Miguel Lucena*
Ao ouvir, na Bandnews, comentário sobre as obras do Canal do Sertão, em Alagoas, reforcei a convicção de que o Brasil não dará certo sem reformas profundas na política, na burocracia do Estado e nos costumes.
As obras, divididas em cinco trechos, totalizando 200 quilômetros, começaram em 1992. O primeiro trecho, de 65 km, ficou a cargo da empreiteira Queiroz Galvão, que demorou 20 anos para concluí-lo, ao custo de R$ 3 bilhões, R$ 2 bilhões a mais do que o previsto. A OAS pegou o segundo trecho, de 25 Km, em 2013, e só foi terminar em 2017. O terceiro, para completar 100 Km, está com a Odebrecht, que não recebe pagamento desde março, está demitindo os trabalhadores e ameaçando paralisar a obra.
Ainda nem concluíram metade da obra e preveem gastos de R$ 2,5 bilhões para os 100 Km restantes. Ora, se a primeira era para ser concluída com R$ 1 bilhão e só o foi com R$ 3 bilhões, imagine a segunda, que começará com mais de 200% de diferença.
A Polícia Federal mostrou, em operação realizada para investigar a obra interminável, que um governador de Alagoas recebeu mais de R$ 2 milhões em propina. Ele tinha o apelido de Bobo. Imagine se fosse esperto!
Vinte anos de desperdício e roubo do dinheiro do povo, sem que os órgãos de controle adotassem providências. Um Estado-monstro para nada, rodando como cachorro atrás do próprio rabo, um fim em si mesmo, mais um aparato para torrar o fruto do suor de todos, ocupando-se em economizar cafezinho e palito, enquanto as traças passeiam livres, destruindo os esforços da sociedade.
Ou o Brasil muda, moralizando a política, reduzindo esse aparato estatal ineficiente e melhorando a burocracia exagerada que só serve para justificar propinas, ou desceremos ladeira abaixo, em um caminho desastroso e sem volta.
*Miguel Lucena é Delegado de Polícia do Distrito Federal, jornalista e escritor