Golpe de estado organizado pela elite possibilitou que Dom Pedro II acalçasse maioridade antes dos 18 anos. Ele governou de 1840 até 1889.
Por Marcella Rodrigues, g1 DF
A coroação de D. Pedro II. Óleo sobre tela de 1842. — Foto: François-René Moreaux, no Museu Imperial
Em 23 julho de 1840, um príncipe de 14 anos foi declarado maior de idade e se tornou rei do Brasil. Tudo isso graças a um golpe de estado que teve apoio de senadores e deputados.
O nome dele? Pedro de Alcântara, também conhecido como Dom Pedro II, monarca que governou o país por 49 anos. 👑
“Queremos Pedro II, embora não tenha idade. A nação dispensa a lei e viva a maioridade”, quadrinha – poema de quatro versos – que era falada nas ruas do Império.
Sem rei e com conflitos sociais e políticos assolando o país, o Golpe da Maioridade foi a solução encontrada pela elite da época para conseguir coroar o jovem príncipe e “pacificar” a nação(entenda mais abaixo).
“A realização do golpe se deu, ironicamente, com o juramento do príncipe à observância à Constituição e às demais leis”, explica Neuma Brilhante, professora da Universidade de Brasília (UnB).
Mudanças na monarquia
O termo de abdicação de 7 de abril de 1831, em que D. Pedro I “mui voluntariamente” abre mão do trono para seu filho. — Foto: Reprodução/MultiRio
Tudo começou em 1831, quando Dom Pedro II era uma criança de 5 anos. O Brasil já havia passado pelo processo de independência, mas vivia um cenário de conflitos e severas críticas ao império.
Naquele ano, seu pai Dom Pedro I, então rei do Brasil, desistiu do trono e voltou para Portugal, mas deixou seu filho e herdeiro nas terras brasileiras. Até que Pedro II completasse 18 anos, para enfim tomar seu lugar como imperador do Brasil, o país passou a ser comandado por regentes – grupos políticos. Essa fase ficou conhecida como Período Regencial.
Mas esse momento da história não trouxe estabilidade para o país. De acordo com Edson Violim, professor de História do Centro Universitário de Brasília (CEUB), no Período Regencial aconteceram rebeliões, choques políticos e revoluções armadas.
“Esse período turbulento não é interessante para a elite”, diz o professor Edson Violim, sobre o medo da elite de que o território brasileiro fosse dividido.
A coroação de Dom Pedro II apareceu como uma solução, para “personificar” o poder e a monarquia, “acalmando os ânimos” da população. O problema é que o príncipe ainda não ainda tinha 18 anos.
O ‘golpe’
Jornal “O Propugnador da Maioridade”, que defendia a coroação antecipada. — Foto: Reprodução/Biblioteca Nacional
A professora Neuma Brilhante, da Universidade de Brasília (UnB), explica que a proposta de antecipar a maioridade do jovem Dom Pedro II foi amplamente divulgada por jornais simpáticos à causa.
Um exemplo é o jornal O Propugnador da Maioridade, que publicou textos que defendiam a antecipação da coroação de Pedro de Alcântara (veja foto acima).
Neuma Brilhante conta que, em 1835, foram apresentadas à Câmara dos Deputados dois projetos sobre a temática. O deputado Luis Cavalcanti propunha a antecipação para os 14 anos, enquanto seu colega Antônio Ferreira França defendia que ela passasse para os 25 anos.
“Nenhuma das propostas foi levada à discussão. O tema voltaria ao parlamento ainda em 1837”, conta a professora.
O fortalecimento da causa se deu à medida que cresciam as insatisfações com o Período Regencial. A professora da UnB diz que importantes políticos participaram do movimento pelo golpe, com destaque para os chamados Áulicos – que frequentavam o palácio imperial e eram liderados por Aureliano Coutinho, tutor do príncipe.
Página do abaixo-assinado, de 1840, em que senadores e deputados pediam que o príncipe aceitasse assumir suas responsabilidades como monarca imediatamente, propondo a declaração da maioridade aos 14 anos. — Foto: Arquivo Nacional.
Foi então criado o Clube da Maioridade, por iniciativa do senador José Martiniano de Alencar. O clube foi comandado por Antônio Carlos de Andrada, irmão de José Bonifácio, e um dos principais nomes da política imperial desde a Independência.
“O Clube da Maioridade investiu no fortalecimento da mítica régia, com a organização de eventos públicos que exaltavam a realeza e o restabelecimento da cerimônia do beija mão”, diz Neuma Brilhante.
O Clube da Maioridade tentou alterar a lei sobre a maioridade por vias parlamentares, mas não conseguiu. Logo, o grupo procurou o príncipe e propôs que ele assumisse o poder, independentemente da lei. Assim, o golpe aconteceu em 23 de julho de 1840.
“Ele [Dom Pedro II] inaugura o reinado dele desrespeitando a constituição”, diz o professor Edson Violim.
A coroação
Dom Pedro II na coroação — Foto: François René Moreaux/Museu Imperial – Iphan
A coroação só aconteceu 18 de julho de 1841. O ato foi realizado em um domingo de sol, e centenas de súditos lotaram o Largo do Paço, no Rio de Janeiro.
Uma varanda foi erguida junto à Igreja de Nossa Senhora do Carmo para a cerimônia de coroação. Pedro II apareceu numa sacada de Largo Paço e acenou para a multidão.
A professora da UnB conta que quanto à idade, o jovem imperador e seus apoiadores diretos investiram desde muito cedo na imagem de sua maturidade precoce. Logo deixaria barba crescer e era apresentado comvestimentas sóbrias.
O reinado de Dom Pedro II
D. Pedro II e familia no Hotel Empreza Poço de Caldas. Ao lado direito, em pé, condé d’Eu, e ao lado esquerdo, de pé, a princesa Isabel. — Foto: Livro ‘Vida de Dom Pedro II’ / Biblioteca do Senado Federal
A professora Neuma Brilhante conta que os primeiros anos de governo de Pedro II foram bastante conturbados. Entre os fatos que marcaram o reinado, o professor Edson Violim destaca a Guerra do Paraguai, maior conflito armado da América do Sul.
A escravidão também continuou durante a maior parte deste segundo reinado brasileiro. Ela só chegou ao fim um ano antes da Proclamação da República.