O CE. Stella dos Cherubins de Planaltina contabilize um número maior de aprovação se forem incluídos os estudantes que passaram em universidades particulares. Um total de 36 alunos. Esse número pode aumentar com a divulgação da lista do Enem
(crédito: Foto: Ed Alves/CB/DA.Press)
Mais um exemplo de estudantes de baixa renda oriundo de escola públicaque conquistaram disputadas vagas em universidades do DF vem de Planaltina, onde quase 40% da população não completou o ensino fundamental, de acordo com pesquisa recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Lá, 36 estudantes do Centro Educacional Stella dos Cherubins Guimarães Trois, comemoram a aprovação em universidades do DF, 26 na Universidade de Brasília (UnB).
Fruto de muito empenho e persistência ao longo dos três anos do ensino médio, a aprovação para os alunos daquela unidade de ensino representa a realização de um sonho e a vitória da periferia. Até o momento, foram 36 aprovados, 26 na UnB. A expectativa é de que o número aumente com a divulgação do resultado do Enem, em 13 de fevereiro, e o anúncio das demais chamadas de aprovados na UnB.
O caminho percorrido pelos alunos até a aprovação, no entanto, não foi nada fácil. Os estudantes precisaram passar pelo ensino remoto nos dois primeiros anos, devido à pandemia de covid-19, o que, segundo eles, foi um grande fator de desmotivação. Os alunos também contam que existe muita insegurança pelo fato de serem da rede pública de ensino. “Essa aprovação é importante porque, veremos, no futuro, grandes profissionais oriundos de escola pública formados pela UnB”, diz Adriana dos Santos, 18 anos, aprovada em administração pelo Programa de Avaliação Seriada (PAS) e pelo vestibular tradicional da UnB.
O estudante Paulo Henrique Rodrigues Barreto, 17, aprovado em Letras (língua portuguesa e respectiva literatura), estudava na escola em período integral. Ele lembra que, mesmo sendo liberados mais cedo, os alunos permaneciam no colégio para reforçar os estudos. Aos sábados, os professores utilizavam as aulas destinadas à reposição do ano letivo para promover intensivo de conteúdos preparatório para os vestibulares.
União que faz a força
Amigos desde o ensino fundamental, os alunos foram aprovados juntos na UnB e destacam que a conquista se deu, em grande parte, pela rede de apoio criada entre eles e a equipe de professores, coordenadores e o gestor da escola, professor Adimário Rocha Barreto.
Os estudantes criaram grupos de estudo para se prepararem para as provas de ingresso na universidade, facilitando, assim, o processo de aprendizado. Nos grupos, eles compartilhavam entre si materiais de apoio e estudavam de forma coletiva. Além disso, contavam com a ajuda do corpo discente. “Os professores imprimiam apostilas e distribuíam entre nós. Eu aproveitava todo aquele material ao máximo”, frisa Paulo. Os alunos contam, ainda, que chegavam a recapitular as matérias a noite inteira, por meio de videochamadas.
Durante as aulas, os professores trabalhavam as obras textuais, musicais e visuais com os alunos e ofereciam suporte para correção de redações. “Além de todo esse apoio que os professores nos deram em questão de conteúdo, eles nos apoiavam e nos incentivavam. O professor que vê potencialidade no aluno, que fala ‘vai, você vai conseguir’, faz total diferença. Isso ajuda a mudar a vida da gente. Por isso somos tão gratos e defendemos que eles sejam valorizados”, reforça Rafaela Ferreira.
Burocracia x isenção
Os alunos destacam que outra grande dificuldade enfrentada foi a obtenção da isenção de taxa das provas, direito previsto em edital para candidatos de escola pública e baixa renda. O processo, no entanto, é burocrático, e muitos não conseguem obter esse direito. Eles apontam que o problema não é novo e que a UnB precisa resolver a questão para que o acesso dos estudantes pobres à universidade seja mais eficiente e democrático.
Aprovada em enfermagem também pelo PAS e pelo vestibular tradicional da UnB, Rafaela Ferreira, 17, conta que teve dificuldade para fazer as provas por motivos financeiros. “Minha isenção de taxa foi negada pela banca. Só consegui fazer o vestibular porque os professores e coordenadores se juntaram para entrar com uma ação judicial contra o Cebraspe, que organiza o concurso”, afirma a estudante.
A campanha de ajuda à estudante foi encabeçada pela professora de sociologia e atual coordenadora pedagógica, Luiza Oliveira, 33, que acompanha as inscrições dos alunos desde o primeiro ano do ensino médio. Ela destaca que a ação foi uma verdadeira “operação de guerra”. O intuito era pagar a inscrição de todos os alunos que tiveram a isenção negada, 15 ao todo.
Potência
Terceira de cinco filhos a ingressar na UnB, Rafaela Ferreira Gonçalves, 17, reforça que conquistar a aprovação na principal universidade do DF foi um desafio. Oriunda de família de baixa renda — mãe doméstica e o pai técnico em manutenção de ar-condicionado —, Rafaela sempre estudou em escola pública e realizou seu grande sonho: seguir a carreira de enfermagem. “Praticamente metade do meu ensino médio foi remoto, devido à pandemia. Estudar para as provas à distância foi muito desafiador, uma vez que a infraestrutura da rede pública não é boa”, conta.
A jovem conta que a solução que encontrou foi estudar por meio de plataformas on-line. Ela destaca que ao retornar às aulas no formato presencial, já na metade do segundo ano do ensino médio, a ajuda dos professores e dos coordenadores foi essencial para que continuasse firme no propósito da aprovação. “Fiquei muito doente no início do terceiro ano, mas encontrei muito apoio na minha família e nos professores”, diz.
Rafaela escolheu a profissão porque admira a área da saúde, que diz ser fundamental para a sociedade. Muito feliz com o resultado, ela está agora ansiosa para o início das aulas. “Espero aproveitar os recursos da universidade e o que ela tem a me oferecer”, conclui.
“Fazer a diferença”
Oriunda de família de baixa renda, Adriana dos Santos, 18, foi aprovada em administração na UnB pelos dois programas de ingresso, tanto pelo vestibular quanto pelo PAS, estudando por conta própria. Para ajudar a mãe, que é empregada doméstica, a complementar a renda do lar, ela começou a trabalhar logo que concluiu o ensino médio.
Assim como seus colegas de turma, ela também teve dificuldade para se adaptar ao modelo de ensino a distância imposto pela pandemia. “Só comecei a criar uma rotina de estudos sólida no 3° ano e, nesse período, os professores foram essenciais. Como estudava no ensino integral, era o dia todo resolvendo questões. Algumas plataformas on-line também me ajudaram bastante”, detalha.
Fonte: Correio Braziliense*