Na defesa que fez para escapar à punição por ter participado do palanque, no último domingo, no Rio de Janeiro, general disse que agiu de acordo com a “honra pessoal” e que não podia fazer uma desfeita com a presença do comandante supremo das FAs
Em documento enviado ao Comando do Exército, ontem, no último dia do prazo para apresentar defesa, o general e ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello negou ter cometido transgressão disciplinar ao participar de ato político em favor do presidente Jair Bolsonaro, no Rio de Janeiro, no último domingo. Ele afirma que agiu de acordo com a “honra pessoal” e citou o artigo 6 do Regimento Disciplinar do Exército.
Neste trecho, o código deontológico prevê que a aplicação do regimento da corporação deve ser aplicado levando em consideração a “honra pessoal: sentimento de dignidade própria, como o apreço e o respeito de que é objeto ou se torna merecedor o militar, perante seus superiores, pares e subordinados”. Pazuello justifica que estava no evento com o presidente da República, comandante-em-chefe das Forças Armadas. O regimento proíbe que militares da ativa participem de ato político. Naquele evento, estavam reunidos motociclistas e militantes que apoiam Bolsonaro.
Situação delicada
O comandante do Exército, de acordo com fontes militares, tem até oito dias para tomar uma decisão sobre o caso de Pazuello. Ele se encontrou com Bolsonaro em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, e segundo os bastidores da caserna a tendência é de que a punição seja branda — para evitar atritos com o presidente, que promete suspender qualquer sanção mais pesada contra o ex-ministro da Saúde, o que pode gerar uma crise sem precedentes entre a Arma e o Palácio do Planalto.
No entanto, existe o temor de que uma punição branda estimule a impunidade, fazendo com que outros integrantes do Exército se sintam livres para participar de eventos políticos, principalmente aqueles que contarem com a presença de Bolsonaro — e, dessa forma, minar a hierarquia nas Forças Armadas. Poderiam utilizar da mesma justificativa de Pazuello, alegando “honra pessoal” e prestigio à presença da maior autoridade militar do país.
Pazuello foi pressionado a solicitar transferência para a reserva, pois, assim, poderia se candidatar a cargos eletivos e participar de eventos políticos, sem envolver a imagem das Forças Armadas. No entanto, disse a interlocutores que só pretende deixar o serviço ativo em 2022, pois isso o deixaria vulnerável para enfrentar a CPI da Covid — correndo o risco de ter a prisão decretada por perjúrio no novo depoimento que prestará aos senadores.
Presidente assegura que ato não foi político
Jair Bolsonaro saiu em defesa do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello por conta da participação do general no ato do último domingo pró-governo, organizado por apoiadores do chefe do Executivo. Segundo o presidente, o evento “não teve nenhum viés político”.
Por conta da presença na manifestação, Pazuello responde a um processo administrativo dentro do Exército. Isso porque o Estatuto Militar e o Código Disciplinar do Exército proíbem que integrantes da Força participem de manifestações políticas.
Em live na noite de ontem, Bolsonaro tentou eximir Pazuello de qualquer culpa. “Foi um encontro que não teve nenhum viés político. Até porque eu não estou filiado a partido político nenhum ainda. Foi um movimento pela liberdade, pela democracia e de apoio ao presidente”, disse.
O presidente tem agido para evitar qualquer tipo de punição mais severa ao general. Ontem, Bolsonaro viajou para São Gabriel da Cachoeira (AM), onde se encontrou com o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, e com o comandante do Exército, general Paulo Sérgio Nogueira, para negociar qual deve ser a reação contra o ex-ministro da Saúde.
No início da semana, Bolsonaro proibiu o Exército e o Ministério da Defesa de se posicionarem em relação a Pazuello. A Arma e a pasta emitiriam um comunicado oficial para explicar o início do processo administrativo contra o general, mas foram desautorizadas pelo presidente.
Apesar da participação pessoal de Bolsonaro na busca por uma solução, o general Paulo Sérgio já avisou que a decisão do Exército não será influenciada por pressões externas. Militares esperam uma punição a Pazuello por entenderem que essa decisão impedirá que episódios semelhantes aconteçam no futuro e manchem a imagem das Forças Armadas.
Provocação
Antes da live, Bolsonaro postou um vídeo nas redes sociais de um discurso que fez na Guarnição Militar do município amazonense, convocando militares a atuarem, caso haja necessidade, para não permitir que governadores e prefeitos adotem políticas restritivas como forma de tentar evitar a proliferação da covid-19.
Segundo o presidente, “em qualquer país do mundo” apenas as Forças Armadas “é que decidem como aquele povo vai viver”. Bolsonaro comentou que espera não ter que recorrer aos militares para impedir a adoção das políticas de isolamento. Contudo, se for preciso, Bolsonaro pediu aos militares que cumpram com o dever de garantir a liberdade da população.
“O que nós queremos? Queremos paz, queremos progresso e, acima de tudo, liberdade. E a gente sabe que esse último desejo passa por vocês. Mais do que a obrigação, tem o dever. Tenho certeza que vocês agirão dentro das quatro linhas da Constituição, se necessário for. Espero que não seja necessário, que a gente parta para a normalidade. Não estamos nela ainda, estamos longe dela”, afirmou. (AF)