Índice acumulou avanço de 5,09% no mês e chegou aos 134.153 pontos. Entenda, em três fatores, o que impulsionou o mercado de ações brasileiro nos últimos dias.
Por André Catto, g1
Vista do prédio da B3, Bolsa de valores de São Paulo, localizada na região central da capital paulista, nesta sexta-feira (12). O Ibovespa flertou com os 129 mil pontos na máxima do dia, encerrando aos 128.896,98 pontos, em alta de 0,47% na sessão. Foi o quarto avanço semanal consecutivo para o índice da B3, que sobe agora 4,03% no mês, cedendo ainda 3,94% no ano. — Foto: GABRIEL SILVA/ATO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
O Ibovespa, principal índice de ações da bolsa de valores brasileira, a B3, fechou em alta nesta quinta-feira (15), pela oitava sessão consecutiva. Com o resultado, acumulou um avanço de 5,09% no mês, chegando aos 134.153 pontos — maior patamar no ano e muito próximo da máxima histórica.
O movimento foi impulsionado, principalmente, pelos ânimos dos investidores com a expectativa de corte de juros nos Estados Unidos pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano).
Mas outros fatores importantes têm colaborado com o bom momento do Ibovespa.
Entenda cada um deles a partir dos tópicos abaixo:
- A sinalização de corte de juros pelo Fed;
- O tom do Banco Central do Brasil;
- As declarações sobre o arcabouço fiscal.
A sinalização de corte de juros pelo Fed
Em 31 de julho, o Fed decidiu manter os juros do país inalterados na faixa de 5,25% a 5,50% ao ano. O movimento, que já era esperado pelo mercado, veio acompanhado de uma sinalização importante: um possível corte da taxa na próxima reunião, em setembro.
Na ocasião, o presidente do Fed, Jerome Powell, disse que um corte nos juros poderá “estar na mesa” caso os dados econômicos do país caminhem conforme o esperado.
“As leituras de inflação do segundo trimestre aumentaram nossa confiança, e novos dados positivos fortaleceriam ainda mais essa confiança”, afirmou Powell.
Desde julho de 2023, os juros dos Estados Unidos estão no maior patamar em mais de 22 anos. A taxa atingiu esse nível porque, a partir de 2022, o BC norte-americano promoveu sucessivas altas, em tentativa de conter a inflação causada pela pandemia de Covid-19.
O movimento se reflete em outros países — incluindo o Brasil. Juros mais altos nos EUA elevam a rentabilidade dos Treasuries (títulos públicos norte-americanos). Isso se reflete nos mercados de ações e no dólar, com a migração cada vez maior de investidores para o país, em busca de melhor remuneração.
Por isso, uma sinalização de queda nos juros dos Estados Unidos leva otimismo ao mercado de ações brasileiro: com uma possível redução da taxa, os rendimentos na economia mais segura do mundo tendem a diminuir, forçando os investidores a tomarem mais risco. Isso beneficia o mercado de ações por aqui.
“A probabilidade de corte nos EUA a partir de setembro é positiva para os ativos de risco globais e para mercados emergentes. E a bolsa brasileira navega bem nesse sentido”, explica Frederico Nobre, líder de análise da Warren Investimentos.
Um novo fator elevou a confiança dos investidores em um corte dos juros pelo Fed em setembro: a divulgação do Índice de Preços ao Consumidor dos EUA (CPI, na sigla em inglês), na última quarta-feira (14).
O índice subiu 0,2% em julho, acumulando uma alta de 2,9% em 12 meses. Excluindo os componentes voláteis da inflação — alimentos e energia —, o CPI subiu 0,2% em julho e 3,2% em 12 meses, no menor aumento anual desde abril de 2021.
Apesar de o resultado continuar acima da meta do Fed, de 2%, o mercado avalia que o comportamento mais benigno dos preços abre espaço para o primeiro corte nos juros desde 2020.
O tom do Banco Central do Brasil
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu, em 31 de agosto, manter a taxa Selic em 10,50% ao ano. O destaque, no entanto, foi para o tom duro da decisão.
Na ata da reunião, o BC se mostrou mais preocupado com a alta do dólar — e seu impacto na inflação futura — e informou que “não hesitará em elevar a taxa de juros para assegurar a convergência da inflação à meta se julgar apropriado”.
Uma elevação da taxa, portanto, está na mesa dos decisores, e será levada em conta a depender dos dados econômicos até a próxima reunião.
Frederico Nobre, líder de análise da Warren, explica que o tom mais duro do BC trouxe uma credibilidade adicional à autoridade monetária no combate à inflação.
Isso gerou um movimento chamado “flattening” (achatamento da curva de juros), em que há uma alta nos vencimentos mais curtos e uma queda nos mais longos. “Esse movimento de flattening é positivo para ativos de risco e para a bolsa de forma geral. Ele mostra que o Banco Central está comprometido com o combate à inflação e que se for necessário subir juros no curto prazo, vai subir. Isso alivia as expectativas no médio e longo prazo”, diz.
“Foi exatamente isso que nós vimos na curva de juros: os vencimentos mais curtos subindo e os mais longos caindo. A bolsa responde mais aos vencimentos mais longos. Então, as taxas de juros longas caindo são algo positivo para a bolsa de valores.”
Outra grande preocupação do mercado também está perto de se dissipar. Essa, envolvendo a sucessão do comando do Banco Central.
Desde que Lula assumiu a Presidência do Brasil, em 2023, cresceram os temores de interferência política dentro do BC. Foram inúmeras as críticas de Lula contra o atual presidente da autarquia, Roberto Campos Neto.
Os receios aumentaram após Gabriel Galípolo, ex-número 2 de Fernando Haddad no Ministério da Fazenda, assumir o cargo de diretor de Política Monetária do BC. A dúvida do mercado era se Galípolo seria um voto do governo dentro da autoridade monetária.
Após um ano no cargo, no entanto, Galípolo parece ter conquistado, ao menos para boa parte dos agentes econômicos, a imagem de um decisor técnico — contrariando a vontade de Lula, que se manifesta a favor de cortes forçados na taxa de juros para aquecer a economia.
Nesse sentido, a confirmação pelo blog do Camarotti de que Lula irá indicar Galípolo para presidente da autoridade monetária segue em linha com o esperado pelo mercado — e pode representar um alívio em relação à condução da política monetária após Campos Neto deixar o cargo.
“É uma indicação que não traz uma surpresa negativa. Ou seja, Lula não vai indicar alguém com um pensamento mais populista”, afirma Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating.
“As últimas declarações e votos do Galípolo foram na direção técnica. Ele é do mercado financeiro (…) e já deu demonstrações muito claras de que tem uma biografia a ser preservada. Não colocaria isso em risco.”
Para Agostini, a indicação de Galípolo “tira qualquer risco de uma volatilidade desnecessária”.
As declarações sobre o arcabouço fiscal
O risco fiscal, marcado pela dificuldade do governo em cortar gastos, é um dos fatores que tem aquecido os receios no mercado brasileiro.
Conforme mostrou o g1, a previsão é que as contas do governo registrem um rombo de R$ 28,8 bilhões em 2024. O valor é o limite da meta das contas públicas, prevista no arcabouço fiscal — a regra de gastos aprovada em 2023.
Nesse sentido, para conseguir cumprir com a regra, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, confirmou no mês passado o congelamento de R$ 15 bilhões no Orçamento.
Especialistas apontaram que o valor ainda não é o suficiente para o déficit (despesas superiores à arrecadação) limite de R$ 28,8 bilhões em 2024, mas o aperto nas contas foi bem recebido pelo mercado.
Especialmente a partir de julho, o governo tem buscado endossar os esforços de Haddad para o cumprimento com o arcabouço — fator importante para confiança dos investidores e a credibilidade do controle fiscal.
A principal mudança de discurso foi do presidente Lula, que viu o dólar disparar no fim de junho após sucessivas declarações sobre os gastos públicos. Na visão do mercado, as falas do presidente vinham sendo justamente na contramão do controle das contas.
Após as turbulências, o presidente passou a adotar, então, um tom mais ameno. Ele chegou a afirmar que “responsabilidade fiscal é compromisso” e que o governo “não joga dinheiro fora”.
Sem maiores ruídos em torno dos gastos públicos, a nova postura de Lula também têm ajudado para um período menos turbulento no mercado interno — com reflexos no Ibovespa.