quarta-feira, 10/09/25
HomeMundoComo geração Z conseguiu derrubar premiê no Nepal

Como geração Z conseguiu derrubar premiê no Nepal

Protestos ficaram violentos depois de milhares de jovens marcharem contra o bloqueio de redes sociais no país

Manifestantes atearam fogo na sede do Parlamento nepalês – (crédito: EPA)

 


Por BBC

O primeiro-ministro do Nepal, KP Sharma Oli, renunciou após indignação pública generalizada provocada pela morte de 21 pessoas em confrontos entre a polícia e manifestantes anticorrupção.

Seu gabinete informou que ele deixou o cargo para abrir caminho para uma solução constitucional diante dos protestos em massa liderados por jovens, motivados por denúncias de corrupção e pela proibição de uso das redes sociais — que já foi revogada.

Os protestos se tornaram violentos quando milhares de pessoas, muitas delas se identificando como parte da geração Z — primeiros nativos digitais, nascidos entre 1995 e 2010 — tomaram as ruas de Kathmandu na segunda-feira (8/9).

Acredita-se que quase 200 pessoas tenham ficado feridas nos confrontos com a polícia, que usou gás lacrimogêneo, canhões de água e balas contra manifestantes que escalavam os muros do parlamento e outros prédios oficiais.

Os protestos continuaram nesta terça-feira (9/9), com manifestantes ateando fogo no parlamento e na casa do ex-primeiro-ministro Sher Bahadur Deuba, líder do Partido do Congresso Nepalês.

As casas de vários outros políticos também foram vandalizadas.

Confira o que se sabe até agora sobre os protestos:

Prédio pegando fogo e uma multidão do lado de fora

EPA
Manifestantes atearam fogo na sede do Parlamento nepalês

Proibição de redes sociais

As redes sociais são uma parte importante da vida no Nepal. O país tem uma das maiores taxas de uso per capita no sul da Ásia.

As manifestações foram desencadeadas após a decisão do governo, na semana passada, de proibir 26 plataformas de redes sociais — incluindo WhatsApp, Instagram e o Facebook.

O governo justificou a proibição como forma de enfrentar fake news, discurso de ódio e fraudes online.

Críticos acusaram o governo de tentar sufocar uma campanha anticorrupção com a proibição, que foi revogada na noite de segunda-feira.

Embora a proibição tenha sido o catalisador da atual onda de protestos, os manifestantes também estão expressando uma insatisfação mais profunda com as autoridades do país.

Objetos pegando fogo na rua e uma multidão logo atrás

AFP via Getty Images
Manifestantes começaram a atear fogo do lado de fora do parlamento

O que está acontecendo no Nepal?

Os protestos ficaram violentos em Kathmandu e em algumas outras cidades do Nepal.

Na segunda-feira, o ministro das Comunicações, Prithvi Subba, disse à BBC que a polícia teve que usar a força — incluindo canhões de água, cassetetes e balas de borracha.

Alguns manifestantes conseguiram ultrapassar o perímetro do prédio do parlamento em Kathmandu, o que levou a polícia a impor um toque de recolher ao redor de edifícios governamentais importantes e a reforçar a segurança.

Nesta terça-feira, a BBC recebeu relatos de atos de vandalismo e incêndios contra residências de vários políticos.

Vídeos postados nas redes sociais mostraram os danos na casa do primeiro-ministro KP Sharma Oli em Balakot, Baktapur.

Também houve relatos de que manifestantes atacaram as residências do presidente do Congresso Nepalês e do ex-primeiro-ministro Sher Bahadur Deuba, em Budhanilkantha.

Dentro do parlamento, foram registradas cenas de centenas de manifestantes dançando e gritando palavras de ordem, em volta de uma fogueira na entrada do prédio. Muitos carregavam bandeiras do Nepal.

Alguns chegaram a entrar no prédio, onde todas as janelas foram quebradas. Mensagens antigoverno foram pichadas na parte externa do edifício.

Muna Shreshta, 20 anos, estava entre a multidão do lado de fora do parlamento.

“A corrupção é um problema antigo”, disse à BBC, acrescentando que “já passou da hora da nossa nação, do nosso primeiro-ministro e qualquer pessoa no poder mudar, porque precisamos de mudança”.

“Isso aconteceu agora e estamos mais do que felizes de testemunhar e lutar por isso. Espero que essa mudança traga algo positivo para nós.”

Pessoas escalando uma grande

Getty Images
Protestantes ultrapassaram perímetro do parlamento e prédios do governo

Muitas das pessoas feridas foram levadas para hospitais locais, onde multidões se reuniram.

A BBC Nepal conversou com médicos que disseram ter tratado ferimentos por arma de fogo e balas de borracha.

A polícia disse que vários agentes também ficaram feridos, e que o número de vítimas pode aumentar.

Em meio ao caos, agentes penitenciários informaram que 900 detentos conseguiram escapar de duas prisões nos distritos ocidentais do Nepal.

O chefe do Exército do Nepal divulgou um comunicado na noite de terça-feira acusando os manifestantes de se aproveitaram da crise atual para danificar, saquear e incendiar propriedades públicas e privadas.

O comunicado afirmou que, se os protestos continuarem, “todas as instituições de segurança, incluindo o Exército do Nepal, estão comprometidas em assumir o controle da situação”.

Quem está protestando?

Mobilizado pelas redes sociais e liderado por jovens, este protesto é diferente de qualquer outro já visto no Nepal.

Os manifestantes se identificam como parte da geração Z, e o termo se tornou um símbolo da união em todo o movimento.

Embora não haja uma liderança centralizada, vários coletivos surgiram como força de mobilização, fazendo convocações e compartilhando atualizações online.

Estudantes de universidades das principais cidades do Nepal, como Kathmandu, Pokhara e Itahari, foram convidados a participar usando uniforme e levando seus livros, enquanto vídeos que circulam nas redes sociais mostram até crianças em idade escolar participando das marchas.

Multidão de pessoas em manifestação com cartazes e bandeiras do Nepal

Getty Images
Milhares de pessoas foram às ruas protestar após o governo suspender 26 plataformas de redes sociais

O que os manifestantes querem?

Em Kathmandu, o número de manifestantes tem crescido. Muitos carregam cartazes com frases pedindo por mudança.

As duas principais demandas são claras: a remoção da proibição de uso de redes sociais — que já foi feita — e o fim do que eles chamam de “práticas corruptas”.

Os manifestantes, muitos estudantes universitários, têm associado o bloqueio das redes sociais à restrição da liberdade de expressão e às denúncias de corrupção entre os políticos.

“Queremos ver o fim da corrupção no Nepal”, disse Binu KC, uma estudante de 19 anos.

“Os líderes prometem uma coisa durante as eleições, mas nunca cumprem. Eles são a causa de muitos problemas.”

Ela acrescentou que a proibição das redes sociais prejudicou seus estudos, limitando o acesso a aulas online e materiais.

Subhana Budhathoki, criadora de conteúdo, expressou sua frustração: “A geração Z não vai parar. Esse protesto é muito mais do que sobre redes sociais, é sobre silenciar nossas vozes, e não vamos deixar isso acontecer”.

Três jovens com um cartaz escrito

Getty Images
A geração Z protesta contra a corrupção e a proibição do uso de redes sociais

Como o estilo de vida dos ‘nepo babies’ está relacionado aos protestos?

Uma característica marcante desses protestos é o uso amplo de dois slogans: ‘nepo baby’ e ‘nepo kids’.

Esses dois termos ganharam popularidade nas redes sociais nas últimas semanas, depois que vários vídeos viralizaram mostrando os estilos de vida de políticos e suas famílias no Nepal.

Os manifestantes argumentam que essas pessoas desfrutam de sucesso e luxo sem mérito, vivendo à custa de dinheiro público enquanto pessoas comuns lutam para se sustentar.

Vídeos virais no TikTok e no Instagram mostram o contraste dos estilos de vida das famílias — envolvendo roupas de grife, viagens para fora do país e carros de luxo — com a realidade difícil enfrentada pelos jovens, como desemprego e migração forçada.

Os slogans se tornaram símbolo de uma frustração mais profunda com a desigualdade, à medida que os manifestantes comparam a vida da elite com a de cidadãos comuns.

Polícia se protegendo durante protesto

AFP via Getty Images
Cerca de 200 pessoas ficaram feridas em confrontos entre a polícia e manifestantes

O que esperar dos protestos

Os manifestantes não demonstram sinais de que vão recuar, e têm desafiado o toque de recolher por tempo indeterminado em Katmandu e outras regiões.

Nesta terça-feira, o primeiro-ministro renunciou, depois de outros três políticos do alto escalão anunciarem que estavam deixando o cargo.

Oli assumiu o cargo em julho de 2024, pela quarta vez, com apoio do Partido do Congresso Nepalês.

Não está claro quem irá substituir o primeiro ministro, ou o que acontecerá, já que aparentemente não há ninguém no comando.

Alguns líderes, incluindo ministros, relataram ter buscado refúgio junto às forças de segurança.

Os manifestantes pedem por responsabilização e reformas na governança.

Contudo, analistas afirmam que se o governo não se envolver de forma significativa, os protestos podem escalar, especialmente com a adesão de estudantes e grupos da sociedade civil.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

VEJA TAMBÉM

Comentar

Please enter your comment!
Please enter your name here

- Publicidade -spot_img

RECEBA NOSSA NEWSLETTER

Este campo é necessário

VEJA TAMBÉM