Centro de Artes da UFF homenageia, na próxima semana, o escritor russo que mergulhou na alma humana. Com conferências e leituras dramáticas, o evento contará com a presença de importantes artistas, tradutores e críticos literários
De 8 a 12 de novembro de 2021, o Centro de Artes da Universidade Federal Fluminense vai celebrar os 200 anos de nascimento do escritor russo Fiódor Dostoiévski (1821-1881), autor de obras clássicas da literatura mundial, como Crime e Castigo, O Idiota, Os Demônios, Os Irmãos Karamázov, e outras. Com o projeto 200 Dostoiévski, fruto de uma vasta pesquisa curatorial, o Centro de Artes UFF reunirá em livese vídeos gravados no seu canal do YouTube artistas e pesquisadores que trabalham temáticas pertinentes à escrita do autor. Dentre os convidados, os atores Matheus Nachtergaele, Bel Kutner e Celso Frateschi apresentarão performances, leituras dramatizadas e exercícios artísticos inspirados na escrita dostoiévskiana.
Além de ter a participação de representantes diplomáticos (adido cultural e embaixador da Federação da Rússia), que abordarão aspectos históricos e culturais da terra natal do grande escritor, o projeto 200 Dostoiévski trará para a conferência de abertura o tradutor, crítico literário e professor da UFF Paulo Bezerra, com o tema “20 anos com Dostoiévski”. Tradutor de mais de 50 obras do russo para o português, Bezerra narrará sua experiência de duas décadas como intérprete da literatura de Fiódor Dostoiévski e profundo conhecedor de suas narrativas e personagens.
A programação principal também se estrutura em apresentações musicais, círculos de diálogos sobre o autor e exposição virtual. Na programação musical em homenagem à cultura russa, o Quarteto de Cordas da UFF trará a obra de Alexandr Borodin (1833-1887), com a execução do Quarteto de cordas n° 2 em Ré Maior, 3º movimento (Notturno: Andante). Já a Orquestra Sinfônica Nacional UFF apresentará a Serenata para cordas, Op. 48, 3º movimento (Élégie: Larghetto elegiaco) de Tchaikovsky (1840-1894).
Os círculos dialógicos serão o eixo das discussões do evento, com temáticas fundamentais ligadas às próprias obras, como o inconsciente, o sonho, a teodiceia e a polifonia, esta última amparada nos romances polifônicos de Dostoiévski, bem como na abordagem do filósofo russo Mikhail Bakhtin (1895-1975), que abriu chaves interpretativas para a compreensão ampliada dessas obras.
O professor Leonardo Guelman, superintendente do Centro de Artes UFF, que assina a direção curatorial do projeto 200 Dostoiévski, explica que a singularidade de Dostoiévski reside na forma como expressa as múltiplas vozes de seus personagens, uma vez que ele não traz a visão de um único narrador, ou dele mesmo como autor, mas apresenta o protagonismo do outro como ampla dimensão da alteridade. “É uma obra pluridimensional e polifônica, que podemos relacionar na contemporaneidade com os mais inusitados lugares de fala, de vida e expressão.”
Para o reitor da UFF, Antonio Claudio Lucas da Nóbrega, celebrar o alcance da obra de Dostoiévski, no marco de seus duzentos anos, “reveste-se de grande importância no quadro da pesquisa e da internacionalização da universidade, ao enfocar o caráter transversal da obra do autor russo, conjugando as ciências sociais, a economia e a psicologia, dentre outras áreas, sob a lente da arte, no seu poder sempre atual de revelar as contradições da realidade e os dilemas do humano.”
Projeto 200 Dostoiévski reafirma a força da escrita do autor
Nascido em Moscou em 11 de novembro de 1821, Fiódor Dostoiévski cursou a Escola de Engenharia Militar no ano de 1837, em São Petersburgo, cidade em que viveu até a sua morte, em 1881. Em 1846, publica Gente Pobre, sua primeira novela, O Duplo e Noites Brancas(1847).
Após ser condenado à morte por integrar um grupo revolucionário, tendo à última hora a pena comutada para prisão na Sibéria, onde ficou por dez anos em regime de trabalhos forçados na companhia dos mais diversos criminosos, Dostoiévski é anistiado em 1859, e retorna a São Petersburgo, onde narra as suas duras experiências em Memórias da Casa Morta (1862) e depois Memórias do Subsolo (1864), cuja narrativa representa um divisor de águas na sua escrita.
Publica também o romance Humilhados e Ofendidos (1861), que se torna a porta de entrada para seus grandes romances, retratando a dura condição econômica e social de tipos oprimidos e a resistência à hipocrisia e falta de humanidade de seus opressores. “De alguma maneira, toda a produção dele, desde o primeiro livro, Gente Pobre, vai se construir sob esse olhar de empatia com as camadas mais excluídas. Ele era um grande intérprete da realidade, pois deixava que, pela ficção e a partir dos múltiplos olhares e vozes, a complexidade do mundo se revelasse para nós, leitores e pesquisadores dessas obras”, analisa o curador do projeto, Leonardo Guelman.
Dostoiévski transcende os limites literários ao abordar a pluralidade e a multiplicidade das questões culturais e a universalidade de temas comuns à sociedade, como a psicologia e o comportamento humano, a razão e a loucura, a religião, a política e a moral. Através da observação e representação da humanidade das pessoas e da sociedade de sua época, o autor desenvolveu personagens tangivelmente reais, cujos profundos e complexos mergulhos em suas mentes foram retratados de forma minuciosa e poética. Os dilemas humanos universais presentes em sua obra consolidaram sua vasta criação como um clássico imprescindível da literatura mundial, influenciando muitos escritores e artistas não somente na Rússia, mas em todo mundo, inclusive no Brasil.
Ele é também o autor de Um Jogador(1867), O Eterno Marido (1870), Crime e Castigo (1866), O Idiota (1869), OsDemônios (1872), O Adolescente (1875), e o outro clássico Os Irmãos Karamázov (1880).
Mais que um tributo ou uma homenagem, revisitar a obra de Dostoiévski em 2021 é atender a uma reflexão necessária e atual, pois além de ampliar nosso horizonte de perspectiva em meio a uma sociedade tão conturbada, estabelece um diálogo permanente com essas questões universais no que se refere à humanidade.
Fonte: Blog da Redação*