O ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, cobrou nesta sexta-feira (12/11), em entrevista durante a COP26, que países ricos contribuam com mais dinheiro para financiar ações contra as mudanças climáticas em nações em desenvolvimento. Mas, ao ser perguntado sobre se o governo iniciou tratativas para destravar o Fundo Amazônia, ele disse que as negociações seguem paralisadas.
Abastecido principalmente pela Noruega (93,8%) e Alemanha (5,7%), o fundo conta atualmente com US$ 2,9 bilhões para ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento na Amazônia brasileira. Mas doadores suspenderam a aplicação do dinheiro em 2019, quando o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, tentou reduzir o papel da sociedade civil no conselho que administra os repasses.
Desde então, o governo não voltou atrás na decisão de Salles nem avançou numa negociação para destravar o fundo. Para observadores e ambientalistas, o Brasil precisaria retomar o funcionamento do Fundo Amazônia para ter credibilidade ao pedir novos recursos de nações desenvolvidas.
“O Brasil tem preocupação que o volume (de financiamento de países ricos a nações em desenvolvimento) chegue aos US$ 100 bilhões prometidos. Os países desenvolvidos pediram mais ambição aos países em desenvolvimento, mas não tiveram a mesma proporção na entrega dos US$ 100 bilhões de dólares”, disse Leite, em entrevista em Glasgow, na Escócia, onde ocorre a cúpula da ONU sobre clima.
“Em relação ao Fundo Amazônia esse assunto ainda está com o vice-presidente (Hamilton Mourão). As negociações do fundo ainda não estão em andamento. Assim que a gente tiver notícia a gente passa para vocês.”
Esta sexta-feira é o último dia das negociações da COP26. Representantes de quase 200 países estão reunidos para tentar chegar a uma decisão que ajude no cumprimento da meta do Acordo de Paris de limitar o aquecimento da Terra a 1,5°C até 2100.
Mas um impasse sobre financiamento pode levar as negociações a se arrastarem pelo fim de semana. Países em desenvolvimento acusam o rascunho do acordo final da cúpula, divulgado nesta sexta, de estar “desequilibrado”, já que não há avanço em valores devidos por países ricos a nações mais pobres.
De fato, nações ricas não cumpriram com os US$ 100 bilhões que prometeram pagar anualmente, em financiamento climático, entre 2020 e 2025. E países pobres e mais vulneráveis às mudanças climáticas precisam dos recursos.
Mas, segundo ambientalistas, o Brasil não está em boa posição para requisitar aumentos no financiamento, diante dos US$ 2,9 bilhões paralisados no Fundo Amazônia e os recordes em taxas de desmatamento.
“O que o Brasil mostra aqui realmente é descompassado com o que acontece domesticamente em casa”, disse à BBC News Brasil Fernanda Carvalho gerente de Política Global e Clima da WWF (World Wide Fund for Nature), uma das maiores ONGs ambientais do mundo.
“Para convencer, o governo precisa reverter a tendência de desmatamento, retomar o plano de combate ao desmatamento, prometer desmatamento zero, não só o fim do desmatamento ilegal e reabilitar o Fundo Amazônia”, listou.
Discurso x realidade
Durante a entrevista coletiva, o ministro do Meio Ambiente disse que o Brasil fez “movimentos importantes” no sentido de demonstrar disposição no combate às mudanças climáticas.
“Um dos desafios é financiamento (de países ricos), que deveria vir na mesma proporção que redução de emissões. A mitigação (do aquecimento global) tem que estar atrelada a incentivos robustos. O Brasil fez movimentos importantes e eles puderam ser reconhecidos durante a conferência”, disse Leite.
Ao longo da COP26, o Brasil assinou um acordo sobre proteção de florestas que prevê zerar o desmatamento no mundo até 2030. Também aderiu a um acordo para reduzir emissões de metano em 30% até 2030 – entendimento que afeta a agropecuária brasileira, já que bois emitem esse gás do efeito estufa pela fermentação gástrica durante sua digestão.
Paralelamente, anunciou que vai reduzir as emissões de gases do efeito estufa em 50% em 2030, na comparação com 2005, e alcançar a neutralidade de carbono até 2050 – quando as emissões são reduzidas ao máximo e as restantes são totalmente compensadas com reflorestamento ou tecnologia de captura de carbono da atmosfera.
Mas os compromissos foram recebidos com reserva por outros países e ambientalistas, diante da piora de todos os indicadores ambientais nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro.
Dados oficiais de desmatamento liberados nesta sexta-feira (12) enfraquecem o discurso de que o Brasil está comprometido em reduzir a destruição de florestas. Segundo o Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe), os alertas de áreas desmatadas na Amazônia Legal subiram 5% em outubro deste ano, na comparação com o mesmo mês de 2020.
Os dados mostram que 877 km² foram desmatados, um recorde da série histórica iniciada em 2016 para o mês de outubro. Perguntado se esses resultados não abalam a credibilidade do Brasil, o ministro respondeu:
“O desmatamento é um desafio brasileiro e global. Não estamos fugindo do desafio que o Brasil tem. Voltando a Brasília vou falar com ministro da justiça para entender esses números. Agora, estamos nas negociações e devemos pressionar os países ricos a se comprometerem com mais recursos.”