O texto também traz recados não explícitos ao boicote imposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, como trechos em defesa do multilateralismo, critica a falta de cumprimendo de acordos

FOLHAPRESS
A presidência brasileira da COP30, a conferência sobre mudança climática das Nações Unidas, publicou nesta terça-feira (18) o primeiro rascunho da decisão que deve tratar dos temas mais polêmicos da negociação financiamento, metas ambiciosas, medidas unilaterais de comércio e transparência.
No documento, que ainda pode ser alterado e será debatido entre os países, foi incluído o mapa do caminho para reduzir a dependência dos combustíveis fósseis, proposta idealizada pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e impulsionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O texto também traz recados não explícitos ao boicote imposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, como trechos em defesa do multilateralismo, critica a falta de cumprimendo de acordos.
O documento faz menções ainda à importância do engajamento de entidades subnacionais (como governos estaduais e municipais) e do setor privado.
O primeiro rascunho do que foi batizado de “decisão mutirão” ainda traz uma série de pontos colocados como opções, ou seja, mais de uma alternativa para um mesmo parágrafo.
O documento cobra a mobilização de mais recursos, tem menções ao debate de gênero tema sensível a alguns países e ressalta a importância das populações afrodescendentes no combate à mudança climática, grupo que até aqui jamais foi contemplado em nenhum documento oficial das conferências sobre este tema.
A partir de agora, os países vão se debruçar sobre esta versão do texto para tentar chegar a um consenso sobre ele, e tudo ainda pode ser alterado.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, tratar dos quatro pontos mais polêmicos da diplomacia climática em forma de pacote foi uma estratégia da presidência brasileira da COP30 para tentar destravar as negociações que, isoladamente, não saíam deste impasse.
Divergências sobre estes itens financiamento dos países ricos para os em desenvolvimento, metas climáticas mais ambiciosas, medidas comerciais unilaterais e relatórios de transparência travaram todas as últimas conferências sobre a natureza.
Uma das primeiras grandes vitórias do Brasil na atual conferência foi conseguir que as negociações não fossem barradas logo na largada, o que tinha acontecido em reuniões preparatórias.
Toda COP tem, por regra, uma agenda prevista com antecedência. No primeiro dia oficial do evento, os países podem demandar acrescentar ou excluir novos itens dessa pauta, e a lista final precisa ser acordada por consenso total a negociação mesmo só começa depois disso.
O que acontece é que algumas nações aproveitam esse momento para fazer suas reivindicações e, até que sejam atendidas, travam essa aprovação e as tratativas. Foi o que aconteceu nas reuniões preparatórias de Belém.
Para evitar isso, a presidência selecionou temas que costumam causar enorme divergência e, em vez de debatê-los dentro dos itens de negociação formal, os deixou em consultas paralelas entre os países, para tentar chegar a uma decisão.
A estratégia da presidência da COP foi unir esses quatro itens das consultas também a itens relacionados que estavam dentro da agenda oficial.
Um desses é o que trata da transição justa, debate que inclui, por exemplo, a necessidade de garantir que as soluções climáticas não beneficiem apenas as populações mais ricas.
É justamente neste trecho em que a presidência incluiu a possibilidade do mapa do caminho contra o petróleo, impulsionado por Lula. O texto traz três opções de redação, uma mais genérica que fala sobre soluções de baixo carbono e outra de “no text” o que quer dizer que há integrantes que são contra este item em geral.
Numa outra possibilidade, o documento “decide criar uma mesa ministerial de alto nível […] para ajudar países a desenvolver mapas do caminho justos, ordenados e equitativos, inclusive para progressivamente superar a dependência dos combustíveis fóssseis e na direção de eliminar e reverter o desmatamento”.
O rascunho fala em “compromisso com o multilateralismo” e “resolve permanecer unido na busca de esforços para alcançar o propósito e os objetivos de longo prazo” do Acordo de Paris justamente o tratado do qual Trump primeiro resolveu se retirar quando voltou à Casa Branca.
E “reitera o importante papel e ativo engajamento de não membros, particularmente da sociedade civil, empresarial, instituições financeiras, cidades e autoridades subnacionais”, grupos que em especial nos EUA tem se destacado na tentativa de mobilizar contra a política negacionista do presidente.
Nas últimas conferências, o financiamento climático foi a principal trava do debate, diante da resistência dos países ricos em cumprir com sua obrigação de mobilizar e direcionar recursos para as nações em desenvolvimento.
O rascunho também enfatiza o financiamento, com diversos trechos cobrando mais dinheiro para medidas de combate à crise climática.
O texto “reafirma” que os países desenvolvidos devem fornecer os recursos que ajudem as nações em desenvolvimento tanto a se adaptar como a mitigar as emissões de gases de efeito estufa.
Apesar disso, volta a usar a terminologia adotada no acordo da COP29, que foi duramente criticada pelos países mais pobres, ao dizer que os países ricos devem “apenas assumir a liderança” para prover o financiamento climático, que também deve vir de outras fontes.
Um dos parágrafos expressa justamente esse conflito, contendo duas opções de frase, dentro de colchetes: uma que reconhece que o acordo fechado no ano passado, de US$ 300 bilhões para ação climática, já “engloba o comprometimento dos países em desenvolvimento de continuar a apoiar os países em desenvolvimento”, enquanto a outra opção é que o acordo “deixa a desejar quanto a abordar adequadamente” o financiamento climático de fontes públicas.
O texto também traz diferentes modelos para ampliar o financiamento para a adaptação climática, indicando que o tema deve ser um dos destaques do acordo final da COP30, como previsto.

