A falha no lançamento do satélite Cbers-3, na última segunda-feira, não deve abalar a cooperação de mais de 25 anos com a China, mas é mais um revés para o programa espacial brasileiro, que tenta se reerguer após décadas de resultados questionáveis. Além do prejuízo econômico, o novo percalço manterá o país, pelo menos até 2015, dependente de imagens feitas por satélites estrangeiros para monitorar seu território.
Um dos principais prejuízos causados pela falha é a perda dos dados que seriam enviados do espaço. Há três anos e meio o país depende de satélites estrangeiros, e o Cbers-3 iria gerar imagens da superfície do território brasileiro que poderiam ser utilizadas, por exemplo, no controle do desmatamento, no monitoramento de desastres naturais e no zoneamento agrícola e das cidades.
“Além do próprio satélite e do seu valor como produto, deve-se somar os anos de operação que teria pela frente e a quantidade de dados que seriam coletados e utilizados por pesquisadores, empresas e pelo próprio governo brasileiro”, diz Artur Elias de Morais Bertoldi, especialista em engenharia aeroespacial da UnB.
A lacuna no monitoramento espacial brasileiro surgiu em 2010, quando o Cbers-2B parou de funcionar antes do tempo previsto, e com o atraso de três anos para o lançamento do Cbers-3, cuja construção foi dividida entre Brasil e China.
O Cbers-3 foi o quarto satélite desenvolvido pelo programa China-Brazil Earth Resources Satellite (Cbers) e custou cerca de R$ 300 milhões ao lado brasileiro. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), ocorreu uma falha na última etapa do processo para colocar em órbita o equipamento, que partiu de Taiyuan, na China.
O motor de propulsão do lançador chinês foi desligado 11 segundo antes do previsto, impossibilitando que o equipamento atingisse a velocidade necessária para se manter em órbita. Os pesquisadores do Inpe acreditam que o equipamento tenha se desintegrado na atmosfera.
“O prejuízo direto é que ficaremos mais um tempo sem esse tipo de informação que é muito importante, não só para o Brasil, mas o Brasil distribui para outros países essas imagens”, opina Othon Winter, professor da faculdade de engenharia da Unesp.
O Brasil era responsável por 50% da construção do satélite que se perdeu na segunda-feira. E, segundo Winter, o país estava preparado para cumprir sua parte, mas questões externas levaram ao atraso. O Brasil dependia da importação de materiais e, de acordo o especialista, um boicote dos Estados Unidos acabou atrasando a construção do equipamento. Além disso, quando o material chegou, falhas foram detectadas.
“Tanto do ponto de vista econômico quanto político há interesse de outras nações para que o Brasil não cresça nesse campo, porque se tivermos uma indústria produtiva na área espacial certamente seremos concorrentes de outros países”, afirma Winter.
A falha colocou em questão a parceria com a China. Mas segundo Winter, essa cooperação é positiva e não deve ser abalada, pois dá ao Brasil a possibilidade de desenvolver tecnologias no setor. O físico reforça que outras propostas de colaboração já foram feitas por diversos países, mas poucas delas eram vantajosas para o Brasil, principalmente as feitas pelos EUA.
“A política espacial americana, pelo menos com o Brasil, nunca foi a de auxiliar em termos de crescimento e desenvolvimento de tecnologia. São políticas internacionais que realmente não interessam para um país que quer ter autonomia e liderança”, afirma Winter.