Maior incidência da infecção, que pode matar, está em São Sebastião, Sobradinho 2 e Vicente Pires. Plano Piloto é um dos locais com maior presença de larvas do mosquito transmissor
Mosquito Aedes aegypti, vetor da doença – (crédito: Reprodução )
O Distrito Federal tem registrado avanço preocupante no número de casos de dengue, infecção viral transmitida pelo mosquito Aedes aegypti. Em apenas um ano, os diagnósticos da doença subiram 548%. A Secretaria de Saúde do DF contabiliza os resultados por semana epidemiológica (SE), e os últimos dados apresentados pela pasta dizem respeito à SE 14, de 3 a 9 de abril, quando foram contabilizados 26.813 casos. No mesmo período de 2021, os resultados positivos ficaram em 4.137. A semana anterior de 2022 registrou 23.263 diagnósticos, contra 3.673 no mesmo intervalo do ano passado — aumento de 533%. Uma pessoa morreu.
A situação chamou a atenção de gestores públicos. O governador Ibaneis Rocha (MDB) comentou o avanço da doença, durante agenda, nessa terça-feira (26/4), no Hospital da Criança de Brasília José Alencar. “O que a gente tem feito é um trabalho conjunto, visitando a casa das pessoas e com grande divulgação na imprensa, para que a gente consiga eliminar os focos da dengue. O número de mortes não tem sido grande. Isso nos alegra muito e a gente espera continuar o combate à dengue”, afirmou Ibaneis.
De acordo com o Levantamento Rápido de Índices para o Aedes aegypti no Distrito Federal (Liraa), feito pela secretaria, o DF tem 12 regiões administrativas com índice de infestação predial em alerta. O levantamento considera as 33 regiões administrativas do DF e mede a presença de larvas em determinado local, em três níveis: satisfatório, alerta e risco de surto. As demais 21 regiões estão com resultados satisfatórios. Paranoá, Varjão, Itapoã, Plano Piloto e Planaltina são as cidades com os maiores níveis de alerta.
Quando o critério é a incidência de casos da dengue por 100 mil habitantes em 2022, o ranking é liderado por São Sebastião (1.707), seguido de Sobradinho 2 (1.495) e Vicente Pires (1.297). A preocupação, porém, não está restrita a apenas algumas localidades do DF. Se considerada a variação entre a SE 14 de 2022 e o mesmo intervalo de 2021, a lista muda de aparência. Taguatinga teve aumento absoluto de 1.219% nos diagnósticos da doença e Ceilândia registrou crescimento de 1.107%. Park Way (900%), Lago Sul (628%) e Jardim Botânico (500%) também apresentaram crescimento alarmante.
O vírus se espalhou
Para especialistas, a explosão dos números da dengue é atribuída, em parte, à pandemia da covid-19. Bergmann Morais Ribeiro, virologista da Universidade de Brasília (UnB), explica que, mesmo que a doença não seja transmitida diretamente entre pessoas, a contaminação da dengue pode ocorrer de um indivíduo para outro por meio do mosquito transmissor. “A população voltou a andar mais nas ruas. Essa movimentação espalhou o vírus”, aponta.
O professor destaca a semelhança climática entre os dois anos. “Tivemos meses chuvosos também no ano passado, mas as pessoas estavam mais em casa, por conta da pandemia. A maioria dos casos é assintomática e boa parte não buscou atendimento médico naquela época. Quando a população estava confinada, a infecção não se espalhou”, completa o virologista.
Subsecretário de Vigilância à Saúde do DF, Divino Valero Martins concorda com o professor quanto ao peso da emergência sanitária na explosão dos diagnósticos da dengue. “Por conta da pandemia, o Ministério da Saúde publicou uma portaria limitando o trabalho do agente de saúde nas visitas domiciliares”, explica. O gestor destaca também a conduta da população. “Quando juntamos os fatores, entendemos o aumento. Houve mal comportamento das pessoas (em relação aos cuidados contra o mosquito), acúmulo de lixo doméstico e um subtipo diferente do vírus em circulação. Ainda não chegamos ao patamar máximo (de casos), acreditamos que será no fim de maio, quando, enfim, os números vão começar a cair”, avalia Divino Valero.
Contra-ataque
O combate à dengue deve ser levado a sério pela população e agentes públicos, porque a doença pode deixar sequelas ou até mesmo levar à morte. “A principal queixa é a fadiga, que pode levar semanas para melhorar”, alerta a infectologista Ana Helena Germoglio. “Alguns pacientes demoram oito semanas para superar a fadiga pós-dengue, semelhante à deixada pela covid-19”, continua a médica. “A maior parte dos pacientes evoluem para formas leves ou moderadas da dengue, que não deixam grandes sequelas. Mas, para quem desenvolve as formas graves, que precisa de intubação e ventilação mecânica, a sequela pode ser motora ou respiratória, a depender do tipo de complicação que o paciente tiver”, completa a infectologista.
Três perguntas para
Divino Valero Martins, subsecretário de Vigilância à Saúde do Distrito Federal
O que a Secretaria de Saúde está fazendo para conter os casos de dengue no DF?
Melhoramos o atendimento médico-hospitalar, colocamos tendas (para atendimento externo) em alguns hospitais, como o de Ceilândia, o de Brazlândia e o de Taguatinga, para tratar a doença no menor tempo possível, evitando agravamentos dos casos e óbitos. Tanto que temos mais de 26 mil casos e apenas uma morte. Não apenas no atendimento ao pacientes, mas coletamos dados, voltamos aos endereços e fazemos borrifações e dedetizações, inclusive com o carro fumacê. São duas ações paralelas.
Quais cuidados devem ser tomados para evitar a contaminação?
Mais de 97% dos focos de mosquito estão dentro de casa, não nos lixos da rua, por exemplo, porque é um mosquito doméstico, que precisa se alimentar de sangue humano. Prestar atenção não somente em focos de água parada, mas perto de plantas e em locais de sombra. Todos os dias, as pessoas precisam abrir as janelas para arejar a casa, deixar a luz entrar e observar se está tendo picada de mosquitos durante o dia. Se houver, provavelmente é o Aedes aegypti.
Como a população deve agir?
Discar 160 ou denunciar durante as inspetorias. Temos duas equipes atuantes, as vigilâncias sanitária e ambiental. Só vamos conseguir vencer a dengue se unirmos população e governo. É importante que cada cidadão seja agente de saúde da própria casa. São ações individuais com reflexos coletivos. Saúde pública é isso.
Palavra de especialista
Alerta
A dengue, doença viral transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, comumente causa febre, dores no corpo e nas articulações, além de dor de cabeça e atrás dos olhos e manchas na pele. Alguns pacientes podem sentir enjoos, dor abdominal intensa, sinal de sangramento, vômito persistente, agitação ou sonolência. São sinais de alerta. Qualquer paciente com esses sintomas deve procurar imediatamente atendimento médico.
No entanto, os sintomas da dengue são muito inespecíficos. Os sinais de alarme servem para indicar que o paciente precisa buscar atenção médica, porque as formas graves da dengue podem evoluir inclusive para óbito. Contra a dengue, não há tratamento específico. Não existe um remédio que vai tratar a infecção viral. O tratamento é feito com medicações sintomáticas para aliviar dores e febre. O paciente em recuperação deve manter repouso e observar os sinais de alarme. A imensa maioria vai evoluir com melhora dos sintomas espontaneamente.
André Bon, infectologista do Hospital Brasília
Denuncie!
Algum vizinho ou conhecido não tem agido para evitar a proliferação do mosquito? As denúncias de focos de dengue podem ser feitas diretamente pelo site da Ouvidoria ou pelo telefone 160. O registro é direcionado para a Região de Saúde responsável pelas ações de inspeção do endereço indicado pelo denunciante. (CB)