IPCA de abril avança 1,06%, maior variação registrada para o mês desde 1996. Disseminação da carestia pressiona o BC
A carestia não dá trégua e não para de corroer a renda da população. Em abril, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial, avançou 1,06% — a maior variação para o mês desde 1996 —, puxada por alimentos e combustíveis, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados ontem.
Em 12 meses até abril, o salto do indicador é 12,13%, maior taxa registrada desde outubro de 2003. No ano, o IPCA acumulou alta de 4,29%, taxa acima da meta de inflação determinada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para este ano, de 3,5%, e cada vez mais próxima do teto, de 5%.
O resultado do IPCA de abril é levemente acima da mediana das estimativas do mercado, de 1,01%. E, apesar de a taxa ter ficado abaixo dos 1,62% registrados em março, analistas demonstraram preocupação com o grau elevado da disseminação de aumento de preços entre os produtos pesquisados. Eles avisam que será difícil para o Banco Central interromper o ciclo de alta na taxa básica de juros (Selic) na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em junho, pois é crescente a perspectiva do mercado de que não haverá muita austeridade fiscal do governo neste ano eleitoral. O índice de difusão ficou em 78%, a maior taxa desde janeiro de 2003, de 85,94%. Em março, quando a inflação foi maior, esse percentual foi menor, de 76%.
“O aumento desse espalhamento é preocupante, porque significa que a inflação está mais persistente e que o Banco Central precisará atuar de forma mais dura, aumentando os juros”, explicou o economista André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). “Dentro desse contexto de espalhamento, podemos ver alta de preços de bens duráveis, como eletrodomésticos e automóveis, do táxi, do transporte por aplicativo, das passagens aéreas e até das refeições fora de casa”, enumerou.
O IPCA tem registrado taxas acima de dois dígitos no acumulado em 12 meses desde setembro de 2021. Na semana passada, o Banco Central elevou a taxa Selic de 11,75% para 12,75% e sinalizou nova alta em junho. Mas a maioria dos analistas aposta em elevações da taxa básica pelo menos até agosto, porque a inflação deverá persistir por um período mais prolongado, especialmente se não houver trégua entre Ucrânia e Rússia.
Pelas projeções de Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, a Selic deverá chegar a 13,75%, nas próximas duas reuniões, mas ainda há um “viés de alta”. “Com esse espalhamento elevado e essa resiliência da inflação acima de 10%, vai ser muito difícil a inflação cair para patamares menores”, alertou Vale. Ele acaba de elevar de 7,8% para 8,7% a previsão do IPCA deste ano e prevê o indicador acima de 10%, pelo menos, até agosto.
“Considerando os riscos à frente, especialmente na taxa de câmbio e nos preços de commodities, o BC tem elevada chance de, eventualmente, ter que levar a Selic para 14% ou mais. Isso não está descartado”, advertiu.
Segundo estimativas de Fabio Romão, economista sênior da LCA Consultores, o IPCA deverá continuar em dois dígitos até setembro. Apesar de prever o índice encerrando o ano em 9%, ele admitiu que ainda há riscos de uma alta maior no indicador. “O descasamento das cadeias globais gerou muito problema de oferta, e a guerra da Ucrânia impediu um reajuste mais moderado que estava por vir. Ainda tem a pressão dos preços do petróleo e a questão do protecionismo de alguns países produtores de alimentos. O espalhamento da inflação também é preocupante, mas, olhando adiante, ainda tem muita pressão encomendada”, explicou.
Conforme dados do IBGE, oito dos nove grupos de produtos pesquisados registraram alta de preços, menos o de habitação, que registrou queda de 1,14%, devido à retirada da bandeira de escassez hídrica na conta de luz. “Se não fosse a volta da bandeira verde, o IPCA de abril deveria ter sido mais alto”, alertou Braz, do Ibre.
Impacto entre os mais pobres
A inflação oficial está alta, mas o indicador do custo de vida das famílias mais pobres mostra que a alta de preços está sendo mais cruel no bolso das famílias mais pobres. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) acumulou alta de 12,47% em 12 meses até abril, quando avançou 1,04%, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Essa taxa acumulada do INPC, que mede a inflação para as famílias com renda de até cinco salários mínimos, é superior à registrada pelo IPCA — que monitora o custo de vida de famílias com renda mensal acima de cinco pisos salariais —, de 12,13% até o mês passado. “A inflação está generalizada, mas as famílias mais pobres sentem mais esse impacto, porque houve uma alta mais forte nos preços dos alimentos e um peso importante no INPC é a alimentação”, explicou André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). “Não foram apenas os alimentos in natura que tiveram altas de preços. Carnes, derivados de trigo, também registraram fortes aumentos de preços”, destacou.
Conforme dados do IBGE, oito dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados tiveram alta em abril. A maior variação, de 2,06%, foi decorrente de Alimentos e bebidas e, na sequência, com alta de 1,91%, os Transportes, por conta dos reajustes dos combustíveis. Esses dois grupos contribuíram com 80% da alta do IPCA de abril.
Não à toa, a cada mês que passa, o consumidor busca ofertas cada vez mais distante de casa. É o caso da professora Rose Carvalho, 46 anos, moradora da Asa Norte. Ela prefere fazer compras no Cruzeiro para abastecer a dispensa, devido ao preço alto dos alimentos no Plano Piloto. “Aqui (no Cruzeiro) eu faço mais compras de verduras e essas coisas que subiram forte (no preço), que não faço mais lá na 316, porque Asa Norte e Asa Sul são extremamente caras e então você acaba vindo para o Cruzeiro, ou para Taguatinga, para fazer compras”, disse a professora.
Além de tentar economizar nas compras do supermercado, muitos brasileiros buscam alternativas para contornar os preços dos combustíveis. Na semana passada, a média nacional do preço do litro de gasolina era de R$ 7,29, mas é difícil encontrar postos da capital federal com o combustível abaixo de R$ 7,50 atualmente. Diante disso, o vigilante Carlos Henrique, 42, procura abastecer o carro aos poucos. “Perdi as contas de quantas vezes abasteci este mês. Todo dia eu coloco de R$ 30 a R$ 50 no tanque”, disse. (Colaborou Raphael Pati, estagiário sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza)