Milhares de migrantes, a maioria de Honduras, fazem parte de uma enorme caravana que deixou o país na sexta-feira e que neste domingo se chocou com a polícia guatemalteca na tentativa de chegar aos Estados Unidos.
O Exército e a tropa de choque da polícia da Guatemala usaram forte violência no domingo (18) contra os integrantes de uma caravana de milhares de migrantes centro-americanos que se dirigiam aos Estados Unidos.
O grupo era formado por cerca de 6 mil migrantes, segundo dados oficiais, que deixaram Honduras entre quinta e sexta-feira. No sábado, outros 3 mil migrantes entraram na Guatemala sem respeitar os procedimentos na fronteira. Com isso, o número total de pessoas que compõem a caravana é de cerca de 9 mil.
Durante os incidentes deste domingo na tentativa de dispersar o grupo na cidade de Chiquimula, perto da fronteira entre os dois países, várias pessoas ficaram feridas.
O governo guatemalteco afirma ter deportado quase mil pessoas para Honduras nos últimos três dias por entrarem ilegalmente no país.
O Procurador de Direitos Humanos da Guatemala, Jordán Rodas Andrade, classificou como “deploráveis” as ações das forças de segurança contra os migrantes e disse que é preciso exercer “empatia e solidariedade”.
Os migrantes dizem que foram forçados a fugir da pobreza, violência e devastação causadas por dois grandes furacões em novembro do ano passado e querem chegar aos EUA via México.
‘Não há emprego em Honduras’
Depois de cruzar ilegalmente o ponto de fronteira de Florido, entre Honduras e Guatemala, os migrantes começaram a se concentrar na tarde de sábado em um posto militar em Vado Hondo, em Chiquimula. Lá as autoridades solicitaram documentos e um teste negativo para Covid-19, o que gerou conflitos que foram ficando mais violentos à noite.
Segundo as autoridades, cerca de 6 mil migrantes integram a caravana — Foto: Reuters/BBC
Na manhã de domingo, a caravana tentou tentar atravessar a barricada de mais de 3 mil policiais e soldados, mas foi repelida, segundo a autoridade de imigração da Guatemala.
Imagens de vídeo compartilhadas pelo governo guatemalteco e reproduzidas pela imprensa local mostram centenas de migrantes pressionando contra uma parede de soldados das forças de segurança.
“Vários ficaram feridos, entre migrantes, militares e funcionários da imigração”, disse Alejandra Mena, porta-voz do Instituto de Migração da Guatemala (IGM), de acordo com a agência de notícias Reuters.
Os migrantes tentaram romper o muro humano formado pelas forças de segurança da Guatemala — Foto: Reuters/BBC
Nos confrontos houve golpes de paus e gás lacrimogêneo — Foto: Reuters/BBC
A caravana de migrantes tenta chegar aos EUA a pé — Foto: EPA/BBC
As autoridades não informaram o número específico de feridos e mas disseram estar coordenando um trabalho para cuidar dos afetados.
“Eles não têm coração, estamos arriscando nossas vidas”, disse Dixon Vázquez, de 29 anos, à agência de notícias AFP, que pediu às autoridades guatemaltecas que deixem o grupo seguir viagem.
“Não há trabalho em Honduras”, disse ele.
Wilmer, um hondurenho da caravana de migrantes que atravessa a Guatemala, mostra uma foto de sua casa destruída pela tempestade Eta, motivo pelo qual decidiu ir para os EUA — Foto: EPA/BBC
O governo do México, que reforçou os controles em sua fronteira sul, elogiou o trabalho da Guatemala por agir “com firmeza e responsabilidade” em relação aos contingentes de migrantes que “violaram sua soberania”, em um comunicado do seu ministério das Relações Exteriores na noite de sábado.
O número de componentes da enorme caravana neste final de semana é ainda maior do que o organizado em outubro de 2018. Naquela ocasião, 7 mil pessoas conseguiram chegar à fronteira com os EUA, segundo dados das Nações Unidas.
A primeira mobilização de migrantes em 2021 ocorre poucos dias antes da posse do presidente eleito dos Estados Unidos, Joe Biden.
Biden prometeu em sua campanha uma abordagem mais humana para a migração, em contraste com as políticas duras do presidente Donald Trump.
A primeira grande caravana de 2021
Análise de Marcos González Díaz, da BBC News Mundo no México e América Central
Era questão de dias para que a América Central voltasse a ser a rota de uma nova caravana de migrantes que sonha com uma vida melhor nos EUA.
Além dos níveis sufocantes de pobreza e violência em Honduras, eles precisaram lidar com furacões, que deixaram muitos sem praticamente nada.
Os hondurenhos já alertavam que migrar seria sua única opção. E a esperança de que o próximo governo dos EUA relaxe sua política de imigração encorajou milhares de centro-americanos a se juntarem a essa nova jornada.
Mas para realizar seu sonho, é preciso enfrentar uma jornada que é um verdadeiro pesadelo.
Os migrantes dizem que foram forçados a fugir da pobreza, violência e devastação das poderosas tempestades que atingiram a América Central em 2020 — Foto: EPA/BBC
Não só pelos perigos que o percurso já envolve até chegar aos EUA, mas também por episódios alarmantes como o de Chiquimula, onde o exército guatemalteco recorreu ao uso da força para deter uma multidão e obrigá-la a entrar no país “de forma regular”.
As imagens mostram o desespero de milhares de pessoas diante de soldados que tentam, com armas e gás lacrimogêneo, fazer cumprir a lei atual e exigir documentação e testes de PCR que poucos desses migrantes tinham condições de pagar.
Os que conseguirem passar enfrentarão outra barreira difícil em seu caminho: a fronteira sul do México, que o governo protege há dias com centenas de soldados e membros da Guarda Nacional.
Resta saber como as mudanças na imigração prometidas pelo presidente eleito Joe Biden moldarão o futuro daqueles que tentam migrar para os EUA e sua relação com o México e a América Central, após um governo de Donald Trump caracterizado por ameaças a esses países justamente por causa de caravanas como essa.
Por BBC