Maria José Rocha Lima*
Hoje é o aniversário do meu primo Avelivaldo Modesto, carinhosamente o chamamos de Verinho. Guardo tão forte na memória a voz do meu primo, chamando a minha mãe de titia. Este forma de chamar minha mãe era muito reconfortante, dava sentido à família, pelo lado do pai, que se separara da mãe. Era o sobrinho do meu pai e que quase sempre ia acompanhado da sua, nossa, querida Tia Mundinha, irmã do meu pai. Que incrível o sentimento que me alcança até hoje. Aquelas visitas de meu primo à nossa casa no Adro do Senhor do Bonfim eram balsâmicas. Ele nos alegrava cantando no seu violão, muitas vezes a canção Chove Chuva, como lembrou a minha irmã Sueli. A minha mãe, além de separada, tinha um forte sentimento de orfandade. Perdera o pai e a mãe, no mesmo ano, quando tinha apenas 11 anos. Ainda bem que para Verinho e Tia Mundinha o amor não era líquido. O amor familiar, especialmente para Verinho, é sólido, amoroso e mantido, mesmo à distância. A família para ele é uma instituição humana importantíssima, na qual são desenvolvidas as relações de afeto, cuidado de si e dos outros, hospitalidade, comunicação, núcleos importantes para a organização social.
O filósofo Zygmunt Bauman (1927), em “Liquid Love”, Amor Líquido, explora as repercussões dessas relações líquidas, “quando o indivíduo se vê diante de um dilema terrível: de um lado, ele precisa dos outros como do ar que respira, mas, ao mesmo tempo, ele tem medo de desenvolver relacionamentos mais profundos, que o imobilizem num mundo em permanente movimento”. Para Bauman, “ser um pós-modernista significa ter uma ideologia, uma percepção do mundo, uma determinada hierarquia de valores que, entre outras coisas, descarta a idéia de um tipo de regulamentação normativa da comunidade humana e assume que todos os tipos de vida humana se equivalem, que todas as sociedades são igualmente boas ou más; enfim, uma ideologia que se recusa a fazer julgamentos e a debater seriamente questões relativas a modos de vida viciosos e virtuosos, pois, no limite, acredita que não há nada a ser debatido. Isso é pós-modernismo. É nesse sentido que pós-modernidade é, para mim, modernidade sem ilusões”. Ainda para o sociólogo, diferentemente da sociedade moderna anterior, a que ele caracterizava como modernidade sólida, a de agora não o faz com uma perspectiva de longa duração, com a intenção de torná-la melhor e novamente sólida. Tudo está agora sempre a ser permanentemente desmontado, mas sem perspectiva de nenhuma permanência. Tudo é temporário.
A metáfora da “liquidez” para caracterizar o estado da sociedade moderna, para Bauman, é como os líquidos, pela sua incapacidade de manter a forma. Para o autor “as instituições, quadros de referência, estilos de vida, crenças e convicções mudam antes que tenham tempo de se solidificar em costumes, hábitos e verdades “auto-evidentes”.
Quebrar “tabu” virou virtude, essas pessoas que são contra a família estão na mais alta conta e pouco estão se incomodando com a sociedade, com as formas de barbarismo que possam advir dessas hostilidades às regras sociais. Família é coisa boa, ainda não inventaram nada melhor para substituí-la.