Especialista em Direito Eleitoral discorda de cassação, mas vê dura lição para o ex-líder da Lava Jato
Deltan Dallagnol durante campanha pelo endurecimento da legislação anticorrupção, em 2016. Foto: Vladimir Platonow/Agência Brasil
Ao ser cassado por unanimidade no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na noite de ontem (16), o deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR) experimentou uma dura lição, pela aplicação do Direito que defendeu durante sua coordenação da Operação Lava Jato. Esta é a conclusão do jurista especialista em Direito Eleitoral, Adriano Soares da Costa, ao discordar da cassação sentenciada com base na tese de que o campeão de votos do Paraná buscou fugir da inelegibilidade, ao renunciar à carreira no Ministério Público Federal (MPF), e se antecipar à abertura de processo administrativo disciplinar (PAD).
“Deltan Dallagnol foi cassado pela aplicação do mesmo tipo de Direito que defendia: aquele que retira do acusado os meios equilibrados, justos e impostergáveis de defesa. É para proteger não o acusado, mas o cidadão honesto da persecução penal ou sancionatória abusiva que o sistema de garantias robusto deve existir e ser respeitado”, concluiu Soares, ao comentar no Twitter a cassação do parlamentar paranaense.
O autor da renomada obra Instituições de Direito Eleitoral, Adriano Soares ressalta que se insurgiu contra as “10 Medidas de Combate à Corrupção”, propostas durante o cerco da Lava Jato à criminalidade de colarinho branco. Foi contra, por entender que tais medidas encampadas por Dallagnol “erodiam o direito de defesa, transformavam o sistema acusatório em uma câmara de gás e serviam para esquentar provas obtidas por meios ilícitos, sempre para facilitar a condenação”.
“Naquela época áurea da Operação Lava Jato eu chamava a atenção para os riscos dessas teses e, depois, para os abusos das 10 medidas de combate ao crime, que seriam usados para ceifar a liberdade e direitos de muita gente mediante procedimentos abusivos. A semente plantada está aí hoje: não faltam abusos, provas obtidas de forma ilícita sendo aproveitadas, o desprezo pela ampla defesa, a destruição de garantias individuais… Tudo isso em favor de beneficiar os que eram os inimigos da Lava Jato”, argumentou o jurista alagoano.
Lição em silêncio
A cassação unânime do registro de candidatura de Deltan Dallagnol ocorreu, sem debate entre ministros, pela a aplicação das leis da Ficha Limpa e da Inelegibilidade, com base na hipótese de que teria pedido exoneração do cargo para fugir da inelegibilidade. Enredo que Soares afirma trazer uma dura lição para quem despreza garantias individuais e direitos fundamentais como: ampla defesa, o contraditório, a paridade de armas, a imparcialidade judicial.
O jurista observa que a tese central para aplicação da inelegibilidade foge do âmbito de incidência da própria norma, que exige tenha sido aberto o processo administrativo disciplinar (PAD) contra quem pediu exoneração do cargo. E cita que o ministro relator, Benedito Gonçalves, conclui ter havido fraude à lei, baseando-se numa “suposta intenção de ter Deltan buscado deliberadamente se furtar da inelegibilidade”.
“Quando a lei criou a hipótese de inelegibilidade para aquele que pede exoneração apenas com o PAD instaurado, estabeleceu uma clara descrição da conduta ilícita, inclusiva no âmbito da incidência da norma; ao mesmo tempo, também delimitou um âmbito claro de exclusão da sua incidência: sem PAD, sem inelegibilidade”, pontua Adriano Soares.
O especialista e Direito Eleitoral afirma que o TSE aplicou uma interpretação nova e extensiva, para cassar Deltan, de que caberia à Justiça Eleitoral analisar a intenção daquele que pediu exoneração do cargo antes do possível PAD. “E essa hipótese não é abarcada pela lei que criou a sanção”, ressalta.
Adriano Soares salienta o silêncio e a velocidade da votação da matéria, em um minuto e seis segundos para a resposta unânime a um caso que seria, no mínimo, controvertido. “Houve o silêncio obsequioso de concordância e a cassação do registro de candidatura com a proclamação da perda do mandato. Não apenas não houve divergência como sequer houve votos expressos”, destacou o jurista, ao comentar reportagem do Estadão, no Twitter.
Futuro distópico
Soares afirma que o cerco à corrupção liderado por Dallagnol e julgado pelo ex-juiz e senador Sérgio Moro (União-PR), na Lava Jato, teve um fim pior que o da Operação Mãos Limpas, contra a máfia italiana da década de 1990. E mencionou a célebre apresentação de PowerPoint, quando o atual presidente da República, Lula (PT), foi apontado como principal beneficiário do esquema bilionário de corrupção que foi desbaratado em 2016.
“Os que eram temidos e afagados pela imprensa são atacados com ódio que apenas a militância ideológica e a abstinência financeira explicam. Olhando para o dia da apresentação do seu PowerPoint (15.09.2016), era para ele e muitos brasileiros impensável o futuro distópico em que tudo se transformou”, lamenta.
Fonte: Diário do Poder*