociações para vice na chapa petista.
A ofensiva petista mostra que Lula acha que tem cacife suficiente (ou falta de novas ideias, diriam os críticos) para bancar propostas antigas, anacrônicas e que já se mostraram temerárias. As mágoas de uma prisão de 580 dias, injusta, segundo Lula e seus partidários, retirou o verniz negociador do sindicalista. Abandonado pelo empresariado e por políticos, que dividiram com ele a glória em anos de bonança na Presidência, ele parece estar mais influenciado pelos companheiros que o defenderam nos anos de vacas magras. O curso da campanha vai indicar até que ponto ele vai se agarrar a velhas teses. Ele pode estar pregando a convertidos, erro que o próprio Bolsonaro comete. Ou seu pragmatismo (e faro político) falará mais alto.