
Maria José Rocha Lima[1]
Em 1991, no exercício do mandato de deputada na Assembleia Legislativa da Bahia, tive a imensa honra de agraciar o líder negro Nelson Mandela, então presidente da África do Sul, com a Medalha Libertadores da Humanidade, em reconhecimento à sua luta pelo fim do regime segregacionista do apartheid. Também tive aprovado o Projeto de Resolução que instituiu a obrigatoriedade da celebração do Dia da Consciência Negra no âmbito da Assembleia Legislativa da Bahia.
Antes disso, em 1989, quando presidi a Associação dos Professores Licenciados da Bahia (APLB) — que mais tarde se tornaria o Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Bahia —, lideramos, em parceria com o Grupo Cultural Olodum, uma das maiores mobilizações cívicas da história baiana: conseguimos mais de 2 milhões de assinaturas para incluir o Capítulo do Negro na Constituição do Estado da Bahia. Uma conquista histórica que marcou definitivamente o reconhecimento da luta, da memória e da dignidade do povo negro em nosso Estado.
Também promovemos pela primeira vez apresentações de Grupos Afro no Plenário da Assembleia Legislativa da Bahia, entre eles o Olodum Mirim e o Grupo Didá de Mulheres Negras. Tudo era muito difícil, mas hoje vejo que, juntos, abrimos picadas e sopramos esperanças que fortaleceram professores, estudantes, artistas, intelectuais, músicos e compositores — pessoas que hoje tanto nos orgulham.
Este ano destacamos Rui Poeta, que, em parceria com Miguel Lucena, conquistou o 1º lugar do Prêmio Ilê Aiyê 1998, além de ter sido finalista em 2007 e 2008; Reginaldo Dias, músico instrumentista; e Valmir Brito, cantor e compositor cuja carreira teve início em 1982 e que emplacou sucessos como Canto para o Senegal (com Itamar Tropicália, para a Banda Reflexus). Valmir Brito também foi diversas vezes premiado por composições que marcaram a música afrobaiana, entre elas:
Olodum Raça Negra (Valmir Brito e Gibi, 1987)
Violeiro Tocador (Valmir Brito, Jô Nascimento e Roberto Brito, 1996)
A Ver Navios (Valmir de Brito e Roque Carvalho, 1992)
Aos três, rendemos homenagem pelas obras que enaltecem nossa ancestralidade e nossa cultura.
Neste 20 de novembro de 2025, agradecemos especialmente a Rui Poeta, Prof. Reginaldo Dias e Valmir Brito, que nos brindaram com a composição:
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ACORDA… REAL
(mantido integral, conforme original)
Ninguém nasce racista… cresce aprendendo a ser.
Siga com atenção como a isto demover.
Invista em educação, reveja seus conceitos.
Respeite as leis de Deus e os nossos direitos.
Somos da raça humana, ditos seres racionais.
O racismo nos transforma em reles animais.
Existem anjos negros no céu? Sim. Multicoloridos.
No arco-íris da vida não cabe mais este castigo.
Você não nasceu racista, não.
Cresceu aprendendo a ser.
Se esconde entre piadas, maculando o bom viver.
Esse sentimento velado você não assume ter.
Cego, surdo e mudo, finge pra não transparecer.
Racismo eu não aceito.
Enfrento. Na alma dói.
Canto isto a você, mas o racismo dói em nós.
Racismo é uma doença, não faz bem para ninguém.
Respeite os meus ancestrais.
Se respeite também.
E lembre-se: o nosso sangue é da mesma cor: vermelhão.
Apartheid, não!
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[1] Professora Maria José Rocha Lima (Zezé) é mestre em Educação pela Universidade Federal da Bahia e doutora em Psicanálise. Presidente da Casa da Educação Anísio Teixeira. Foi deputada estadual de 1991 a 1999.

