Maria José Rocha Lima*
No dia 16 de novembro, houve eleição para a diretoria da Associação Brasileira de Estudos e Pesquisas em Psicanálise – ABEPP -, sendo reeleita à Presidência a psicanalista Maria Elena Rodrigues da Silva. Os demais diretores são Josival Bezerra Barreto (Jurídico) e Maria das Graças Lopes Barbosa (Diretoria Acadêmica). Dois novos dirigentes foram eleitos: Arthur Manoel Cavalcante de Souza (Diretoria Financeira) e Maria José Rocha Lima (autora deste texto), para a Diretoria administrativa.
Durante a assembleia online, houve o reconhecimento da atuação dos diretores psicanalistas Lúcia Helena Alves, Emerson Odilon Sandim, Leyla Maryan, Josival Bezerra Barreto e Maria das Graças Barbosa e declaração de confiança à presidente da ABEPP, Maria Elena Rodrigues da Silva, pela dedicação exclusiva ao trabalho que, em união com os seus pares, garantiu a formação de dez turmas de psicanalistas, a partir de um currículo e práticas admiráveis.
Durante a reunião, ocorreu um fenômeno psicanalítico singular: a instalação online de um “Setting analítico”. As “falas livres” me remeteram a uma relação entre Psicanálise e filosofias helênicas, particularmente o estoicismo, sobre a qual venho me interessando, não apenas pela leitura, mas a partir das aulas extraordinárias divulgadas pela Organização Internacional Nova Acrópole.
Nos depoimentos dos psicanalistas formados pela ABEPP, nos dezesseis anos de existência, eram apresentadas evidências, resultados positivos e transformadores de suas existências que mais aproximavam a Psicanálise das práticas filosóficas.
A Psicanálise é a prática, de nenhuma forma convencional, que surgiu no século XX e, mesmo sem ser concebida como uma prática filosófica, parece ter ocupado a função objetiva perdida pela Filosofia. A filosofia, na época helenística e romana, se apresentava como uma arte de viver. Desde Sócrates, a filosofia antiga tinha essa qualidade de promover um estilo de vida socrático, e o diálogo socrático provocava no interlocutor um questionamento, especialmente sobre o cuidado de si, o fazer de sua alma, a mais sábia que pudesse.
Os psicanalistas formados pela entidade declaravam o seu encontro com a Psicanálise como decisivo na transformação de suas vidas. E esses relatos me fizeram viajar nos princípios do estoicismo, que tem “no exercício da análise metódica dos desejos e das paixões a forma de um homem estóico se tornar consciente dos sofrimentos da alma”.
O imperador Marco Aurélio, na sua obra intitulada Meditações, sugeria que se cumprisse uma descrição “física” (ou “linguística”) dos objetos que causam ansiedade. Para ele, era preciso todo o esforço possível para nomear e descrever, com o máximo de precisão, os desejos e os males da alma. E deste modo promover a vigilância sobre suas ações através de descrições precisas. O imperador ensinava que refinando (elaborando) seus juízos morais o homem se preparava para as situações adversas e para o combate ético.
Essa lição da filosofia antiga era um convite a cada homem para se transformar. Para os estoicos, a filosofia era conversão, transformação da maneira de ser e da maneira de viver, de busca da sabedoria.
A própria presidente Maria Elena, após aposentadoria do Banco do Brasil, fez o Curso de Formação, participou da Fundação da ABEPP, já formou dez turmas de psicanalistas, com muito sucesso; o psicanalista Emerson Odilon Sandim, ex- Procurador do Mato Grosso, após ser acometido por uma doença que o tornou deficiente visual, fez o curso de psicanálise, atualmente é professor da Universidade de Uberlândia, tendo criado a Disciplina Direito e Psicanálise, com repercussões nacionais. A nossa colega Márcia Lucindo Lages, depois de muitos anos no magistério, confessa que foi fazer o curso apenas para o seu autoconhecimento, encontrou um enorme prazer no estudo da psicanálise e é hoje uma especialista em Constelações Familiares. A psicanalista Germana Miranda Carsten, depois de anos no serviço público, encontrou grande satisfação na clínica psicanalítica.
E eu fiz o curso de formação e, após análise com Maria Elena, desatei um dos nós existenciais, recuperando parte importante da minha história, refundando em Brasília a tão bem-sucedida Casa da Educação Anísio Teixeira, que havia deixado para trás, na Bahia. Hoje a casa realiza vários projetos de sucesso, como o Curta Maria. Também falaram das suas alegrias e beneficiamentos Tércia Ataíde França Teles, Miriam Bastos Tavares e Leila Maria Martins dos Santos.
Isso põe em discussão a crença de que a Psicanálise é um método de psicologia “meramente especulativo”, quase sempre descrito como “psicologia profunda”, que exige longos prazos de tratamento, confluindo para conclusões de alguns audaciosos, que afirmam que não produz “cura”. Talvez o próprio Sigmund Freud (1856-1939) tenha levantado a lebre ao afirmar, a partir de 1920, o ego como veículo da cura, descrito como aquele que controlará os conflitos do aparelho psíquico. Outras vezes, insistindo na insuficiência egóica para resolver conflitos, como no sadismo, no masoquismo, na agressividade e na pulsão de morte como obstáculos à cura.
O que o fundador da Psicanálise nos legou, mesmo, foi a herança de uma relevante e profunda discussão sobre a noção de cura em Psicanálise. Tarefa que desafia os psicanalistas e as práticas contemporâneas.
*Maria José Rocha Lima mestre e doutoranda em educação. Foi deputada de 1991 a 1999. É presidente da Casa da Educação Anísio Teixeira. Psicanalista e dirigente da Associação de Estudos e Pesquisas em Psicanálise –ABEPP